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DE Fevereiro DE 1941 183

Dizem: é uma questão de coragem moral do comandante ou do Ministro da Guerra. Não. É uma questão e visão, é uma questão de modo de ver, e a situação dos oficiais não pode ficar à mercê do critério dos comandantes ou Ministros.

por isso não me venham dizer que basta que o Ministro da Guerra conceda ou não conceda autorização. Não estamos de acôrdo, não podemos estar de acôrdo.
O decreto tem esta vantagem: fixa princípios, e, bem ou mal, obedece-se a êsses princípios, não ficando a sorte o oficial dependente do urbírio, mais ou menos bem intencionado, da pessoa que há-de conceder a autorização.
Os comandantes e os Ministros mudam, e com êles o critério adoptado na concessão das licenças.
Com o decreto fixa-se o critério. Mudam os comandantes, mudam os Ministros, mas o critério fica, porque não é deles: é do decreto.
Dispõe-se nos artigo» 2.º e 3.º que não podem contrair casamento os militares com menos de vinte e cinco anos.
Creio que estamos todos de acôrdo em que a idade de vinte e cinco anos está muito bem fixada. Digo até: o autor do decreto teve em atenção a precocidade da nossa raça e do nosso temperamento peninsulares.
Os vinte e cinco anos constituem a idade média para casamento, mas, logo a seguir. dix-se que não podem contrair casamento os oficiais com patente inferior tenente».
E, então, eu. pergunto: Qual é o critério? É a patente? É a idade? Um basta.
Se o casamento é um acto de reflexão e de extrema gravidade, não compreendo como é que um tenente com vinte e seis anos tem mais capacidade para praticá-lo o que um alferes com mais de vinte e oito.
Desde que um tenente com mais de vinte e cinco nos pode casar, porque é que um alferes com mais de vinte e oito, por exemplo, não pode realizar tal acto?
Desde que se fixou um limite de idade, parece-me que quanto basta.
Pode objectar-se - e talvez isso não seja estranho ao espírito do legislador - que um alferes tem um sôldo em eminuto, não ganhando o necessário para sustentar a família. E, então, nesse ponto eu invoco as palavras do Sr. Dr. Abel Varzim, que ontem aqui ouvi com muita atenção e que intimamente aplaudi.

O Sr. Alçada Guimarães: - Mas na armada o regime já é sensivelmente êsse.

O Orador: - Tanto melhor.
O artigo 4.º diz: «Os oficiais do exército só podem contrair casamento com portuguesa originária, filha de pais europeus»
Ora, o que quis o legislador significar com esta expressão «filha de pais europeus»?

O Sr. Melo Machado: - Eu sou natural de Luanda. Não serei um pai europeu?

O Orador: -0 que é que se pretende? Manifestamente evitar, em primeiro lugar, que o oficial se não case senão com portuguesa. E isto porque, neste momento conturbado do mundo, em que a guerra se nos apresenta como uma fatalidade inelutável, um oficial casado com uma estrangeira, cujo país declarasse guerra o nosso ficaria numa situação verdadeiramente trágica.
Encaremos, porém, outra hipótese. Portugal não é um bocado de terra no continente europeu; é um grande Império e devo dizer que, quando pronuncio a palavra Império, parece que me sinto maior.

Vozes: - E com razão!

O Orador: - Há portugueses na África, na China e na Oceânia, por todo êsse mundo fora. Segundo a doutrina do decreto, a mulher portuguesa só pode casar--se com filhos de pais europeus. Imaginemos agora que um dos nossos colonos partiu há mais de cem anos para a África, ali constituíu família, cujos descendentes apenas se cruzaram com descendentes de outros portugueses, mantendo a pureza da sua origem. Admitamos que uma descendente dêste colonizador quere casar com um oficial. Essa rapariga é portuguesa, mas não é filha de pais europeus. È neta ou bisneta de europeus, mas não pode unir a sua vida à vida do oficial que o seu coração escolheu.
Foi isto o que o legislador pretendeu?
È manifesto que não.
A palavra europeu tem no decreto outro sentido: ó um verdadeiro eufemismo.
Aqui têm V. Ex." que as minhas divergências são mais de forma do que de fundo.

Trocam-se àpartx, em vos baìxa, entre vários Srs. Deputados.

O Orador:- Peço a V: Ex.ª que me ouçam, porque também costumo ouvir todos os oradores com atenção.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assemblea.

O Orador:-Tenho pena de não estar à altura da discussão do assunto, porque realmente ele é importante.

O Sr. Presidente: -V. Ex.ª está a fazer uma análise conscionciosa do problema, e digna de ser ouvida com atenção.

O Orador: - Agradeço a V. Ex., Sr. Presidente, as suas palavras, tanto mais que são palavras vindas de um mestre.
Continuando, devo dizer que o legislador não pôs no decreto, relativamente à ascendência europeia, aquilo que porventura queria exprimir. O que se quis foi evitar aquilo que não quero dizer.
Disse-se até que isto tinha um vago cheiro de racismo. Parece-me que foi o Sr. Dr. Tavares de Carvalho.

O Sr. Tavares de Carvalho: - Perdão! Eu não disse isso.

O Sr. Belfort Cerqueira: - Fui ou; mas não disse cheiro, disse sabor.

O Orador:-V. Ex." disse sabor, e eu como tenho má pituória pus na minha idea cheiro.
Mas não se trata de um vago sabor de racismo, mas de manter um certo número de preconceitos, chamemos-lhe assim, que não são inteiramente vãos. Foi isto decerto o que o legislador pretendeu. Não está assim no decreto? Estes «pais europeus» podem significar outra cousa? Nós podíamos emendar o que cá está, traduzindo-o por outras palavras. A forma pode mudar, mas a essência fica a mesma.
Sr. Presidente: outro assunto muito grave aqui tratado foi a questão célebre das divorciadas.
Ouvi aqui dizer a um ilustre Deputado que era desigual, que era injurídico que um oficial divorciado pudesse casar e uma senhora divorciada não pudesse casar com um oficial; e pareceu-me destas palavras que o ilustre Deputado concluía que a situação de um homem divorciado é equivalente à situação de uma senhora divorciada. Não posso estar de acôrdo com esta conclusão.