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496 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 146

mente o contrário do que, com clareza, se dizia nos documentos oficiais.
Um exemplo, entre muitos: alguém me escreveu, aflitíssimo, porque a base XXIX-A obrigava os inquilinos do Estado a pagar de uma só vez todos os aumentos. E protestava, indignado, contra esta prepotência de um Estado rico. Ora, como VV. Ex.ªs sabem, a base XXIX-A do segundo parecer da Câmara Corporativa não se refere ao Estado proprietário, mas sim ao Estado inquilino. E obrigará este, se for aprovada, a pagar, como inquilino, aquilo que não se exige aos arrendatários particulares...
Ao fazer história vou responder aos ataques injustos que o Governo, a Câmara Corporativa e a Assembleia Nacional tem recebido por parte de quem ilude os pobres de espírito, que, à míngua de conhecimentos, próprios, aceitam todas as opiniões de mal dizer...
A crise de habitação surgiu em Portugal, como consequência da péssima acção governativa, antes, durante e principalmente depois da guerra de 1914-1918. Como sempre, os estadistas, movidos por preocupações demagógicas, em vez de encararem francamente o problema, sacaram sobre o futuro. Après móis lê déhige!, como se dizia nas velhas monarquias, ou «quem vier atrás que feche a porta», mais democraticamente falando.
Perante uma moeda que chegou a perder 97 por cento do seu poder de compra, os ilustres e incomparáveis governantes de então começaram por suspender provisoriamente a liberdade contratual e, pouco a pouco, à custa de artifícios e ilusões, criaram uma nova classe de senhores feudais, privilegiados, garantidos contra tudo e contra todos, cujos forais se iam acrescentando, sempre em nome dos espoliados contra os espoliadores, sempre em nome da maioria contra a minoria, da política de votos contra a política de justiça.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Deve dizer-se que o fenómeno não foi só local, que o fenómeno não foi só português, foi geral, e deve. acrescentar-se mesmo que ele teve uma acuidade muito maior na generalidade dos países do que a que teve em Portugal.

O Orador: - Por enquanto só estou a fazer história.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Também eu.

O Orador: - Mas nunca ninguém se lembrou dos senhorios pobres espoliados por inquilinos ricos. Nem se reparou no golpe profundo vibrado na iniciativa de construir.
Com o rodar dos tempos, sucedeu o inevitável: os senhores feudais conservaram e defendem por todas as formas os seus privilégios; mas hoje grande parte da população portuguesa paga rendas caras devido ao caso de um certo número de antigos inquilinos beneficiar de rendas baratas. Esta é a verdade: os novos locatários são as maiores vítimas dos antigos.
O Estado demagógico, com as suas leis iníquas e anti-sociais, dificultou a construção civil, reduziu a concorrência e provocou a alta de rendas. Criou-se uma situação de desigualdade revoltante entre antigos inquilinos e novos inquilinos. Os novos não encontram protecção, porque toda ela foi reservada para os antigos. Quem pretende constituir um novo lar o quem é forçado a mudar de residência, ou paga exorbitâncias ou- sujeita-se a viver na mais triste promiscuidade, por quartos alugados ou partes de casa.
Criou-se o «mercado negro» da habitação, fomentou-se a habitação a retalho... tudo por culpa dos estadistas do passado, que fizeram assistência com o dinheiro dos senhorios em vez de a fazerem com o dinheiro do Estado.
Sr. Presidente: nada me indigna mais do que os beneméritos que armam em generosos à custa dos haveres alheios.
Depois de a situação se tornar angustiosa e os protestos subirem em maré alta, tentaram-se soluções, como sempre tardias e insuficientes. Justiça a prestações e fomento a conta-gotas.
Quando a moeda valia a trigésima parte, multiplicaram-se por dez as rendas antigas. Porque ninguém construía, decretaram-se isenções de sisa e contribuição predial. E como, mesmo assim, a iniciativa particular, descrente da boa fé dos legisladores, teimasse em não cobrir a procura, o Estado meteu-se a construtor e surgiram, com acompanhamento de guitarra, os tristes fados dos bairros sociais!
Necessitavam-se dezenas de milhares de habitações. Eis senão quando, para efeitos de propaganda política, começa a construção da milésima parte das casas indispensáveis. Grande obra, monumento extraordinário do zelo social, de honestidade de processos, de dinamismo ou de velocidade de execução, de espírito administrativo e concepção económica!
Padrões imorredoiros duma época excelsa e inesquecível, os bairros sociais do Arco do Cego e da Ajuda ficaram como símbolos de liberdade para cevos e de ajudas para bons democratas.
Entre muitas outras coisas, também herdámos esses bairros. Sentimo-nos envergonhados pelo facto de termos sido forçados a construí-los de novo e a pô-los em condições de finalmente, serem habitados. Mais envergonhados nos achamos ainda por, em contrapartida, podermos oferecer aos vindouros coisas comparáveis: a nova cidade de 50:000 habitantes que a Câmara Municipal de Lisboa está erguendo no sítio de Alvalade, nas cercanias da Avenida Alteres Malheiro, mostrará aos manes desse vulto da República as realizações posteriores ao 28 de Maio. Mas ainda não convenceu os contemporâneos.
Os bairros da (Quinta da Calçada, da Boavista, das Furnas, do Caramão da Ajuda, da Encarnação, de Belém, da Madre de Deus, de Caseias e Alvito, para só falar nos de Lisboa, também servem de termo de comparação entre duas políticas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E as habitações, aos centos, aos milhares, que por esse País fora vão surgindo, são realidades indiscutíveis ... mas pouco agradecidas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: aceito, compreendo, desculpo e, muitas vezes, patrocino as queixas de vítimas de injustiças, de párias, de iludidos, de incompreendidos e de infelizes. Ainda não realizámos tudo, ainda não estamos contentes com a nossa obra. Mas não aceito, não desculpo nem aplaudo as queixas ou as críticas derivadas daqueles sectores que, por inércia ou covardia, por desleixo ou transigência, nada fizeram no passado senão sacar sobre o -futuro - e hoje nos atacam por não termos podido remediar ainda, completamento, as consequências dos erros que eles próprios cometeram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Posto isto, vamos analisar o presente.
No problema do inquilinato existem uma questão fundamental e questões subsidiárias. Estas são apenas consequências daquela.
A questão fundamental é a renda As subsidiárias são as maiores ou menores limitações da liberdade contratual, as anomalias ou desigualdades jurídicas ou proces-