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20 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 59

única - um por todos, todos por um - no momento que passa!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Chego a não compreender a psicologia actual do espírito indiano, que faz tábua rasa da largueza de vistas do velho hinduísmo, que foi sempre caracterizado por um sentimento de harmonia, de tolerância e de respeito pelas diversas culturas, dentro e fora do país, e cujos sábios pregaram sempre a assimilação pela tolerância, e não a supressão pela violência. E fico espantado de ver que os mais altos e austeros expoentes da cultura hindu, obcecados pela paixão, tendem a renegar a filosofia do Mahabarata, que num símile cheio de beleza proclama que, para se escapar à anarquia das absorções e atropelos de direitos alheios, os homens têm de ser superiores à lógica do peixe, quer dizer, do peixe graúdo que devora o miúdo.
Integração de Goa na grande índia?! Porventura mandam a nossa educação e a nossa cultura que não colaboremos com ela para a manutenção da paz e do progresso na península? Somos-lhe porventura hostis? Constituímos porventura o mínimo obstáculo para as suas aspirações? O governo de Goa está pronto a colaborar com todos para a harmonia e paz na península. Mas integração do nosso território pela absorção?! A que título? Com que direito? Foi para se incitar absorções que as democracias opuseram a barreira dos seus milhões de soldados contra a demência do Além-Reno? Foi para se encorajar essa perversão mental que os soldados indianos opuseram os seus peitos de aço na Etiópia, em Tobruk e em El-Alamein?
Tenho seguido a evolução dessa desorientação mental através da reportagem de um jornal de compostura séria, o Times of Índia, e é por ele que vos darei informes para a vossa orientação. Porque, devo confessá-lo, por um sentimento de dignidade e de elegância de educação, evitei do ler muitos outros da ala esquerda, que, dizem-me, vêm cheios de doestos e injúrias para nós, canalizando notícias tendenciosas, cimentadas com ditos de jogral, que, se servem para despertar a hilaridade dos leitores locais, destoam da linha de gentleman com que me habituara a olhar - já por cansa da sua hereditariedade, já pela sua alta cultura universitária - alguns desses guias espirituais do moderno pensamento indiano!
Srs. Deputados: eu sou pequeno demais para julgar os grandes homens! Mas sou também filho da Índia! E um indiano puro não se deixa fascinar pela grandeza dos homens e para afirmar as suas convicções não tem medo de as repetir ante o próprio espírito da verdade suprema, que é Deus!
Em nome dessa verdade, j'accuse!
Do meu modesto assento nesta sala e perante a consciência do mundo civilizado, acuso da mais criminosa das violências o incitamento à violação do nosso território e à infiltração nos nossos domicílios da desprezível fauna da 5.º coluna!

Do not bow before the Portuguese Government; remember that 40 crores of Indians are behind you. (Times of Índia, de ...).
Tradução. - Não vos curveis perante o Governo Português; lembrai-vos que 400 milhões de indianos estão por detrás de vós.

Acuso com mágoa a jogralidade de expressão com que se qualifica a nossa terra de uma pimple, uma borbulha que se rebenta esmagando-a entre dois dedos! Por mais poderoso que seja um país, não tem o direito de querer vexar um país pequeno, que vive tranquilo no meio da sua pequenez.

Acuso quem, devendo medir a sua responsabilidade de um antigo ministro do Estado, não tem pejo de se permitir criticar, num comício em Poona, a administração de Goa e por entre bênçãos aos revoltosos aconselha:

To defy all laws which interfere with the civil liberties and legitimate rights of citizens. (Free Press, 5 de Julho de 1946).
Tradução. - Desafiar todas as leis que interferem com as liberdades cívicas e os legítimos direitos dos cidadãos.

Não pode haver mais franco incitamento à revolta em casa alheia que vive em paz, à margem das orgias de apunhalamentos que essas revoltas têm gerado em algumas das suas grandes e sumptuosas cidades.
Acuso esses indivíduos novos e altamente responsáveis, pela sua categoria mental e pela posição máxima na política indiana, que, falando de territórios estrangeiros na Índia, dizem com uma sem-cerimónia que espanta em pessoas educadas:

In future, there was going to be no such islands of foreign authority in Índia, like Portuguese or French territories. They simply could not exist.
Tradução. - No futuro não haverá na índia tais ilhotas de autoridade estrangeira, como os territórios portugueses ou franceses. Sumariamente, eles não podem existir.

E com um desconhecimento lamentável da História, inconcebível em homens cultos, acrescenta:

Portuguese authorities had existed in Goa not because of Portuguese, but because of British Power in Índia. When British Power went, other powers would also go. (Times of Índia, 11 de Julho de 1946).
Tradução. - As autoridades portuguesas existiam em Goa, não por cansa dos portugueses, mas por cansa do poderio britânico na Índia. Quando este se for embora, os outros poderes ir-se-ão embora também.

De forma que, do alto de unia tribuna política na índia, se nos ensina que tantas feitorias de Portugal, que constituíram o orgulho de uma Nação, foram especadas pelas baionetas da Companhia Inglesa das índias e pelo poder dos soldados da Albion!
Sr. Presidente: Goa, como vedes, está cercada de uma atmosfera externa francamente hostil e absorcionista. E a população indo-portuguesa, pro-portuguesa de Goa, que, ciosa da sua cultura e das suas tradições, constitui ainda a grande maioria, vive acabrunhada e apavorada, não sabendo o futuro que a espera!
Houve um momento em que a declaração impressa nos jornais vizinhos de que Goa seria tomada without a shot (sem um tiro) foi entre nós traduzida como sendo uma questão de dias, rendendo Goa pela fome e pela sede!
De resto, esta teoria simplista não é uma mera apreensão de espíritos timoratos. Ela foi sugerida ainda recentemente ao Governo Provisório Central por um ministro de um governo provincial:

The application of economic pressure against Portuguese Índia as a retaliatory messure against the alleged ill-treatment of Indian Nationals in Goa. (Times of Índia, 8 de Outubro de 1946).
Tradução. - A aplicação da pressão económica como uma medida de revindicta contra o alegado mau tratamento dos nacionais indianos.