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14 DE JANEIRO DE 1948 143

Nesse Congresso, que foi o oitavo da Associação do Casamento Cristão, o Prof. Jean Pieri classificou o alcoolismo de antinomia da selecção dos fortes, agente da selecção dos fracos.
Produz hecatombes, degenera a Raça; 31 por cento dos alienados (Magnan e Boucherran), 17 por cento de epilépticos (Escheverria), 1,10 por cento dos suicídios (Brière de Boismount), causa grande parte dos abortos, da mortinatalidade e da mortalidade precoce. Envenena as fontes da vida, porque se fixa, de preferência, nos órgãos da reprodução (Forel, no Congresso da Haia em 1911, verificando-se o mesmo no Congresso de Londres, de 1912, ali afirmado pelo professor norueguês Alfredo Mjoen).
E poderá atribuir-se a exclusividade das causas destas perturbações a um alcoolismo provocado apenas pelas bebidas espirituosas?
Até onde vai, em tais anomalias, a responsabilidade do uso imoderado do vinho?
É pena, na verdade, que não haja nas estatísticas uma distinção entre estas várias causas de degenerescência: doenças causadas pelo vinho e doenças causadas pelas chamadas bebidas espirituosas.

O Sr. Moura Relvas: - V. Ex.ª dá-me licença?
Mas hoje, em Medicina, ó clássica esta ideia: que de facto o vinismo não é um mal; o que é um mal é o alcoolismo, como expliquei nessa tribuna. Isto é clássico; não vim trazer novidades.

O Orador: - Muito bem, muito bem... Mas o que eu dizia é que é lamentável que não possa distinguir-se nestas estatísticas o que é proveniente do vinho ou das bebidas espirituosas.

O Sr. Moura Relvas: - Causas especiais de embriaguez que produzem até a chamada gastrite alcoólica, hão-de existir sempre, com tabernas ou sem elas, sem vinho ou com vinho. Nós estamos a considerar o problema como flagelo social. Ora eu mantenho que como doença social o alcoolismo não existe em Portugal, exactamente porque consumimos vinho.

O Orador: - Muito bem, perfeitamente... Eu entendo o pensamento de V. Ex.ª

O Sr. Moura Relvas: - Muito me apraz ouvir essa afirmação de V. Ex.ª

O Orador: - Mas, som considerar arrojada a informação, direi que além disso é preciso atender ao nosso clima, bem diferente do clima existente, por exemplo, nas regiões escandinavas ou na Inglaterra, climas frios, e à necessidade que aí há de bebidas fortes que os atenuem.
Mas, voltando ao assunto: o já citado higienista brasileiro, Dr. Keln, relata-nos este curioso caso da sua clínica:
Conheceu um casal que teve duas dúzias de filhos.
E conta-nos, a propósito:

O pai era um alcoólico inveterado e a mãe unia histérica, filha, por sua vez, de pai ébrio. Apenas oito filhos sobreviveram; dezasseis morreram prematuramente na primeira infância ou nasceram mortos. Dos sobreviventes que se criaram, o mais velho, o menos sacrificado, ao atingir 30 e poucos anos, apresentou-se com graves perturbações cardíacas e renais; o segundo, já falecido, tinha um braço paralítico o curto; o terceiro sofria de acessos nervosos e morreu tuberculoso; o quarto morreu em consequência de um acidente; o quinto é um moço com desordens psíquicas, actualmente internado numa casa de alienados; o sexto é um degenerado psíquico, com tendência para a alienação. O filho mais velho casou-se, tendo três filhos, um dos quais disforme e dois de débil constituição.

Quadro horrível! Não terá nele a menor responsabilidade o vinho?
Seria conveniente saber-se até onde vai a acção do excesso do álcool vínico nesta degenerescência da Baça, nesta horrível tragédia dos atingidos pelas taras, por não terem autodomínio sobre-as suas tentações.
Ao Sr. Dr. Beleza dos Santos, com quem conversei há poucos dias por acaso e que encontrei em viagem, perguntei se na Tutoria da Infância de Coimbra se apercebeu que os pequenos que revelavam insuficientes possibilidades de reeducação para qualquer trabalho útil, que se revelavam inadaptáveis, eram filhos de alcoólicos bebedores de bebidas espirituosas; se se fez alguma vez distinção nos respectivos inquéritos entre pais bebedores de vinho apenas ou bebedores de aguardente ou outras bebidas espirituosas. Respondeu-me negativamente.
O que eu posso afirmar a VV. Ex.ªs, e todos sabem por observação semelhante com certeza, é que os ébrios, por emborcarem sucessivos copos de vinho em longas ou várias visitas às tabernas, são em grande número por esse País fora. E há necessidade de combater do mesmo modo esse vergonhoso espectáculo e esse mal social, tão perigoso como o do ébrio por bebidas espirituosas.
Eu confesso que grande parte dos indivíduos que conheço na zona rural e que se embriagam usam apenas a caneca do vinho, aquela caneca que o nosso poeta João Peulia cantava em versos heróicos, debruçado sobre ela, nas a Camelas» ou no «Homem do Grás», na boémia de Coimbra, que tanto apreciou.
Sr. Presidente: vou reduzir as minhas considerações para focar um outro problema rapidamente.
Haverá ou não remédio para, sem prejuízo do consumo necessário do vinho, pôr cobro a este espectáculo deprimente da taberna?
Haverá remédio ou não? A taberna para o trabalhador rural deverá continuar a manter-se, porque representa a sua distracção necessária?
Não haverá maneira de coibir o abuso da taberna, a sua permanência - até altas horas aberta -, a sua profusão - ruas inteiras cheias de tabernas, nas cidades, a pequena distância umas tias outras e próximas de locais impróprios?
O remédio está na lei e o que é preciso é cumpri-la. O governador civil do meu distrito, funcionário distintíssimo do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, de que é delegado, resolveu o caso rapidamente: indefere sistematicamente todo o requerimento que lhe é dirigido para a instalação de tabernas. Já há tabernas demais; o que é preciso é restringi-las, diminuir o seu número e dar outros meios de distracção aos que delas se servem para esse efeito.
É aqui o predomínio do aspecto social e moral do problema.
A taberna, na verdade, é na sua própria insuficiência higiénica, absolutamente fora de qualquer inspecção ou fiscalização, local impróprio para aí permanecerem pessoas durante horas sucessivas.
São, na sua maioria, antros hediondos, imundos locais, onde se vegeta e se entenebrece o espírito. São triste índice da civilização de um povo. Referiu-se há pouco o Sr. Deputado Pinheiro Torres ao que se passou em Braga. Houve ali um protesto da imprensa local e em correspondências para diários do