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24 DE FEVEREIRO DE 1951 417

que começou a ser usada contrastava com as melhores tradições nacionais, carece hoje totalmente de propriedade para exprimir o actual regime de relações entre o Estado e a Igreja.
Acresce que nas constituições mais modernas, como, por exemplo, a italiana, votada, aliás, por uma assembleia de Deputados das mais diferentes ideologias, muitos dos quais, como os comunistas, nada simpatizantes com a Igreja Católica, o termo não aparece. Foi substituído pela palavra «independência», sem dúvida mais rica daquele sentido que se pretende fazer vingar.
Seria pois conveniente que a expressão «regime de separação» fosse substituída pela de «regime de independência de poderes», ou, ao menos, pela de «regime de separação de poderes». Separação, sem mais nada, é que não.

ARTIGO 46.º

5. Nova redacção sugere igualmente a secção para este artigo.
Depois da posição especial que é reconhecida à Igreja Católica no artigo anterior, parece-lhe que a proposta de lei a contradiz, ou, pelo menos, atenua neste. Nada convém desprezar do que sirva para conservar e até desenvolver a unidade religiosa do povo português. A história dá-nos eloquente depoimento sobre o alto valor que ela teve sempre no destino da Nação. Além disso não se vê necessidade de referencia aqui ao regime de separação, já que nunca existiu, nem é provável, que venha a existir, qualquer espécie de união entre o Estado e alguma das confissões religiosas aqui mencionadas.
E também é de opinião que, dadas as alterações propostas para o artigo anterior, bem pode ser suprimido este, e a sua doutrina incorporada no seu § único, que passaria a pertencer ao artigo 45.º

6. E se lhe fosse permitido tocar num artigo que não é contemplado na proposta de lei, esta secção lembraria ainda que do artigo 48.º, relativo também a matéria de interesse comum para a Igreja e o Estado, desaparecesse a mal sonante expressão «carácter secular». A Igreja não concordará jamais com o princípio da secularização dos cemitérios, que considera sagrados. Mas resigna-se com os factos consumados. Não vale a plena insistir, sem necessidade, numa questão que perdeu a oportunidade.

III

Conclusões

7. Nestas condições, a secção de Interesses espirituais e morais tem a honra de propor que os artigos 45.º, 46.º e 48.º tenham a seguinte redacção:

Art. 45.º O Estado reconhece o dever social de render homenagem a Deus. É livre o culto público ou particular da religião católica como da religião da Nação Portuguesa. A Igreja Católica tem personalidade jurídica e pode organizar-se de harmonia com o direito canónico e constituir por essa forma associações ou organizações cuja personalidade jurídica é igualmente reconhecida. As relações entre o Estado e a Igreja Católica assentam no regime de independência de poderes nas respectivas esferas e mútua colaboração assegurada pelas relações diplomáticas entre a Santa Sé e Portugal, com recíproca representação pelas concordatas e acordos aplicáveis na esfera do Padroado e outros em que sejam ou venham a ser reguladas matérias de interesse comum.
§ único. Quanto às demais confissões religiosas existentes no território português, mantêm-se os princípios de liberdade de culto e de organização e reconhecimento da personalidade jurídica das associações religiosas, constituídas de harmonia com as normas da respectiva disciplina.
Exceptuam-se os actos de culto incompatíveis com a vida e integridade física da pessoa humana e com os bons costumes, assim como a difusão de doutrinas contrárias à ordem social estabelecida e à unidade moral da Nação.
Art. 48.º Nos cemitérios públicos podem os ministros de qualquer religião praticar livremente os respectivos ritos.

Eis, resumindo quanto possível, o parecer subsidiário que nos foi pedido. Fiel ao seu carácter e à sua responsabilidade, procurou esta secção interpretar fielmente o pensamento da Concordata de 1940 e o espírito das relações práticas actualmente existentes entre o Estado e a Igreja. Tendo em conta certas circunstâncias do meio português e porventura do momento internacional, consentiu em ficar aquém daquilo que a verdade, o direito, e o interesse da unidade moral da Nação poderiam exigir. Não sugeriu para a Igreja privilégios, antigos ou novos, nem interesses materiais, que, aliás, não deseja, embora em certo sentido justos.
Apenas lhe parece bem que não se falte ao dever para com Deus e que a política de liberdade, respeito e deferência adoptada pelo Estado Novo para com a Igreja seja consagrada na lei fundamental da Nação em termos honrosos e dignificantes para ambos os poderes.

Palácio de S. Bento, 19 de Fevereiro de 1951.

Afonso de Melo Pinto Veloso, assessor sem voto.
Amadeu Guerreiro Fortes Ruas.
Aurélio Augusto de Almeida.
Luís Figueira.
Maria Joana Mendes Leal.
António Avelino Gonçalves, relator.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA