28 DE MARÇO DE 1944 329
as suas obras, excepto mediante a aquisição de tais terrenos por elevado montante pecuniário.
Convém salientar, todavia, que no projecto governamental não aparece, por desnecessária, a prerrogativa ministerial que permite, em condições especiais, conceder terrenos urbanos ou suburbanos; a Câmara Corporativa pretende dar ao Ministro das Colónias o direito de fazer essas concessões, embora, por outro lado, limite à quarta parte e a metade, respectivamente, as dimensões das terras de que os govêrnos coloniais podem dispor mas (povoações e seus arredores.
A pretendida redução não se justifica; os limites prescritos pela Câmara Corporativa são exíguos, sobretudo e em relação às terras suburbanas, porquanto quaisquer instalações de maior amplitude e seus anexos bastam para cobrir a totalidade das superfícies preceituadas.
O limite máximo de concessão fixado no artigo 15.° da proposta de lei em debate (não é exagerado, motivo por que não me inclino a vê-lo deminuído, sob pena de se esquecer que nem todo o solo ultramarino é propício a ser explorado em boas condições económicas e, por consequência, nenhuma grande sociedade se abalançará a adquiri-lo em razoável escala, senão quando as circunstâncias se revelarem favoráveis aos objectivos em mira. Demais, que importa a grandeza das áreas a utilizar se os concessionários estiverem de boa fé e dispuserem de suficientes meios financeiros e técnicos para as valorizarem? O ideal seria que aparecessem numerosos desses indivíduos ou colectividades, pois que, de tal facto, só adviriam benefícios para as colónias e para a metrópole.
E quando uns ou outros esquecerem os compromissos assumidos, compete ao Governo tomar medidas no sentido de os obrigar a obedecer aos termos contratuais.
Mas de modo algum posso aceitar o critério que visa a limitar a iniciativa do Conselho de Ministros, constrangendo-o a fazer grandes concessões de terrenos apenas por meio de arrendamento que não exceda trinta anos, ainda que renovável; concordo, pelo contrário, com a doutrina da proposta ministerial, crente em que, só por via de contrato especial e nas condições que forem julgadas convenientes, as empresas concessionárias conseguirão obter o crédito indispensável à realização de trabalhos de vulto e recompensadores do capital investido, tanto mais que há culturas coloniais que só começam a produzir rendosamente após duas ou três dezenas de anos.
Sr. Presidente: outro reparo que a proposta governamental despertou refere-se ao sistema de aforamento, tam louvado por Stuart Mill, Emílio Laveley, Charles Gide, etc., e condenado por outros autores, entre os quais Marco Fanno se evidencia especialmente; depois de se salientarem as vantagens e, sobretudo, os inconvenientes da adopção do sistema enfitêutico, concluiu-se, contudo, por admitir este regime jurídico nas concessões para aproveitamento agrícola, agro-pecuário, agro-industrial e florestal, quando esta fórmula de distribuição de terras somente é indicada pelo Govêrno para as concessões urbanas e suburbanas e para as áreas destinadas a explorações agrícolas pròprimente ditas.
Além dos argumentos favoráveis invocados no parecer da Câmara Corporativa, outros de merecimento, como a tradição e os êxitos obtidos nas colónias estrangeiras, podem apresentar-se em favor da enfiteuse ultramarina - a qual, como se sabe, só se torna efectiva após o terreno ter sido aproveitado pelo menos em um terço; ao sistema enfitêutico devem a Inglaterra e a Holanda grande parte do desenvolvimento económico das suas colónias.
Nas nossas, possessões o aforamento vem sendo empregado desde o século XVII, com a instituição dos Prazos da Coroa e, mais correntemente, a partir da publicação da lei de 1901.
Tem defeitos essa forma de concessão de terrenos, mas no presente momento de crise internacional não é aconselhável o abandono de tal regime, dado que esta mudança de orientação, infalivelmente, acarretaria sobressaltos e desassossegos que o bom senso e o nosso patriotismo mandam evitar.
Terminada a guerra, haverá tempo para demorado estudo dos diferentes sistemas de concessão de terrenos ultramarinos, em especial do regime de compra e venda, o qual, se bem que pareça dar as mais sólidas garantias aos proprietários e maiores receitas ao Estado, não é isento de numerosos inconvenientes, que a falta de tempo me impede de apontar agora.
Não concordo, Sr. Presidente, com a Câmara Corporativa ao pretender que as concessões agro-pecuárias, agro-industriais e florestais se sujeitem ao regime das concessões agrícolas. Para justificar a minha opinião acerca das duas primeiras, basta escudar-me nos argumentos contidos no penúltimo período do décimo segundo parágrafo do parecer, doutrina que também pode aplicar-se condenação da enfiteuse nas concessões florestais, se se tiverem em vista as características da heterogeneidade e descontinuidade das florestas das nossas colónias, cujos terrenos, derrubadas as árvores, pouco interessarão mais ao respectivo concessionário.
Só por excepção os enfiteutas coloniais se propõem semear ou, plantar espécies vegetais após o corte da floresta, pois tratar-se-ia de encargo de êxito longínquo e incerto, quando é verdade que têm à sua disposição outros e variados factores de riqueza, capazes de oferecer-lhes mais pingues rendimentos; a exploração florestal intensiva nas colónias torna-se economicamente aconselhável apenas em tempos anormais, como foram os da primeira Grande Guerra, e o são os do conflito presente.
Sr. Presidente: eis-me chegado ao fim da minha exposição que, apesar de resumida, não pôde deixar de ser tam longa. Para fundamentar as razões de ordem teórica e prática de que o Governo se socorreu na elaboração desta oportuna proposta de lei, houve que discordar, aqui o além das ideas da digna Câmara Corporativa, sem que esta atitude nem de longe possa afectar o subido apreço que dispenso a tam alto organismo de estudo e de consulta.
Por conseguinte e em concordância com as minhas considerações, voto a proposta governamental, com os aditamentos que a comissão de estudo entendeu fazer-lhe, absolutamente convencido de que este importantíssimo diploma, tal como se apresenta concebido e articulado, satisfaz, plenamente, as necessidades actuais da política do regime das terras do Império Colonial Português.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Está encerrado o debate na generalidade.
Vai passar-se à discussão na especialidade. Está em discussão o artigo 1.° da proposta de lei.
Sôbre êste artigo há na Mesa uma proposta de alteração apresentada pelos Srs. Deputados Nunes Mexia e Rocha Paris no sentido de no § 1.°, a seguir à palavra «destinados», se intercalar o advérbio «exclusivamente».
O Sr. Manuel Múrias: - Deve-se entender, evidentemente, que o § 1.° se destina precisamente a marcar a diferenciação entre a criação de gado como actividade