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310 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 75

mês do ano anterior". Eu talvez não devesse dizê-lo nesta tribuna, mas a verdade é que nem sempre fazia muito caso disso.

O Sr. Melo Machado: - As vezes não se pode deixar de fazer caso.

O Orador: - Eu precisava que a Câmara realizasse as suas receitas e não podia vô-las diminuídas.

O Sr. Melo Machado: -V. Ex.ª era também responsável pela alimentação da população.

O Orador: - Mas a verdadeira tragédia era quando se elaborava o orçamento das despesas. Trago aqui o Código Administrativo e vou lembrar a V. Ex.ª quais são as despesas obrigatórias.

Temos em primeiro lugar vencimentos e salários do pessoal. Disse ontem aqui o Sr. Dr. Melo Machado que presidia u uma câmara que não chega a gastar 00 por cento da verba. Eu, infelizmente, bem ao contrário, presidi à câmara de um concelho que é urbanizado quase de extremo a extremo -a Câmara de Almada -, e bastava ter um varredor com a respectiva carroça do lixo em cada zona para se me irem embora os 50 por cento. Mas, enfim, lá se faziam as contas e eu não excedia os 50 por cento, mas com muito custo.

Mas, prosseguindo: vêm depois os encargos de empréstimos legalmente constituídos. Diz também o Código Administrativo que os encargos desses empréstimos não podem exceder 20 por cento da receita arrecadada no ano anterior. Eu achei-me logo perante o problema das águas. Hoje esse problema já está resolvido, mas no meu tempo não estava. Devo dizer que no meu tempo também lutei bastante para que os encargos desse empréstimo não fossem compreendidos nos 20 por cento.

Como seria possível realizar essa obra, orçada em mais de uma dezena de milhar de contos, dentro de um tal critério?

Mas, além disso, há um caso grave, que é o de enquanto as obras não estiverem concluídas os encargos dos empréstimos a realizar para a sua efectivação terem de ser suportados pelas receitas ordinárias da câmara.

Calcule-se, portanto, a dificuldade de realizar obras de tal vulto, embora o Estado as comparticipe em 50 por cento.

Devo também dizer que, como já aqui referiu o orador que me antecedeu, não concordo com a obrigatoriedade de as câmaras pagarem as despesas resultantes da reparação de edifícios destinados aos tribunais. Não compreendo realmente porque deverão ser os municípios a satisfazer essas despesas e ainda as de instalação, pagamento do rondas, mobiliário, água e luz das repartições de finanças.

O Sr. Melo Machado: - Ainda se fossem razoáveis; mas exigem condições luxuosas.

O Orador: - Temos também as despesas com rendas, instalação, mobiliário, água, luz e material didáctico para as escolas primárias. Estão V. Ex.ªs vendo a situação que se cria às câmaras com a construção das escolas do Plano dos Centenários.

As despesas com instalação o vencimentos dos carcereiros ...

O Sr. Melo Machado: - Essa questão dos carcereiros é curiosa. Não percebo porque é que as câmaras municipais hão-de pagar os seus vencimentos e agora os seus fardamentos.

O Orador: - ... além disso temos a construção de cadeias, em comparticipação com o Estado, o que obriga as câmaras a pagarem o que excede a comparticipação.

Tenho aqui o Diário do Governo onde vem publicado o decreto n.º 33:258, que prevê a construção de vários bairros de casas económicas em Lisboa, Porto e Almada, e onde se diz:

Por falta de determinações legais concretas, tem surgido o problema de se saber a quem compete a conservação dos arruamentos e logradouros comuns dos agrupamentos de casas económicas. É esse aspecto definitivamente estabelecido no presente diploma : todos os agrupamentos de casas económicas são integrados nas zonas municipalizadas dos respectivos concelhos e às câmaras municipais competirá deles cuidar como cuidam da restante área sob a sua jurisdição.

Temos, assim, mais encargos, sem qualquer contrapartida nas receitas, e para uma câmara que já não sabe como satisfazer os que tem com as ruas existentes.

Tantas coisas têm sido aqui ditas sobre os encargos impostos às câmaras que me parece ser desnecessário alongar-me mais.

Depois do que acabo de expor não é de estranhar que cada vez se torne mais difícil encontrar quem queira presidir às câmaras municipais e que para esse efeito se tenha já tido que recorrer, em grande parte, ao funcionalismo civil e militar.

É possível que o municipalismo, que tão grande significado teve no passado o que tanta influência exerceu na formação do carácter português, já tenha feito a sua época e que, portanto, já se não possa restaurá-lo e que, pelo contrário, se tenha de caminhar para uma centralização cada vez maior.

Falta-mo a competência para dizer se assim é, mas sobeja-me a experiência para afirmar que as coisas tal como estão se não poderão manter sem agravamento rio desprestígio que daí está resultando para o Estado.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ricardo Spratley:-Sr. Presidente: embora já tenha tido a honra de falar várias vezes nesta Assembleia, é contudo a primeira vez que o faço em assunto da ordem do dia e, por isso, as minhas primeiras palavras pronunciados do alto desta tribuna serão de homenagem, de respeito e da mais alta consideração por V. ex.ª, fazendo-o, não como um dever de pragmática, mas como imperativo da minha consciência, visto que sinceramente o sinto.

E, ditas estas singelas palavras a V. Ex.ª, peço dispensa de me alongar em mais cumprimentos, dado o meu deliberado intento de ser o mais breve e conciso possível, poupando igualmente aos meus ilustres colegas desta Assembleia a perda de tempo que ultrapasse os minutos necessários para a afirmação, que também daqui lhes faço, dos meus propósitos de devotada cooperação e leal camaradagem.

A finalidade do aviso prévio do Sr. Deputado Rocha Paris foi, por certo, e nos termos do preceituado no artigo 49.º do Regimento desta Assembleia, a de "sugerir ao governo a conveniência de legislar sobre determinadas aspirações ou necessidades" e no caso sujeito, logicamente, no sentido de uma modificação do regime municipal ou das relações entre o Poder Central e os municípios.