17 DE JANEIRO DE 1951 261
Mas não é esse aspecto que agora interessa. O que naturalmente desperta a nossa atenção é o problema de saber se tal princípio cabe ou não cabe, sem esforço de dialéctica, nó quadro do sistema legal português. A tal respeito bastará talvez dizer, omitindo outras razoes que não nos parecem oportunas, que essa orientação do assento passará de ora avante a aplicar-se aos delinquentes do foro comum, mas só a estes, porque quanto aos delinquentes sujeitos ao foro militar, ao contrário, aplicar-se-á o princípio oposto, que era defendido pela quase unânime corrente da doutrina nacional, visto que é BSSB o que se encontra especialmente expresso no artigo 532.º do Código de Justiça Militar.
E que dizer ainda da tantas vezes reduzida pluralidade de votos com que os assentos são tirados, a denunciar a fragilidade do comando?
Convirá prolongar a observação deste exame que declara tacitamente, e em visíveis termos, a hesitação do princípio que se torna lei e em que a argumentação vencida é por vezes mais lúcida e convincente do que a vencedora?
Sr. Presidente: pelo que acabo de referir e pelo que deste lugar já foi exposto nos dias anteriores, sou também da opinião que com o actual mecanismo dos assentos não se obtêm os efeitos desejados, aqueles efeitos que importa maximamente satisfazer.
Que soluções devem então encarar-se? Se me permitirem, arriscarei duas linhas de orientação, cada qual visando um campo de aplicação.
Nas hipóteses de conflitos latentes, esses que prometem arrastar-se indefinidamente vários e abúlicos, parece-me que a função de os reparar devia ser cometida ao Governo, aliás, esta solução estaria dentro das nossas tradições legislativas, contidas na Portaria de 27 de Outubro de 1898 e na Lei n.º 706, de 16 de Junho de 1917.
Mas não vejo inconvenientes que em posição, ou separada ou, simultânea, fosse atribuída à Assembleia Nacional tal função, quer por via oficiosa quer por via da representação, prevista no Regimento.
Quando, porém, a divergência de julgados surgir pela primeira vez em processo que está em curso, parece-me que não deve deixar-se a parte que foi surpreendida com a inovação do julgado sem possibilidades de reacção, de modo a alcançar uma solução votada pela maioria dos julgadores.
Subsistiria então para estes casos o recurso ao tribunal pleno nos moldes hoje em vigor, modificadas que fossem as condições actuais do mecanismo com as alterações que a experiência aconselha.
Mas estes problemas das soluções serão para estudar com prudência e com competência, não por mim, mas por VV. Exas, que mais qualificados estão para o fazer.
O meu objectivo é apenas o de proclamar necessidades e anseios, e, portanto, nesta parte penso que referi o essencial.
Vou terminar, agradecendo a atenção com que fui escutado e pedindo desculpa do prejuízo de tempo que, talvez baldadamente, tenha tomado aos trabalhos desta Assembleia.
Não apoiados.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. José Meneres: - Sr. Presidente: permita-me V. Ex.ª que saia da ordem do dia, por um instante apenas, para, aproveitando a circunstância de estar no uso da palavra, render uma última homenagem à memória do falecido Deputado Dr. João Antunes Guimarães, que, sobre ser ornamento valioso desta Assembleia, foi também, e sem sombra de dúvida, um dos mais convictos e úteis alicerçadores da situação política em que vivemos.
Fui seu amigo pessoal desde muito antes do advento da Revolução Nacional e na convivência com ele aprendi a conhecer quanto o seu desinteresse pessoal se antepunha aos interesses alheios, que, como verdadeiro homem bom quê era, ele defendia com persistência, principalmente os dos pequenos e humildes que o procuravam e dele se abeiravam como incontestado protector que deles era.
A prova disso está na manifestação de pesar que as classes humildes lhe prestaram, acompanhando-o anonimamente, mas sentidamente, ao lado das autoridades e representações oficiais, no funeral que se realizou no Porto.
Eleito como ele pelo círculo eleitoral do Porto, eu, que não estive presente na sessão desta Assembleia em que se exaltou a sua memória, não podia deixar de pronunciar estas ligeiras palavra de saudade para quem faz tanta falta à representação e defesa dos interesse do Norte do País nesta Assembleia.
E, ditas elas, vou, embora resumidamente, dar também o meu contributo para a análise do aviso prévio do Deputado Sr. Dr. Tito Arantes.
É fora de dúvida que a possibilidade de uniformização da jurisprudência por via dos assentos, designação que a esta espécie de acórdãos foi inicialmente dada pelo próprio Supremo Tribunal de Justiça e, segundo creio, por sugestão do conselheiro Basílio da Veiga, foi salutar princípio introduzido na nossa legislação contemporânea, pondo os interessados a coberto de incertezas, cuja solução, a maior parte das vezes, dependia exclusivamente do jogo da distribuição dos pleitos entre os juizes componentes dos tribunais superiores.
Estabelecida a doutrina pelos assentos e tornada obrigatória, deixam os pleiteantes de ter dúvidas sobre o alcance da lei, e tanto basta para que o princípio se mantenha, embora nem sempre tenha sido correctamente usado.
Alguns dos assentos proferidos são susceptíveis de censura, mas eu abstenho-me de o fazer nesta Assembleia, que não é academia de jurisprudência, mas sim, e apenas, câmara política, e é só sobre o aspecto estritamente político ou genérico que me ocupo do caso.
Tenho até certo melindre, neste lugar, em referir-me especificadamente a eles, dado que a sua apreciação pode deixar supor (o que, aliás, está, evidentemente, fora do espírito de todos os Srs. Deputados que me antecederam nesta discussão), pode deixar supor, repito, uma invasão de funções e competências que não pode nem deve haver.
O Supremo Tribunal de Justiça, pelo que representa na orgânica nacional, tem de estar acima de todas as críticas, e as suas decisões têm não só de ser acatadas, mas respeitadas. Não se discutem.
Se são por vezes más, como aqui já se acentuou, temos de admitir que o vício não vem do órgão de que dimanam, mas sim, e apenas, de um defeito de composição ou de organização, que não é tão boa quanto seria necessário para que tão alta instituição se prestigie como é da sua obrigação e desejo de todos nós.
E daqui vem que discordo de todas as sugestões que se formularam no sentido de que os assentos, uma vez proferidos, venham seguidamente ao Governo ou à Assembleia Nacional, para simples ratificação ou para serem discutidos como propostas de lei.
Quer os assentos tivessem carácter definitivo dentro do pleito quer não, sempre a sua discussão obrigatória nesta Assembleia, ou a sua apreciação no seio do Governo colocaria o Supremo Tribunal de Justiça, o mais