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8 DE JANEIRO DE 1948 99

Esta demora provocada pelos apartes de V. Ex.ª, que para mim aliás, e para a Câmara foram tão agradáveis, pela parte de V. Ex.ª, que não pela minha, obriga-me a encurtar as minhas considerações para não exceder a hora regimental.

as há pior: a excepção estabelecida a favor das tabernas não rouba o descanso só aos que as servem; rouba-o também a tantos que as frequentam.
A etiologia demonstrou há muito que a embriaguez causa ao organismo que a suporta maior perda de energias do que um dia normal de trabalho. Deve pois concluir-se que a embriaguez ao domingo representa a anulação do descanso e por isso de todos os benefícios que ele se destina a produzir.
E o número de ébrios que a abertura da taberna ao domingo ocasiona é também muito elevado, pois já Oliveira Martins, que conhecia o País, dizia que são todos os que vemos e mais metade dos que não vemos. E os que vemos por esse País fora são já muito numerosos, vergonhosamente numerosos.

O Sr. Homem de Melo: - Não concordo.

O Orador: - A concordância ou discordância de V. Ex.ª não pode ter referência para comigo. A opinião não é minha, é de Oliveira Martins.

O Sr. Homem de Melo: - Pois não concordo com Oliveira Martins.

O Orador: - É pena que ele não possa responder a V. Ex.ª ... Em qualquer caso, não me parece que a discordância de V. Ex.ª tire qualquer valor à minha argumentação.
Gostaria que V. Ex.ª me dissesse se julga reduzido o número de ébrios ao domingo.

O Sr. Homem de Melo: - O que estou convencido é de que nem todas as pessoas que nós vemos ao domingo estão ébrias!

O Orador: - Também eu; mas digo, como Oliveira Martins, que o não estão só aquelas que os nossos olhos vêem. Não todas as pessoas que vemos, mas todos os ébrios que vemos. Foi isto que Oliveira Martins disse e não o absurdo que V. Ex.ª, por defeito meu, por certo, parece ter compreendido.
Se V. Ex.ª não concorda, terei eu de salvar a honra de Oliveira Martins.

O Sr. Homem de Melo: - Para que cita V. Ex.ª isso?

O Orador: - Para demonstrar que de facto todas essas pessoas estão privadas do descanso semanal, e portanto que a abertura da taberna ao domingo é contrária à lei que o garante a todos os trabalhadores.
O vício da embriaguez está a alastrar no nosso País como uma chaga pavorosa, e ou nós pomos termo a esta calamidade ou deixamos naufragar muitos dos melhores valores das nossas aldeias.

O Sr. Homem de Melo: - No meu círculo, e para honra dos meus eleitores, isso não acontece.

O Orador: - Eu não preciso de falar nos meus eleitores porque todos sabem antecipadamente que estão longe destes comentários, porque os conheço e me conhecem muito bem. E isto sem propaganda eleitoral, que não é lugar para ela...
Pode pois concluir-se desse passo que aquela excepção do decreto n.° 24:402 é atentatória da lei fundamental do descanso e como tal tem de ser revogada. Mas o regime das tabernas não é só ilimitado no tempo; é também ilimitado nos meios, isto é, no seu funcionamento e no modo como é exercido o comércio dos vinhos.
No intuito de corrigir e pôr termo à indisciplina com que funcionavam as tabernas, foi publicada em 25 de Fevereiro de 1924 a lei n.° 1:547, que proibia a «entrada nas tabernas de menores de 15 anos»; o decreto n.° 12:708, de 22 de Fevereiro de 1928, dispõe no seu artigo 1.° que «é expressamente proibido, em qualquer hora e estabelecimento, seja de que natureza for, vender ou fornecer vinho ou bebidas alcoólicas a indivíduos em estado de embriaguez e bem assim a entrada e permanência desses indivíduos em qualquer casa de bebidas».
Pelo artigo 2.° é igualmente proibida a entrada na taberna a menores de 15 anos de ambos os sexos.
Pelo artigo 3.° o mesmo diploma ordena que «Aos estabelecimentos de venda de vinho e outras bebidas alcoólicas será retirada a licença e ordenado o encerramento pela autoridade competente quando se tornem focos de desordem e de perturbação do sossego da vizinhança ou ainda da moral e da decência públicas pela sua má freguesia».
A lei disciplina, pois, ao mesmo tempo a actividade dos vendedores e dos frequentadores: aos primeiros, tornando as tabernas casas de venda de vinho, e não fábricas de ébrios; aos segundos, obrigando-os a respeitar a ordem e a moralidade dentro desses estabelecimentos. De uma e outra disciplina torna responsável a lei os donos das tabernas e por isso lhes aplica a pena de encerramento quando essa disciplina se não observa. Ora, que vemos nós por esse país fora ? Vemos, ao domingo, as tabernas repletas de jovens e de ébrios, a quem é vendido vinho sem qualquer limitação; vemos as tabernas transformadas em oficinas de embriaguez e mudadas em escolas de imoralidade, centros activos da criminalidade. Em que medida? Citarei dois factos que conheço de perto. O Sr. governador civil da Guarda, para fazer cumprir estas disposições da lei, viu-se obrigado a fazer encerrar num só ano 800 tabernas. Segundo «estatísticas dos tribunais, a quase totalidade dos crimes neles julgados são cometidos ao domingo e nas tabernas. As tabernas ao domingo são pois focos de imoralidade, fábricas de ébrios, fonte caudalosa de criminalidade.
Enfim, a ilimitacão no espaço:
Que dispõe a este respeito a lei? Os decretos que acabo de citar proíbem «a instalação de novos estabelecimentos de venda de vinho ou quaisquer outras bebidas alcoólicas a copo num raio de 500 metros em Lisboa e de 200 metros em outras localidades em torno de edifícios públicos.
Aqui temos de considerar o local que ocupam o a distância a que se encontram as casas de venda de vinho a retalho. A ambas a lei faz referência e promulga disposições claras o precisas.
Quanto ao local: a referida lei n.° 1:547 proíbe «a instalação de novos estabelecimentos de venda de vinho e outras bebidas alcoólicas, a copo, num raio de 500 metros em Lisboa e de 200 metros nas outras localidades, em torno de edifícios públicos e em especial escolas»; o decreto n.° 15:602 alterou esta disposição e proibiu a instalação de novos estabelecimentos de venda de vinho num raio de 300 metros em Lisboa, de 200 metros nas demais capitais de distrito e de 100 nas outras localidades, em torno de edifícios onde estejam instalados escolas ou quartéis.
Como se cumprem estas disposições da lei?
Em 1934 a Liga de Profilaxia Social do Porto, perante o inêxito que cobriu as reclamações de um ilustre professor do Liceu Rodrigues de Freitas, promoveu um inquérito junto das Faculdades, liceus e escolas técnicas e de ensino primário «sobre as vizinhanças molestas que põem em risco a saúde e a moralidade dos alunos». E os resultados foram surpreendentes. Em