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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 150 562

Esse direito, como tem sido notado, atenua à especulação com terrenos destinados a construções, permitindo ao proprietário beneficiar do aumento de valor do solo e às classes menos abastadas a aquisição de casas próprias.
O argumento de que se trata de mais uma propriedade imperfeita não é aceitável.
O ódio às propriedades imperfeitas que, em tempos, levou o nosso venerando colega Dr. Antunes Guimarães a propor a supressão delas, resulta de uma confusão.
Há propriedades imperfeitas de índole arcaica como a enfiteuse e subenfiteuse, o censo, o quinhão e o com-páscuo.
No entanto, o Código manteve-as e justifica-se que quase todas ainda se mantenham.
Outras propriedades imperfeitas, como o usufruto, o uso e habitação e as servidões, são absolutamente necessárias.
Sempre que seja possível, põe-se termo às servidões e por isso se confere o direito de preferência na compra de prédios encravados ou dos serventes deles.
Mas o facto de o legislador contribuir, desse modo, para a extinção das servidões não pode levar até ao exagero de proibir estas, tornando assim impossível a utilização de prédios que carecem em absoluto desse encargo imposto noutra propriedade.
O direito de superfície, se mergulha as suas raízes no direito romano, com a sua actual fisionomia constitui instituto moderno e que tem as maiores vantagens para fomentar a construção.
Por tudo isto não compreendo que a constituição do mesmo direito seja apanágio de entidades públicas.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: -Como concilia V. Ex.ª a alteração com os n.ºs 3 e 4 da base, que exigem hasta pública?

O Orador: - De um modo muito simples: dando nova redacção aos nºs 3 e 4 da base XVII-A, para o efeito de limitar a hasta pública ao caso de a superfície ser constituída pelas entidades públicas a que a mesma base se refere.
Tenho dito.

O Sr. Soares da Fonseca: - Sr. Presidente: duas breves palavras para responder às brilhantes, como aliás sempre, considerações do Sr. Deputado Sá Carneiro.
Afirmei há pouco que, além de não ter vincada tradição na história do direito português, o direito de superfície é praticamente ignorado pela legislação vigente, onde se torna impossível descobrir-lhe contornos definidos. S. Ex.ª entende, contra mim, que tal direito existe, e citou como prova o artigo 2308.º do Código Civil.
Ora, salvo o devido respeito pelos critérios alheios, chama-se a isto forçar a nota. O artigo 2308.º, se alguma coisa prova, é a sem-razão de S. Exa.
Na verdade, o artigo 2308.º está no capítulo da acessão, que é uma figura jurídica tipicamente diferente do direito de superfície.
Como tal, o Código Civil inscreveu-o até, e bem, fora dos agrupamentos em que trata da propriedade imperfeita- sendo certo que o direito de superfície é uma modalidade da propriedade imperfeita.
E, se isto não bastasse, eu diria ainda que, longe de ser consagração, mesmo indirecta, do direito de superfície, o artigo 2308.º é clara manifestação da vontade da lei contra as formas de propriedade imperfeita. Não trata o artigo da defesa do dono de árvores implantadas em terreno alheio; cuida de assegurar ao dono do prédio onde existam árvores alheias o direito de as adquirir. Por outras palavras, não define e não estrutura qualquer forma de propriedade imperfeita; regula a acessão, que
é simples direito de fruição, e em ordem a defender o uso da propriedade perfeita.
Fica, portanto, de pé a minha afirmação sobre a posição do direito de superfície no quadro dos nossos institutos jurídicos.
Citou depois o Sr. Deputado Sá Carneiro vários casos concretos que em nada atingem a essência da minha tese - já porque se trata de vestígios ou vagos índices de um suposto direito de superfície a favor do que os latinos chamavam plantatio (árvores), quando estamos a tratar do direito de superfície a favor da construção de casas; já porque tais casos concretos dizem respeito a figuras jurídicas diferentes do direito de superfície (e por isso o chamei suposto direito).
Aludiu também S. Ex.ª a que, excluindo os particulares, a proposta do Governo criava uma espécie de privilégio a favor do Estado e das autarquias locais.
Em boa verdade, não se trata de privilégio. Pelo contrário, trata-se de o Estado ou as autarquias locais abdicarem de receber de uma só vez e imediatamente o preço dos terrenos destinados a construção. Há um sacrifício de receitas imediatas e, portanto, da tesouraria em prol de um bem maior para a comunidade, qual é o do fomento e barateamento das construções de prédios urbanos.
Acresce que, em regra, os terrenos para estas construções não são cedidos aos construtores pelos particulares, mas pelo Estado e pelas autarquias locais. E, assim, o alargamento defendido pelo Sr. Deputado Sá Carneiro viria a ser, na prática, pouco mais do que inútil.
Finalmente, o Sr. Deputado Sá Carneiro não chegou a encarar os sérios receios por mim apontados à ideia de se introduzir o aditamento proposto pelo Sr. Deputado Cunha Gonçalves dentro de um conjunto de bases que podem não estar em condições de se harmonizarem com tal aditamento. E isto é muito importante, de momento mesmo talvez o mais importante.
Disse.

O Sr. Sá Carneiro: - O Sr. Deputado Soares da Fonseca é muito hábil, mas parece-me que o argumento por S. Ex.ª tirado do artigo 2308.º do Código Civil tem qualquer coisa de sofístico.
Se o proprietário do terreno pode adquirir árvores de outrem que existam no terreno daquele é porque há um superficiário - o dono das árvores.
E tão sagrado respeito merece essa propriedade que em algumas regiões do nosso País, se o dono do terreno usasse da faculdade legal de expropriação, a sua atitude seria considerada indigna.
Salvo todo o respeito, não é exacto que eu não tivesse indicado um só exemplo de direito de superfície relacionado com a construção urbana.
Apontei precisamente os arrendamentos que, às centenas ou milhares, existem relativamente a terrenos no Porto, onde se tem construído imenso, desde há dezenas de anos.
Portanto, esse autêntico direito de superfície favoreceu muito a construção.

O Sr. Soares da Fonseca: - O que eu pergunto é se favorece agora.

O Orador: - Não vejo uma única razão para que assim não aconteça.
A situação é a mesma que existia quando esses contratos se fizeram sob o disfarce de arrendamento.
Como então, há terrenos incultos, que pouco ou nada dão ao proprietário, e que ficam valorizados com a construção; há, do outro lado, pessoas com desejo de edificar, mas que veriam absorvidos pelo preço da compra do terreno grande parte do pequeno pecúlio de que dispõem.