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13 DE ABRIL DE 1951 839

Primeiro, mesmo que o sistema funcionasse normalmente e dentro da sua dialéctica, a condição necessária ao seu bom rendimento já o condenaria sem apelo. Um sistema político que para funcionar bem reclama individualidades superiores é um mau sistema de governo. A política sensata é a que prevê I para os homens médios. E a superioridade, essa virá por acréscimo. Para mais, não é a eleição o meio adequado para a escolha do merecimento. Os grandes homens que nos comandam não foram designados e investidos pelos meios próprios do mecanismo democrático.
Mas isto não é ainda tudo, nem é o principal. O principal é que a engrenagem só tem permitido governar porque está peada no seu funcionamento, contrariada na sua lógica, impedida de dar os seus frutos naturais. E como? Uma série de freios, de meios de contensão, foi aplicada nos pontos vitais do sistema. É a filtração do eleitorado, a limitação da liberdade de imprensa e dos outros meios de "perturbação e desnorteamento da opinião pública, os estorvos à actividade partidária, a redução dos períodos eleitorais e a repressão dos seus excessos e atropelos. Agora ainda se propõe outro freio: o da aprovação prévia das candidaturas presidenciais pelo Conselho de Estado.
Assim se tem governado, não com o sistema, mas governado apesar do sistema e porque este foi travado, detido, na sua dialéctica.
Um sistema político que só permite governar porque se conseguiu dominá-lo como um louco em camisa de forças é um mau sistema de governo.
Mas ainda não se julgue que esta contensão é normalmente possível. Aqui tem-no sido pelas circunstâncias excepcionais do momento: o estado de espírito do País e a qualidade dos homens que detêm as alavancas do Poder - a sua sagacidade, a sua subtileza e a sua grande autoridade. Quando estas condições desaparecerem, o sistema, agora reprimido, voltará, a galope, como dizem os franceses, ao seu natural, rebentando todos os freios que lhe constrangem os movimentos. E voltará porque os freios são contra a sua lógica, são contranatura.
E assim, desfeitas amanhã as razões transitórias que nos sustentam, se o País não resvalar, de pronto, para a desordem, empurrado pelo tumulto da rua, resvalará progressivamente, pelos malefícios do sistema electivo que tem na sua base. Seria o retorno da anarquia, do descalabro, do reinado das facções partidárias - a ignomínia que nos revoltou a todos, patriòticamente, no levante nacional do 28 de Maio.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Foi pela contensão da engrenagem democrática que a Situação pôde assegurar ao Poder as condições necessárias à sua eficiência: a unidade, a continuidade, a independência e, com isto, a sua força e o seu prestígio. Mas estas condições não as tinha o mecanismo electivo de seu natural. Muito ao contrário. E foram criadas, contra o espírito do sistema, pelo valor e a arte política de um homem superior.
O que é sensato, o que se impõe como necessidade insofismável é instituir outro mecanismo político - um que tenha em si mesmo, na sua essência, na sua lógica, aquelas condições indispensáveis para governar, no alto sentido da palavra.
Alguns viam a solução numa mudança da forma de sufrágio: a substituição do sufrágio individualista pelo sufrágio orgânico.
É mais uma ilusão política, ilusão perigosa, porque só pode retardar a verdadeira solução, a verdadeira e única solução.
Não há dúvida de que o sufrágio orgânico é o que verdadeiramente pode exprimir as realidades vivas da Nação. Não há dúvida de que é ele o que teremos de instituir e está na linha da nossa doutrina. Há entre as concepções sociológicas e as formas de sufrágio um nexo indissociável. Para o individualismo, que considera a sociedade como a soma aritmética de indivíduos autónomos, o sufrágio lógico é o sufrágio inorgânico. Para nós, que a concebemos como associação de grupos, um todo orgânico de sociedades menores, o sufrágio adequado é o sufrágio orgânico.
Mas a verdade também é que a Nação não está ainda estruturada na sua feição orgânica. O prolongado império do individualismo dissociou e atomizou a nossa constituição nacional. É preciso deixar recriar a verdadeira consciência dos grupos e esperar que ganhem consistência os órgãos que os enfeixam e os exprimem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em parte por nossa culpa, em parte pela natureza das coisas, a nossa organização corporativa vai ainda muito atrasada e não pode já partir do seu seio uma representação conveniente.
Por isso o sufrágio orgânico, se está na lógica dos nossos princípios, não está ainda indicado pelas realidades da vida nacional.

O Sr. Carlos Borges: - Então não há sufrágio?

O Orador: - Mas o principal não está aqui. Mesmo que uma verdadeira representação orgânica fosse possível, mesmo que os interesses vivos da Nação pudessem genuinamente exprimir-se, nunca por meio deles poderiam designar-se convenientemente os órgãos soberanos do Estado. O sufrágio orgânico é bom no seu lugar, para a escolha dos que hão-de reger legitimamente a actividade própria dos grupos e para os representar devidamente junto do Poder.
O Poder, esse tem de estar colocado acima dos grupos e dos interesses particulares. Tendo por função coordenar, harmonizar e superar todas as forças e antagonismos sociais, não pode ser uma emanação dessas forças e desses antagonismos.
Ontem foram as lutas das classes e dos partidos. Agora seriam as coalizões dos grupos e dos interesses. É verdade que os delegados dos partidos são apenas expressão de interesses parasitários, enquanto os delegados dos órgãos corporativos representam interesses legítimos. Mas, apesar de legítimos, são interesses particulares, e o Estado é o interesse comum. No seu papel de árbitro o Estado tem de considerar e coordenar os interesses legítimos, mas em posição soberana e independente de todos.

O Sr. Manuel Lourinho: - Mas a mecânica do sistema ainda não está explicada.

O Orador: - A organização corporativa não só não resolve de nenhum modo o problema da designação do Poder, mas antes torna mais necessária a organização do Poder em alicerceis sólidos, que garantam ao Estado força unificadora e coordenadora, estabilidade e independência.
Organizar corporativamente a Nação é organizar egoísmos, torná-los mais fortes. E, por isso, importa dar ao Estado, para bem exercer a sua função de árbitro soberano, garantias de estar acima das forças sociais.

Vozes: - Muito bem!