7 DE MARÇO DE 1947 767
Objecta-se, porém, do campo produtor que a lã nacional, se devidamente tratada, poderia suprir em grande parte a matéria-prima importada.
Tudo se limitaria à instalação de determinada maquinaria e à aplicação de processos técnicos de que a ciência felizmente dispõe.
Desta forma a lã nacional poderia concorrer em muito maior percentagem para o nosso mercado, garantindo-se-lhe assim um escoamento mais regular e cotações estáveis e remuneradoras.
Por outro lado, a economia nacional seria defendida do desequilíbrio resultante da transferência de cambiais avultadíssimas para pagamento de grandes importações daquele artigo, sendo certo que o País de todas há-de carecer para a obra de reapetrechamento de quase todas as indústrias e instalação de muitas outras novas.
Sr. Presidente: num artigo cujo consumo tão fundamentalmente interessa a todos os habitantes, forçoso é providenciar no sentido do que o seu fornecimento seja garantido em qualidades que correspondam satisfatòriamente à multiplicidade das suas utilizações, em tipos que satisfaçam à diversidade de gostos e preferencias e a preços acessíveis às diversas classes sociais e, portanto, na proporção do respectivo poder de compra.
Para isso impõe-se o estudo rigoroso das possibilidades da produção lanígera nacional, no sentido de se averiguar se as qualidades o quantidades obtidas correspondem ao indispensável fornecimento da indústria, para que esta possa abastecer convenientemente o mercado consumidor.
Na hipótese de vir a concluir-se que, mercê de determinados melhoramentos nas pastagens e adaptação de raças ovinas com as características aconselháveis, será possível melhorar-se a qualidade da lã e produzir as quantidades precisas, é evidente que a lavoura deve ser orientada e, se tanto for preciso, estimulada e auxiliada nesse sentido.
Mas se viesse a concluir-se pela inviabilidade de um tal fomento, claro está que à indústria competiria estudar até onde se poderia levar o aproveitamento económico daquela matéria-prima.
Há dificuldades do ordem climática ou relacionadas com a natureza do solo que são irremovíveis para a produção de determinados tipos de lã, que noutros países encontram condições favoráveis; mas nem por isso poderia admitir-se a hipótese de pôr de parte a exploração de rebanhos, a não ser que fosse possível substituí-la por outras actividades pecuárias ou agrícolas de rendimento maior ou equivalente e reconhecidamente vantajosas para a economia nacional.
Outra solução traduzir-se-ia no êxodo inevitável dos habitantes, ou, a preferirem permanecer, numa vida miserável, que importa, para dignificação da raça e prestígio do Estado Novo, não permitir, custe o que custar.
O distinto Deputado Sr. Dr. Figueiroa Rego e outros oradores afirmaram que as nossas lãs, desde que convenientemente tratadas, podem ser utilizadas pela indústria sem prejuízo dos seus legítimos interesses e não contrariando as exigências razoáveis do mercado consumidor.
Sendo assim, ha- que ver a que sector deve competir essa preparação prévia: se aos industriais ou aos lavradores.
Repetidas vezes tenho manifestado nesta tribuna a opinião de que à lavoura devem ser reservadas, sempre que possível, as indústrias complementares daquela actividade, para aumento dos respectivos réditos, que, limitados aos provenientes directamente dos géneros agrícolas, são, por via de regra, muito escassos, e também para que os respectivos subprodutos sejam, tanto quanto possível, aproveitados pela mesma lavoura.
Sr. Presidente: na maioria dos casos, como consequência da divisão da propriedade, para que a exploração dessas indústrias complementares seja economicamente viável, haverá que recorrer a cooperativas de produtores.
Ora esta fórmula, que tem sido coroada de incontestáveis êxitos na maioria dos países, vem sendo geralmente classificada de inadaptável às condições particulares do caso português.
Com tal fundamento vimos assistindo a essa política, que eu sistemàticamente tenho condenado, de se promoverem concentrações em grandes unidades resultantes da supressão do inúmeras unidades modestas, as quais melhor teria sido introduzirem-lhes os melhoramentos que a técnica moderna aconselha, para que os pequenos industriais seus proprietários não se transformassem em capitalistas improdutivos ou viessem a proletarizar-se, com grave dano para eles e para a sociedade.
Lembro o caso do encerramento de numerosas oficinas que trabalhavam no corte e preparação de pelo para a indústria de chapéus, o da condenação de postos caseiros onde se procedia à desnatagem do leito e tantas outras actividades sacrificadas por aquela fórmula, sem justificação económica, mas de funestas consequências sociais.
Felizmente que as palavras pronunciadas no último sábado pelo Ministro da Economia na sua conferência, na cidade do Porto, com a lavoura nortenha são indicadoras de novo rumo, por isso que prometeu rever o problema das zonas de produção de leite afectas às indústrias de lacticínios o autorizar o funcionamento das respectivas cooperativas de produtores.
Eu tenho a esperança de que a política da organização das diferentes actividades que operavam estruturalmente dispersas e sem a indispensável coesão, antes hostilizando-se e prejudicando-se mutuamente, há-de conseguir, sem inutilizar o grau de concorrência que serve de estímulo ao progresso e de defesa ao consumidores, que a fórmula cooperativista triunfe, para que as pequenas unidades económicas se valorizem e formem a barreira indispensável contra todas as tentativas de subversão.
E, uma vez que o ilustre Deputado e experimentado lavrador Sr. Dr. Nunes Mexia nos demonstrou com números indiscutíveis que a lã devidamente lavada e penteada atinge cotações que, mesmo tendo em consideração as despesas daquelas operações, representam grande lucro para a lavoura, eu desejaria se tentasse para isso a constituição de uma cooperativa de lavradores.
Mas na hipótese, aliás improvável, de uma tal empresa vir a ser considerada inviável ou temerária a respectiva organização, seria à indústria que competiria instalá-la, para conveniente aproveitamento das lãs nacionais.
E sòmente depois da intervenção desta nova indústria na indispensável valorização das lãs nacionais ó que deveria ser apreciada a necessidade de importação daquela matéria-prima, para determinação das respectivas quantidades e qualidades.
Ouvi as inteligentes considerações do Sr. Dr. Figueiroa Rego sobre a justiça que haveria, a exemplo do que se passa com os trigos, de se garantir em tal caso um preço razoável à produção nacional.
Justamente na citada conferência realizada no último sábado na cidade do Porto com os grémios da lavoura o ilustre Ministro da Economia tranquilizou aquele importante sector do trabalho, que se mostrava sobressaltado com as sucessivas importações maciças de certos géneros, aliás justificadas pela sua carência actual, mas que, a prosseguirem, poderiam traduzir-se em concorrência esmagadora para a nossa lavoura, que luta com dificuldades desconhecidas noutros países, aquele Ministro, vinha eu dizendo, afirmou, no que respeita ao milho,