432 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 81
4.º A propósito do ensino das raparigas, não há dúvida de que na organi/ação dos cursos como actualmente funcionam só se teve em vista ministrar às raparigas conhecimentos que lhes permitam ganhar a A*ida de forma digna e própria do seu sexo, o que é louvável intenção, mas não pode deixar de se considerar inconveniente a falta de ensino de conhecimentos indispensáveis às futuras mães.
5.º Relativamente ao ensino agrícola, nota-se uma grande falha na educação da população rural. As escolas práticas de agricultura têm limitadíssima expansão (só duas) e são fixas. O Ministério da Economia, por intermédio dos seus serviços, tem feito cursos de instrução profissional com brigadas móveis, que estão obtendo notável êxito, mas estes cursos são puramente técnicos e não ministram aos rurais ensinamentos de carácter geral. Têm grande interesse e é necessário que se espalhem a mais actividades ligadas à terra. Com eles melhora-se tecnicamente o agricultor mas não se f a B educação.
Enunciadas algumas das deficiências que a prática fez notar na reforma de 1930-1931, vejamos se a que agora se propõe as resolve ou melhora.
1.º Quanto à idade do início da instrução profissional, é evidente que traz manifesta vantagem a solução em estudo com a criação de um 1.º ciclo, complemento do ensino primário. Fazendo-se a entrada nele justamente à saída da 4.ª classe, não há interrupção de estudos numa época da vida em que a sua suspensão é particularmente grave. A emenda que a Câmara Corporativa, no seu magnifico parecer, tão cheio de apreciações de indiscutível valor, lembra vai dar maior justeza à ideia que neste ponto informa a proposta de lei e fica resolvida uma situação defeituosa da legislação em vigor.
Vejamos agora quanto à época da escolha da profissão. Se verificarmos que, habitualmente, a idade de entrada neste ciclo será cerca dos 11 e que a sua duração é de dois anos, chegamos à conclusão de que o início do curso da escola profissional propriamente dita cairá aproximadamente nos 13 anos. Número baixo, segundo doutos pedagogos, de acordo com as correntes dominantes nos congressos da especialidade, que as fixa em 14 ou 15. Pretende-se suprimir o inconveniente da escolha da profissão nesta idade estabelecendo no 2.º ciclo, sempre que possível, cursos com preparação básica comum a diferentes profissões.
Não seria preferível ir para mais um ano de estudos neste ciclo? Julgo que sim, mas há que reconhecer nessa solução inconvenientes graves também.
Aceitando o 1.º ciclo com dois anos apenas, porque não vencer a dificuldade de o candidato escolher a profissão com o auxílio do Instituto de Orientação Profissional? O artigo 4.º do decreto n.º 35:402, de 27 de Dezembro de 1945, que criou a Escola Industrial e Comercial Alfredo da Silva, no Barreiro, e que, segundo o preâmbulo da proposta, será a escola-paradigma deste l.º ciclo, diz: «O Instituto de Orientação Profissional prestará à escola a cooperação que lhe vier a ser solicitada quanto à organização do ensino a que se refere o artigo anterior»; não prevê a sua utilização no auxílio ao candidato na orientação da sua actividade futura na vida. Esperemos que, com a colaboração do Instituto de Orientação Profissional, as excepcionais qualidades de adaptação da nossa raça supram os inconvenientes da falta de mais um ano no ciclo preparatório.
Em todo o caso, mesmo neste ponto, a solução proposta melhora consideràvelmente a situação actual.
Julgo a propósito fazer uma leve apreciação à organização a dar a este 1.º ciclo, que conhecemos com, certo pormenor, visto sabermos a da escola do Barreiro, além do que sobre o assunto nos diz a base III da proposta.
Com muito acerto se procura ministrar aos alunos ensinamentos que os tornem elementos com valor social apreciável e ao mesmo tempo se prevêem trabalhos de aplicação, de forma a orientá-los desde o início no sentido profissional, criando um ambiento característico que se devo sentir na escola, se deve respirar no ar que a envolve, como se sente e respira já nas nossas escolas superiores. Para tanto bastará que os professores, munidos de cultura pedagógica suficiente e apropriada, sejam dedicados e conscientes. Não posso deixar de fazer aqui um reparo à organização dos cursos conforme consta do decreto n.º 35:402, no que diz respeito a ensino do desenho. Vejo com pesar e grande apreensão reduzir o número do horas deste ensino. Não se compre de ensino profissional sem desenho, muito desenho, e que nestes primeiros anos deve ser, como está previsto e em uso na citada escola, especialmente desenho à mão, sem auxílio de instrumentos.
Com o ensino do desenho se cultivará o sentido estético do futuro operário e se procurará mostrar-lhe o encanto das coisas bolas. Esta educação do sentimento, da intuição do aluno, não se realizará com a mesma eficiência e intensidade com os trabalhos manuais. É indispensável conseguir que os operários e agentes comerciais não sejam destituídos de bom gosto e não há dúvida de que, aparte disposições naturais, só educação conveniente o consegue.
Tem a educação artística particular interesse nos Açores, onde a paisagem maravilhosa parece não ser suficiente para aperfeiçoar o homem nesse sentido. Praticamente não existe nas nossas ilhas estatuária e a arquitectura é extraordinariamente pobre, mercê da qualidade da pedra, dificílima de trabalhar, e este ambiente gera operários de mãos habilíssimas, dos quais raros são possuidores, já não digo da centelha divina, mas de simples bom-gosto. O ensino aturado do desenho por professor artista virá modificar esta situação e poderá também fazer surgir o iluminado que por falta do oportunidade se desconhece a si próprio. Manifesto pois a minha discordância nesto ponto com o ensino do 1.º ciclo conforme está previsto e nesse sentido apresentarei uma emenda à base m, que julgo de utilidade geral e particularmente vantajosa para as nossas ilhas, parcelas também deste Portugal indivisível.
Ainda a propósito da organização deste ciclo, lembro que também a Câmara Corporativa só bate pelo aumento do número de horas destinadas ao desenho, pelo que me sinto animado por magnífica companhia.
Considera este parecer vantajoso não baixar de oito horas, o que já é pouco, o tempo destinado ao desenho e lembra que, se necessário, à custa da caligrafia ou mesmo do canto coral. Parece-me que não deveria sacrificar-se aquela e muito menos este magnífico elemento educativo. Desejo aqui exprimir o voto de que ao ensino do canto coral se dedique muita atenção, dando aos rapazes o mínimo de conhecimentos de música, só o indispensável, e o máximo de prática. Procure-se, por meio de músicas apropriadas e usando bons métodos pedagógicos, atrair os rapazes e incutir-lhes o gosto pela música cantada em conjunto, animando os nossos futuros operários a criar massas corais, como tanto se usa pela Europa Central, verdadeiro berço desta arte.
Não pretendo que surjam amanhã grupos como o desses maravilhosos cantores, os meninos artistas de Viena da «Wiener Sãnger Knaben», em exibição em Lisboa, mas aproveite-se inteiramente um elemento de larga influência social, como meio até da mais bela solidariedade.
3.º Para a falta, na organização actual, de cursos de instrução geral e aperfeiçoamento de capatazes ou chefes de oficinas está indicada uma solução nos cursos de mestrança, que agora se criam e constituem interessantíssima