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406 DIÁRI0 DAS SESSÕES - N.º 77

da superior capacidade intelectual. Ora eu a esse respeito faço as seguintes observações:

Não é só preciso que eles sejam os mais competentes intelectualmente. Não se pode prescindir, é claro, além de uma competência moral indiscutível, de confiança política inequívoca, para que não é bastante a declaração formal de concordância exigida para a entrada no exercício do cargo.

Mas pergunta-se:

Poderá o recrutamento para a burocracia fazer-se proveitosamente nesse campo da selecção intelectual a que alude o relatório?

Ponho as minhas reservas, Sr. Presidente. Em país pobre, de limitados recursos -pois as nossas receitas, embora, como documenta o parecer, mostrem um apreciável acréscimo nos últimos cinco anos, atingindo em 1942 um total de 3.081:576 contos, dos quais 2.967:824 representam receitas ordinárias, traduzindo assim um aumento de cerca de meio milhão de contos relativamente ao ano anterior e mais de um milhão do que se cobrou em 1930-1931, são uma gota de água no oceano imenso das receitas dos grandes países - , não pode pagar-se ao funcionalismo naquela proporção compensadora que aos cargos públicos faça atrair os melhores seleccionados.

Não pode deixar de reconhecer-se que o nosso funcionalismo, na mediania dos recursos que lhe são proporcionados, se desobriga condignamente do encargo que tem aos ombros e em muitos casos excede-se em trabalho tão prestante e tão difícil que só uma especial competência pode valorizar.

Honra lhe seja.

Mas, em concorrência o Estado com as grandes empresas particulares, onde pode exercer-se uma acção muito mais ampla e mais liberta de óbices e dificuldades, de mais largos horizontes e possibilidades, melhor assegurado o futuro em capitalização a que não podem equiparar-se as por vezes míseras pensões de reforma e aposentação, que quase representam ingratidão do Estado, não me parece que este leve a melhor e não sinta o afastamento, pela fuga para maiores interesses, dos que melhor o poderiam servir.

A cada passo isso se v, e nem mesmo o uso das licenças ilimitadas tem outra significação.

Quantos regressam aos seus cargos oficiais?

Seria interessante saber.

Vem a propósito aqui de novo referir-me, embora ligeiramente, ao problema dos reformados e dos aposentados, cuja situação para alguns é verdadeiramente aflitiva.

A minha intervenção numa das nossas sessões, pelo conhecimento particular de alguns casos em que os reformados e aposentados por força da lei, quando, embora válidos, não encontram colocação onde possam exercer a sua actividade, são torturante exemplo de honestidade e resignação, sujeitando-se por vezes aos maiores sacrifícios, trouxe até mim, em muitas dezenas de cartas, a notícia de tantos outros que por esse País fora, perante a carestia da vida cada vez maior, sentem o abandono dos Poderes Públicos, que durante tantos anos serviram com dignidade e competência, e a quem é negada até a própria pensão de reforma ou aposentação a que se julgavam com direito e que uma remodelação dos serviços lhes nega, embora tenham, desde o início da sua entrada nos quadros, concorrido com a respectiva cota para essa espécie de capitalização em que se traduz a pensão.

Acontece, perante essa reforma dos serviços da Caixa de Aposentações, que os respectivos interessados ou têm de contrair um empréstimo para entrar com milhares de escudos na Caixa, para que esta possa pagar-lhes a pensão a que tinham direito, ou renunciam a ela e limitam-se a receber a insignificância que lhes garantem, e que é, muitas vezes, triste pretexto para lhes iludir a fome.

E depois, Sr. Presidente, há situações verdadeiramente contraditórias e lamentavelmente comprometedoras - funcionários da mesma categoria aposentados antes da reforma dos serviços recebendo muito mais que outros que depois da reforma se aposentaram.

Sr. Presidente: não se impõe, na verdade, uma remodelação completa destes serviços, de modo a suprimirem-se estas anomalias, que tanto comprometem o nome do Estado Novo, que, ao mesmo tempo que proclama como lema que enquanto houver um lar sem pão a revolução continua, esquece os que o serviram, dando assim contraditório exemplo aos que nas actividades particulares obriga a concorrer para o bem-estar dos seus antigos trabalhadores, velhos ou inválidos, entrados assim no período de uma reforma imposta pela doença ou pela idade?

Com que autoridade é que o Estado aplica aos outros normas de proceder de que se isenta?

Para prestígio do Estado Novo urge que se providencie de modo a pôr termo ao que se passa. Deste lugar, e ao encerrarem-se os trabalhos da Assembleia, eu apelo para o clarividente espírito do Sr. Ministro das Finanças, para a inteligência e boa vontade do Governo, para que se estude esse problema, que, se é melindroso no seu aspecto financeiro, não me parece exceder as possibilidades do Tesouro, uma vez que, num novo arranjo das nossas possibilidades, se destinem às classes inactivas maiores verbas, ainda que com sacrifício de outras, embora úteis pelos serviços que representem, mas adiáveis. As classes inactivas, segundo o parecer, custaram ao Estado 179:751 contos. Mas é preciso notar que o mesmo parecer, no capítulo respectivo, pp. 45-46, prevê um maior aumento de despesa com as classes inactivas, concluindo nestes termos:

"As classes inactivas são, como acaba de ver-se, um ónus apreciável sobre as finanças públicas. Representam cerca de 8 por cento do total das receitas ordinárias. Contudo a tendência nesta matéria é para maior despesa.

Apesar das melhorias que resultaram da reforma de 1929, quando se criou a Caixa Geral de Aposentações, não se pode considerar resolvido ainda o problema".

Permito-me chamar a atenção do ilustre relator do parecer para as considerações que acabo de fazer a propósito dessa reforma.

Sr. Presidente: é ocasião, a propósito deste capítulo, de abordar, embora levemente, este problema:

O que se tem feito a favor das chamadas classes médias?

Têm elas merecido ao Estado, porventura, o interesse necessário?

Pode afoitamente dizer-se que nada se tem feito a seu favor, apesar de essas classes terem na economia do País um lugar preponderante, como garantes principais da unidade nacional.

Todos os economistas lhe reconhecem esse valor.

Escreve um deles - professor de ciências políticas e sociais no Instituto Superior de Comércio Santo Inácio, de Anvers - Albert Müller S. J., nas suas Notes d'Économie Politique, primeira série do lições dadas ao seu curso e publicada em 1933:

"Situadas na hierarquia social a igual distância das classes superiores, abundantemente providas de bens, e das classes inferiores, votadas à pobreza ou à miséria, as classes médias encontram numa pequena fortuna ou em rendimentos medíocres os elementos de uma honesta o decente subsistência".

E continua abaixo, marcando o seu papel na sociedade:

"Uma classe média numerosa e próspera é, para a sociedade, uma garantia de ordem e estabilidade; cons-