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14 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 14

Frei João de Mont-Corbin, enviado à China, pára durante treze meses na igreja de S. Tomé e baptiza aí 100 pessoas. Em 1321 Frei Jordan baptiza 300 indivíduos. Em 1348 o bispo Jean de Marignolli, regressado da China, chega a Cantão, onde na igreja de S. Jorge celebra o santo oficio em Domingo de Ramos.
E eis tudo! Até 1498, data da chegada dos portugueses ao Oriente, o cristianismo na índia limitava-se aos cristãos de S. Tomé no Malabar, à comunidade nestoriana de Kalyan e aos cristãos do rito latino de Cantão.
É pois a Portugal que o mundo cristão deve a floração incomparável do cristianismo na índia, bem como a Santa Sé a submissão a Roma dos nestorianos de Coromandel, graças aos esforços do bispo português Frei Aleixo de Meneses no Sínodo de Diamper em 1599.
E é Goa o centro da nova cruzada. Crescet et floret. E quando a nova diocese é elevada por Paulo IV à dignidade arquiepiscopal (1577) o missionarismo português contará nas diversas dioceses da índia nada menos que 100:000 cristãos, segundo o cômputo de Mons. Leo Kirkels. Que esplêndida multiplicação dos primeiros 22 cristãos indianos baptizados na ilha de Angediva pelos franciscanos do Pedro Álvares Cabral!
Goa, como vedes, não se limitou a receber somente a fé de Cristo. Ela tornou-se o centro de onde irradiou a cultura cristã para todas as terras do Oriente.
E o campo da acção desse missionarismo não se limitou às 3:000 léguas da costa descobertas pelas nossas caravelas, mas estendeu-se pelo hinterland das mais variadas regiões. Edificam conventos, colégios, hospitais e asilos franciscanos e jesuítas. Os dominicanos que trabalhavam nas Áfricas são atraídos pelo esplendor da colheita na índia (1548); os agostinianos largam a Pérsia e Mom-baça e Mascate para se internarem nosjungles de Bengala. (1599); os teatinos trabalham em Golconda, Bijagós e no planalto do Decão (1646); os oratorianos foram servir em Ceilão (1685) a fé que aí estava vacilante após u ocupação holandesa.
E tudo isto - não será demais repeti-lo!- foi obra de padres portugueses, ou de padres educados em escolas portuguesas, ou de padres trabalhando sob a protecção da bandeira de Portugal!
Mas toda essa obra grandiosa não poderia ser levada a cabo sem sacrifícios e sem vítimas!
Sr. Presidente: as fontes de que me servi para este rápido resumo são exclusivamente hauridas em trabalhos de dois compatriotas meus, goeses, aos quais presto a minha homenagem; ambos já mortos e que em vida me honraram com a sua estima: o cónego Herédia e o velho padre Nazaré, cujas Mitras Lusitanas constituem um arquivo de glória para a história eclesiástica de Portugal no Oriente.
Pois bem! Nessa magnifica obra pude contar nada menos que 1:300, mártires da fé, entre 1498 a 1801, massacrados na África Oriental, na índia, em Ceilão, no Extremo Oriente! Os seus nomes e proveniências, as datas e o género do seu martírio estão minuciosamente registados para que os cubra o manto da nossa piedade. Toda a espécie de vítimas, mesmo um bispo - D. Apolinário de Almeida, massacrado em Cinadea em 1638, juntamente com os seus dois companheiros jesuítas. Todos os géneros de martírios: decapitação, esmagamento sob as patas dos elefantes, apunhalamento, veneno, forca, esmigalhamento à boca do canhão, toda a sorte de horrores! Sem falar da carnificina em massa, como a que se deu em 1580, em que por ordem do rei de Ternate, Bab Ulha, foram aniquilados de uma só vez 60:000 cristãos.
Sr. Presidente: no momento em que o santo padre coroou com a auréola celeste a cabeça do mártir João de Brito, no coração dos peregrinos portugueses, no seu
subconsciente, se vincou este sentimento de uma majestade incomparável: que esta canonização é a consagração solene de todos os nossos mártires no Oriente, conhecidos ou anónimos, que se deixaram imolar pela fé de Cristo e que vêem hoje consubstanciada a grandeza do sou sacrifício nessa figura princeps do nosso martirológio que em 22 de Junho foi canonizada na grandiosa Basílica do Vaticano.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na história do missionário português no Oriente, em geral, e na índia, em particular, há três marcos miliários radiantes de luz.
O primeiro é a acção apostólica de S. Francisco Xavier! Cristãos e hindus, parses e muçulmanos acorrem ao seu túmulo, para ali prosternarem a sua humildade perante a grandeza do Infinito. Cerca-o um halo de veneração e de lenda. A sua memória é imortal! Na verdade vos afirmo: a Goa do Hidalcão, que desde há cerca de cinco séculos se tornou a pérola da coroa de Portugal, poderá sofrer os vaivéns do Destino; mas a Goa do S. Francisco Xavier viverá eternamente no coração das cristandades do Universo.
O segundo marco miliário dessa magnífica Via Áurea é o Santo que acaba de ser canonizado. A sua vida é um poema luminoso de ternura e de sacrifício. A acção dos nossos missionários já não tem para a encorajar o prestígio da nossa espada, que declina. Que fazer pois para transpor as barreiras que lhes opõem os povos hostis e levar às almas a paz do Evangelho? Imitar a obra de S. Francisco, mas sob um burel adaptado ao meio que os circunda. É a este período que pertencem os grandes missionários que, camuflados em sanyassis e vivendo a vida humilde e austera dos ascetas orientais, conseguiram fazer jorrar nas almas em treva a luz de S. Paulo. Chamam-se Roberto di Nobili, Constantin Beschi, François Laynez e João de Brito.
O nosso domínio temporal está prestes a extinguir-se. Da espada e cruz, que eram as velhas companheiras inseparáveis, a primeira está muda; só a segunda marcha para cumprir a finalidade que a alma de Portugal havia inscrito no seu ideal de conquista desde os tempos do Infante de Sagres.
A morte de João de Brito em terra que nunca foi nossa dá ao Mundo a prova indiscutível de que o ideal da expansão portuguesa no ultramar teve menos por mira o engrandecimento do nosso domínio temporal que a sementeira nas almas da fraternidade cristã universal. No momento que passa é esse o grande significado político da nossa peregrinação a Roma. É, como vos disse, um testemunho e um desafio ao julgamento da Historia!
Ao terceiro marco pertence a recristianização de Ceilão, devida ao zelo apostólico dos meus conterrâneos goeses padre Jácome Gonçalves e o venerando padre José Vaz, justamente chamado pelo povo o apóstolo de Ceilão. Recolhamos a lição que deriva das suas obras: é a semente lançada pêlos missionários de Portugal que revive e frutifica nos corações dos seus discípulos indianos o mesmo zelo, a mesma austeridade, a mesma abnegação em prol da ceifa na vinha do Senhor.
È esse zelo que fará por vezes que os sacerdotes na índia se excedam na sua missão espiritual, fazendo da Igreja de Cristo o sinónimo de Igreja Portuguesa! Ser cristão tornou-se sinónimo de ser português: donde esse milagre de ver, em terras que estando outrora sob a nossa influência já hoje o não estão, os laços espirituais que ainda hoje as ligam ao velho Portugal de que falavam os seus antepassados!
A alma nacional, num sentimento de profunda ternura, soube compreender e perdoar esses excessos. E, pela pena do seu tão prestigioso príncipe religioso, S. E. o