28 DE MARÇO DE 1944 327
presidente do Conselho do Império e que já por duas vexes exerceu com proficiência o cargo de Ministro das Colónias interino.
Sr. Presidente: desde há muito tempo que, a bem do alargamento da nossa colonização, se fazia sentir a necessidade da publicação de um diploma relativo às concessões de terrenos ultramarinos, sistematizado e claro, que coordenasse a múltipla e dispersa legislação existente sobre o assunto e, simultaneamente, fosse impregnado de espírito descentralizador e simplifica dor de actos, formalidades e procedimentos burocráticos, sem prejuízo de ulteriores aperfeiçoamentos e remodelações que a prática venha aconselhar; dizem-no, autorizadamente, o Sr. Ministro das Colónias e os membros do Conselho do Império e confirma-o agora, com igual autoridade, a Câmara Corporativa.
Devo confessar, Sr. Presidente, que foi com enorme alvoroço e curiosidade intelectual que iniciei a leitura do parecer da Câmara Corporativa. Na verdade, o regime das terras ultramarinas é uma das condições essenciais da tarefa ingente e portentosa da colonização, dado que, da apropriada distribuição dos terrenos para fins do aproveitamento e valorização, depende em grande parte o incremento da actividade colonizadora.
Sr. Presidente: de harmonia com as deliberações do Congresso de Berlim só têm direito a possuir colónias as nações que saibam promover a sua completa exploração económica; dentro deste critério materialista, a colonização é bem a ciência dos três MM (men, money e markets) - no curioso dizer de alguns autores ingleses -, e os dois grandes objectivos da acção colonizadora consistem na mobilização das matérias primas coloniais e no desenvolvimento das populações indígenas e metropolitanas emigradas.
Ora, para os portugueses, «colonizar é acima de tudo civilizar», e dilatar a fé o Império foi sempre o seu intento primacial; «fazei cristandade e fazei justiça», eis o lema e a norma basilar que desde os primórdios da Expansão nos têm guiado na obra de além-mar, tornando-nos a Nação colonizadora por excelência!
E esta vocação ancestral, este imperativo histórico, para honra nossa, encontra-se lapidar e categoricamente expresso no artigo 2.° do Acto Colonial: «É da essência orgânica da Nação desempenhar a função histórica de colonizar domínios ultramarinos».
E se, como é óbvio, não pode fazer-se colonização sem regular emigração, todavia os portugueses, através dos séculos e não obstante a sua pequena população continental, as lutas e mil contrariedades que tiveram de travar e vencer, conseguiram dar mundos novos ao mundo, criar impérios e ser fautores e principais agentes do Renascimento.
Conquanto aplauda, e calorosamente, a idea de canalizar para as mossas colónias os filhos da metrópole, não julgo que esta corrente emigratória deva ser estimulada tam somente para atenuar as dificuldades e vicissitudes económicas provenientes da pobreza de recursos naturais e do excesso de densidade demográfica.
O solo português da Europa, mercê do progresso material já operado pelo Estado Novo - por intermédio da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola e da Junta de Colonização Interna, esforço que, se Deus quiser, há-de ampliar-se ainda mais - pode vir a abastecer, satisfatoriamente, maior número de pessoas; são os cultores das ciências económicas e sociais quem o proclamam e corroboram-no também os elementos informativos, constantes do 1.° volume do Plano geral do aproveitamento dos baldios reservados.
Há concelhos metropolitanos, em que mais de 30 por cento das terras são baldios susceptíveis de boa exploração agrícola. Continue-se a política iniciada pela Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola, de levar às terras que dela precisa a água no momento em que convém; evitem-se a pulverização das terras no Noroeste do país e a prática da lavoura alentejana com as, características actuais; contrarie-se o predomínio da cultura extensiva, mas generalizem-se os métodos de adubação racional e os processos mecânicos modernos; valorizem-se mais as terras de Entre-Douro e Tejo; resolva-se o problema das regas do Alto e Baixo Alentejo, e ter-se-ão dado possibilidades de viver no continente a mais 2 ou 3 milhões de portugueses.
Também, Sr. Presidente, se não é suficiente para a realização da tarefa colonizadora lusitana dirigir para o ultramar o excesso da nossa população, outro tanto se pode dizer quanto à preparação do meio onde os emigrantes devem ser recebidos; nestas circunstâncias é lícito afirmar que «a absorpção da população branca pelas nossas possessões de além-mar ainda se manterá modesta pelo período de longos anos».
Apesar de o nosso povo se dedicar, preferentemente, às labutas agrícolas, mau grado nosso e devido aos costumes rotineiros seguidos pela maioria dos seus componentes e, especialmente, por causa do completo desconhecimento que tem das cousas ultramarinas, não está em condições de emigrar para as colónias, a fim de compartilhar na grandiosa, mas dificílima emprêsa da colonização moderna.
Deixar partir para as colónias a laborar regiões, mesmo ainda após a execução dos indispensáveis trabalhos preparatórios (limitação das terras, vias de comunicações, portos, saneamento, etc.) pessoas desprovidas de aptidões ou de vocação particular e sem qualidades físicas e morais «nem apropriada preparação cultural e técnica, constitue perigoso erro - que não cometem já os países estranhos, de onde a emigração se faz em grande escala -, pois não está em jogo somente a vida do indivíduo ou da família emigrante, mas o próprio prestígio da Nação, perante os estrangeiros, que não deixam de reparar em nós, e os nativos -- para quem somos os únicos brancos entre os membros da raça caucásica!
As colónias, Sr. Presidente, ainda mais do que as metrópoles civilizadas, carecem de elites para as fazerem progredir e elevar moral e intelectualmente, e nos nossos dias não basta possuir intuição colonizadora - a característica especial dos portugueses; só os colonos sãos de corpo e de espírito e tecnicamente adestrados poderão alinhar e combater a dura e infindável batalha do engrandecimento dos territórios ultramarinos e de promover a ascensão até nós dos seus naturais.
Foi em obediência a êste contemporâneo conceito de colonização que o Sr. Ministro das Colónias, no seu valiosíssimo projecto «Acção colonizadora do Estado», incluiu e tanto e merecido relevo deu ao Instituto de Colonização, organismo que, como o seu nome revela, se destina a preparar pessoas de ambos os sexos para a valorização e aproveitamento das nossas possessões de além-mar; é ainda com este louvável e patriótico intuito que ele se esforça por enviar missões técnicas e científicas ao ultramar e tanto acarinha os cursos de ciência colonial existentes na metrópole e institue e desenvolve cada vez mais os centros de ensino nas colónias.
Por isso, a recente iniciativa da criação da Direcção Geral do Ensino no Ministério das Colónias - cuja razão de ser se justifica no notabilíssimo relatório que precedo o respectivo decreto, organização administrativa similar às que já existem em todas as grandes potências coloniais do mundo - é digna dos maiores encómios e da sua acção muito há a esperar em prol da instrução dos brancos e dos povos de côr e bem assim do progresso das ciências ultramarinas.