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11 DE ABRIL DE 1951 799

se ordena à inteligência que deixe de olhar a verdade onde a vê.
Mas as ideias não tom sempre força realizadora nem utilidade prática; por vezes morrem para a acção, e importa não deixar os homens amarrados a cadáveres.
Salvo raras excepções, as monarquias na Europa com carácter de solidez e estabilidade acantonam-se ao norte, onde é geral e radicada a convicção de caber no seu seio todo o progresso e de que ao seu abrigo se podem realizar as mais profundas reformas económicas e sociais.
Estas monarquias mesmo são, mercê dos tempos que vivemos, quase só republicas hereditárias.

Com efeito a Câmara dos Comuns, por exemplo, sabem-no VV. Ex.ªs Srs. Deputados, é uma assembleia soberana e constituinte. Pode fazer ou revogar qualquer lei, mudar a forma de governo e a própria sucessão da coroa, extinguir os mais sagrados direitos. Não há distinção legal entre si e o povo porque a totalidade dos seus direitos e das suas faculdades civis residem em si mesma. É prática e legalmente a única depositária da autoridade da nação, irresponsável e omnipotente adentro da órbita da lei.
Prosseguindo na citação:

Para o sul e para leste, mesmo tendo em conta as pressões de ordem externa que explicam algumas transformações políticas, formou-se a convicção nas camadas mais extensas da sociedade de que certas reivindicações sociais eram mais facilmente realizáveis sob a república que sob a monarquia e aquelas são mais progressivas que estas.
A persistir nos espíritos a posição indicada, a ideia monárquica tem perdido, não se sabe por quanto tempo, a sua força actuante. Ponto é que, em frente das ondas revolucionárias, as repúblicas sejam ou queiram ser regimes de ordem e de autoridade e os povos tenham a certeza de que estão sob o seu domínio defendidos e seguros.

Estamos, contudo, na Assembleia Nacional e tem cada um de nós responsabilidades marcadas, imperativos de consciência e de formação mental e até de lealdade a um regime que, pela sua ética, pelos seus métodos, pela sua própria estrutura e pela probidade de quem o representa e simboliza, há mais de vinte anos tem contribuído iniludìvelmente para demonstrar que o regime republicano não é incompatível com a perenidade da Pátria Portuguesa e até porque reputo a lição do Sr. Presidente do Conselho como susceptível de «criar escola activa» e ter, portanto, continuadores.
E como não admiti-lo, se S. Ex.ª tem sido paradigma de clarividência, de argúcia, de habilidade e tacto para um mundo em constante sobressalto, em crise de conduta e principalmente «m crise de caracteres!?
Sinto neste aspecto que o seu exemplo pessoal, o seu estoicismo, o seu poder de inibição não têm sido quiçá adoptados como regra de vida por alguns que se inculcam como seus discípulos, mas aqui mesmo, nesta Assembleia, tenho ouvido proclamar com insistência e por certo com sinceridade o refrain que tenho repugnância em considerar apenas verbal para não o dever mencionar: temos uma doutrina.
Sr. Presidente: não tenho passado político público, mas tenho tido sempre convicções políticas e, mesmo quando execrava a poluição de certos corifeus e caudilhos da demagogia, sabia ressalvar os homens honrados que serviram a República e que se sacrificaram.
Ainda há pouco o Sr. Deputado Ricardo Durão evocou o nome de Manuel de Arriaga, e outros se poderiam relembrar, numa revisão crítica de valores, se nesta tribuna fosse oportuno fazer nesta conjuntura a apreciação moral e política de alguns dos seus homens, suas vítimas. Les Dieux ont soif ...
E quando no início desta legislatura ouvi um ilustre Deputado prestar homenagem fervorosa e eloquente a um dos últimos monarcas portugueses, ocorreu-me, por analogia, que também esse caluniado representante da realeza baqueou em holocausto a um regime envilecido pelos erros dos seus próprios sequazes e cortesãos. Les morts qui parlent ...
O Comércio do Porto, em «Notas políticas» logo após o regicídio, escrevia:

Sejam quais forem as origens do criminoso atentado, é incontestável que elo veio integrar-se num mal-estar que há muito se faz sentir na nossa existência política.

E a seguir:

... por qualquer forma que se encare o atentado de 1 de Fevereiro de 1908, foi, sem dúvida, um desvario; mas para aqueles que souberem ver o fundo dos acontecimentos as duas vítimas das armas homicidas não expiaram culpas próprias; foram imoladas a essa pecaminosa indiferença, a essa desordem moral que na sociedade portuguesa vem manifestando-se há muitos anos.

O Sr. Jacinto Ferreira: - V. Ex.ª dá-me, licença? V. Ex.ª com as suas palavras quer significar que foram os monárquicos que mataram o rei D. Carlos? Parece que está provado que foram os republicanos.

O Sr. Ricardo Durão: - Perdão, mas isso é que não está.

O Sr. Jacinto Ferreira: - Não foi a Maçonaria? E a Maçonaria não estava ligada aos republicanos?

O Sr. Ricardo Durão: - Na Maçonaria existiam tanto republicanos como monárquicos.

O Sr. Morais Alçada: - Não está provado que tivessem sido ou monárquicos ou republicanos, porque o regime que se sucedeu não consentiu nem quis que se provasse. E na minha terra costuma dizer-se que tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica ao portão ...

O Orador: - Já decorreram bastantes anos para que a história se possa fazer. De resto, VV. Ex.ªs lêem os caudilhos monárquicos da época e ai há muito que. observar e coligir para se chegar a uma conclusão. Verbero esse atentado e afirmo aqui a minha homenagem a D. Carlos, apesar do ser republicano.
Confrange-me, mas não me atormenta, porque confio na unidade nacional, que promana de uma coesão étnica e territorial indestrutível («com todos os harmónicos sentimentais que lhe acompanham a sonoridade fundamental e lhe dão timbre acentuadamente emotivo, a noção da pátria prende-se - escreve Leonel Franca - imediatamente a terra pátria e por ela aos ascendentes, a quem devemos a vida»), o panorama que se desfruta: em nome de uma coerência de ficção, puramente romântica, há ainda republicanos que consideram a colaboração com o regime um anátema irreparável (às vezes para não ser estimado não basta ser superior, basta ser diferente), embora vituperando retrospectivamente a indisciplina e delinquência, e monárquicos que, não se abstendo de servir, não acreditam ou acreditam provisòriamente.