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308 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 70

È do conhecimento de todos aqueles que alguma vez tomaram contacto com o governo destas pequenas unidades de administração o valor que tem a realização ou não realização de melhoramentos locais para a melhor evolução da política geral. A administração duma câmara municipal é o primeiro espelho onde o povo - o simpático e bondoso povo deste Pais-vê e revê a política do Estado.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Se ela for boa, o reflexo será óptimo; se ela for má, as reacções serão por sua vez dos mais funestos resultados. E compreende-se que assim seja.

Tudo quanto se realiza é para usufruto imediato, palpável, visível de toda a população do concelho; as suas repercussões são repercussões que atingem os nossos hábitos diários, as nossas necessidades materiais e espirituais, isto é, alteram, modificam mais ou menos profundamente a nossa maneira de viver a vida.

Nos centros de cavaco -desde a tertúlia do café até aos cenáculos da política- tudo se discute, se esmiuça e desfia até ao mais pequeno pormenor.

O que faz a câmara, o que tenciona fazer, o que devia fazer.

E cada qual traz em pensamento, senão até mesmo já na algibeira, traduzido em papel e até em croquts, no caso de tal requerer, a melhor forma de resolver bem e barato o problema dos esgotos, das águas, da assistência e das comunicações. E daí a vereação ser acoimada de incompetente, preguiçosa ou atrevida, conforme a lente que o comentador ocasional usar para criticar a acção camarária.

Podem crer aqueles que andam afastados destas gerências que nem sempre é fácil, e digo mesmo é sempre difícil, realizar, e não é cómoda a tarefa nem vulgar a gratidão. Tenho para mim, Sr. Presidente, que parte do prestígio da actual situação política dentro do País pertence ao esforço, muitas vezes privado e sempre amargo, da acção das câmaras municipais do nosso Portugal. É evidente que só a estabilidade política governamental, a administração regular em contas e em probidade de Salazar tornariam possível e poderiam determinar uma normal estabilidade da administração local, e daí a sequência de muitas realizações, que nunca teriam sido concluídas se assim não fora. Infelizmente, na distribuição dos favores e no volume das dotações nem todos foram olhados como filhos da mesma família. Nós, lá para as bandas do Alto Alentejo, não tivemos muita sorte.

Sr. Presidente: o regime que. determina a nomeação por parte do Governo de presidentes de câmaras municipais, bem como o que nalguns casos os transforma em funcionários remunerados da própria câmara, tem, no meu entender, grandes inconvenientes.

Todo o exercício prolongado de uma função pública origina o desgaste.

E o caso de função que tende a prolongar-se é o que se verifica quando dela resulta uma margem de vencimentos que atinge um nível bem superior aos mais elevados.

Resulta daí o apego ao lugar - apego que as circunstâncias do momento presente mais tornam natural. E do apego ao lugar o mimetismo das atitudes, a standardi-zação dos hábitos, o conformismo com o ramerrão, a lentidão nas realizações e a contemporização com erros e com defeitos que não seriam aceitáveis normalmente. Daí à anquilose total da função vai um caminho rápido do percorrer.

Sr. Presidente: houve sempre quem desempenhasse o lugar de presidente de camará a contento das populações, integrado na política da situação, trabalhando devotadamente por ela e pelo bem local. Mais: até houve

sempre quem desejasse o lugar, com sacrifício e sem remuneração alguma, não havendo também necessidade de coacção para o deixar!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Diz-se que o processo actual cria uma ligação mais perfeita entre a política do Governo e a política da autarquia. Não creio. E, porque o não creio, eu defendo exactamente que o lugar de presidente das câmaras municipais seja designado por eleição de entre os vereadores eleitos para a respectiva câmara e que ao lugar de presidente não seja atribuído em caso algum qualquer vencimento.

Sr. Presidente: no capítulo de encargos as câmaras municipais têm sido desde sempre, e com mais intensidade há uns tempos para cá, as vítimas do furor legislativo do todo o Mundo. Não é necessário ter em conta se as receitas são ou não suficientes, se as despesas que se orçamentam são ou não possíveis dentro das receitas criadas. E até, Sr. Presidente, se dá este facto paradoxal: Os Srs. Deputados estão impossibilitados, nos termos do § 3.º do artigo 33.º do Regimento -para cumprimento de disposições constitucionais-, de apresentar qualquer projecto de lei que traga aumento de despesa ou diminuição do receitas do Estado criadas por leis anteriores. Pois muito bem: quando se trata de receita ou despesa de câmaras municipais tal disposição é letra morta; isto é, pode-se apresentar uma lei que absorva com o seu cumprimento a totalidade das receitas municipais! Estranha doutrina, Sr. Presidente.

Vozes: - Muito, bem!

O Orador: - Entremos agora na apreciação do que sucede com o regime das comparticipações. Aqui há mistura de tudo: ridículo, injustiça e ruína. Tudo tem a sua quota-parte - e que quota-parte! O princípio será bom, ou, melhor, teria sido bom na intenção do começo, mas depois o abuso deu lugar ao uso.

E não se diga que se não fossem as comparticipações as câmaras ou as suas obras teriam sido quase apagadas. Eu presidi à Câmara Municipal de Portalegre sem regime de comparticipação, e felizmente posso contar alguma coisa no activo da minha função.

Mas, Sr. Presidente, vamos aos exemplos. Os exemplos tem muitas vezes o aspecto antipático de colocar mal determinados sectores da Administração. Mas eu tenho para mim que deles se podem tirar ilações, pois em geral marcam os métodos usados nos sectores referidos. Deles, pois, desejo tirar como conclusão que há necessidade de reformar o método das comparticipações na técnica, nas compensações materiais e até no civismo das atitudes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: há mais de oito anos que se debate no sector respectivo o problema da construção do edifício dos correios, telégrafos e telefones da cidade de Portalegre. Pensou-se na sua edificação em local que determinava a expropriação de imóveis que importava no montante de 900 contos, dos quais cabiam como encargo à Câmara Municipal 400 contos - isto é, quase metade do rendimento total anual da referida Câmara. Foram Ministros, foram engenheiros, foram arquitectos, foram chefes e subchefes, não sei se foram poetas; idealizaram-se arcos, arrearam-se arcos -uma trapalhada sem fim -, e nada se fez. Vieram as eleições para a actual Assembleia Nacional, e, suponho que sem qualquer solicitação, em domingo anterior ao acto da eleição pessoas responsáveis disseram no local: "o edifício do"