766 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 98
Voado-se lã no mercado internacional.
Temos dinheiro para a comprar.
Os produtores, para aguentarem os altos preços da lã nacional, agitam o perigo da exportação de cambiais com que têm de ser adquiridas as lãs estrangeiras.
Ora as cambiais servem para adquirir no estrangeiro o que é essencial à nossa vida.
Dizer a quem mio podo comprar os tecidos aos altos preços provocados pela lã nacional: «Rapa frio porque, em compensação, tons cambiais; sentir-te-ás suficientemente aquecido se te prosternares perante o bezerro de ouro», não convence ninguém.
Acima dos direitos do bezerro está o direito à vida. Primum viver e, deinde... cambialia. A lã estrangeira ó do melhor qualidade. É mais rendosa.
Basta citar que l quilograma de lã merina da Austrália rende mais 30:000 metros de ao do que a melhor lã nacional.
Por ser mais barata, da importação de lã estrangeira resultarão fatalmente tecidos melhores e mais baratos.
Por isso louvo, sem reservas, a portaria do antigo Ministro da Economia Sr. Dr. Luís Supico que restabeleceu a livre importação e exportação das lãs.
O consumidor está asfixiado. Ir-lhe ministrando um poucochinho de oxigénio para que ele possa viver ou, polo menos, arrastar a sua existência significa, na presente conjuntura, defender o interesse nacional.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentada.
O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão por uns momentos.
Eram 17 horas e 25 minutos.
O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 35 minutos.
O Sr. Antunes Guimarães: - Sr. Presidente: poios discursos proficientes pronunciados pelo ilustre Deputado Sr. Dr. Figueiroa Rego, que teve a oportuna iniciativa do aviso prévio que estamos a apreciar, e pelos distintos oradores que se lhe seguiram no uso da palavra, bem como por várias representações enviadas por interessados na produção e na respectiva indústria, verifica-se que neste importante problema das lãs há alguma coisa que não está certa.
Importante, acabo de dizer, porque, no respeitante às diferentes modalidades industriais que o aproveitamento daquela preciosa matéria-prima requer para a multiplicidade das suas utilizações vê-se que se empregam muitos milhares de operários e estão colocados avultados capitais em instalações fabris e nas variadas operações inerentes ao respectivo movimento industrial e comercial.
Mais importante no que respeita à respectiva produção, pois os números com que os ilustres oradores que tivemos a honra de ouvir nos esclareceram demonstram que ela interessa de uma maneira geral a toda a nossa lavoura, desde os simples cabaneiros e casais de categoria modesta, que não vão além de meia dúzia do ovelhas, aos proprietários de áreas maiores, incluindo muitos latifundiários, cujos rebanhos são formados por milhares daqueles utilíssimos ruminantes.
Mas ainda muito mais importante, pelo elevadíssimo número das pessoas afectadas, no que respeita ao vastíssimo sector dos respectivos consumidores, pois, ou seja de pano de modesto tecido ou do mais aprimorado artefacto, não há quem não use como vestuário, por muito pobre que seja, alguma das variadíssimas categorias de lãs a que os ilustres oradores aludiram com incontestáveis conhecimentos técnicos.
E não é só no vestuário, pois que a lã entra na confecção do cobertores e de outros agasalhos com que, do uma maneira geral, todos se defendem do frio.
E, ainda no capítulo da indumentária, é digna do nota aquela espécie de feltro fabricado pela indústria doméstica das regiões montanhosas, como a do planalto barrosão, com que se fabricam os capotes originais que resistem às maiores nevadas, mesmo quando fustigados por autênticos furacões.
Isto sem mais longas referências a outros artigos do largo uso, tais como as meias e as luvas e a imensa variedade de tapetes, que muitas vezes constituem valiosas revelações do arte regional, que embelezam o garantem certo grau de conforto, tanto a moradias modestas como aos mais sumptuosos solares.
Como já aqui se disse, e muito bem, o gado ovino, além de contribuir tão largamente para vestir e agasalhar os habitantes e embelezar-lhes as casas, constitui valiosíssimo elemento de adubação das terras e entra como factor do maior mérito, pelo leite produzido, pelos queijos, alguns de grande renome, que se fabricam em várias regiões do País e, principalmente, mercê da sua apreciada carne, na alimentação humana.
Há ainda a salientar o valor das respectivas peles o de variadíssimos subprodutos de largo o utilíssimo emprego.
Sr. Presidente: pelas reclamações que tivemos ocasião do ler e pelos largamente fundamentados discursos aqui pronunciados conclui-se que, apesar dos importantes valores que se registam naquele importantíssimo sector da produção nacional, ninguém está satisfeito. Os consumidores, claro está, reputam caríssimo tudo o que são forçados a adquirir, quando os recursos tanto escasseiam.
A lavoura queixa-se de que as lãs dos seus rebanhos, se uma ou outra vez têm atingido cotações remuneradoras, frequentemente acontece não compensarem o grande esforço que a sua produção exige a muitos milhares do pessoas e os avultados capitais envolvidos, sem falar no valor das enormes extensões de terreno consagradas às respectivas pastagens.
É não é só sobre o preço corrente das lãs que se ouvem reclamações. A lavoura protesta contra a sua procura irregularíssima, tendo-se aqui falado em grandes stocks armazenados e outros expostos às intempéries, apontando-se até casos do partidas importantes em plena fermentação e, assim, em risco de só inutilizarem completamente, com prejuízos incomportáveis para os respectivos possuidores.
E se no mercado interno não encontram a regular colocação das quantidades normalmente produzidas, o que assim imobilizam grandes capitais, expostos, como acabo de dizer, a completa perda, regista-se que a sua exportação tem sido dificultada por um conjunto do circunstâncias deploráveis.
E, pelo que ouvi, ao lado daquelas grandes existências de lã nacional, para cuja totalidade não tem havido mercado remunerador aquém ou além fronteiras, registam-se enormes quantidades daquele artigo recebido de vários países que, por variadas circunstâncias, conseguem produzir a lã em condições tais que se torna difícil, senão impossível, uma económica concorrência da parte da nossa lavoura.
Por seu lado, a indústria afirma que aquela matéria-prima de procedência estrangeira lhe é absolutamente indispensável para o fabrico de tecidos pedidos pelo nosso mercado consumidor, os quais não seria possível obterem-se em qualidade e preço sem determinada percentagem de certos tipos de lã que só no estrangeiro podem adquirir-se, e reputa em geral cara a matéria-prima nacional.