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13 DE ABRIL DE 1951 835

O Orador: - Para encerrar este desagradável capítulo das minhas considerações de hoje seja-me lícito, Sr. Presidente, fazer uma rápida e respeitosa referência a algumas afirmações anteriormente produzidas por alguns Srs. Deputados.
O Deputado ilustre Sr. Dr. Caetano Beirão, no seu desabafo de há dias, aliás impregnado daquela elegância aristocrática e cavalheirismo que são apanágio do seu brilhante espírito, manifestou a sua decepção, que é como quem diz desapontamento, por as alterações à Constituição propostas pelo Governo não terem aquele alcance em profundidade - eu direi de largueza - que S. Ex.ª natural e logicamente esperava - eu digo, com a devida vénia, ambicionava.
Ora, eu confesso que ouvi com surpresa tal afirmação, quando é certo que o Sr. Presidente do Conselho, perante os membros da Assembleia Nacional na sala da biblioteca, com a sua sempre irrepreensível lealdade de atitudes e clareza de dicção, não deixou a menor sombra de dúvida de que as alterações a propor não seriam de fundo quanto à Constituição actual, a não ser no caso, a estudar, da escolha do Chefe do Estado, designadamente do Presidente da República. Maiores alterações visariam, sim, o Acto Colonial.
Onde, pois, o motivo para decepção? A política do Governo tem procurado ser sempre objectiva, tal como nos é dado observar.
E o Governo, bem seguro ao leme desta nau que é a Nação, que, sob o ponto de vista metropolitano, parece pequena, mas de facto é grande e difícil de marear, como é da natureza das coisas humanas, segue logicamente a rota que as circunstâncias internas e externas prudentemente aconselham.
Dir-se-á, ou, antes, dirão os que têm os olhos postos num futuro diferente: e depois?
E depois... o futuro a Deus pertence, conforme os homens o merecerem pelos seus actos do presente.
Também o não menos ilustre Deputado Sr. Dr. João Aineal, pessoa da minha mais viva e sincera simpatia, falou de situação transitória do Estado Novo, como se de Governo provisório se tratasse.
Será provisório o que a Revolução Nacional de 28 de Maio trouxe, pela mão vigorosa e nobre do nosso exército, de renovação e alívio ipara a Nação, com o aplauso quase unânime da mesma Nação?
Será provisória toda esta obra de um quarto de século, grandiosa quer no campo material quer no campo espiritual?

O Sr. João Ameal: - Eu disse que podia tornar-se provisória se não fosse adoptada a solução que indiquei.

O Sr. Morais Alçada: - Mas a quem é que se deve essa obra: a dois homens e à doutrina inovadora ou à magia particularista da palavra "república" ?

O Orador: - Ao regime; depois é que surgiram os homens. Não há nada definitivo. Permanente só existe lano Alto. Nas linhas inferiores é tudo transitório.

O Sr. Morais Alçada: - Humanamente transitório.

O Orador: - Os homens são transitórios. As situações podem não ser transitórias...

O Sr. Jacinto Ferreira: - Nós desejamos que não sejam.

O Orador: - E porque seria que o Exército, que nessa cruciante altura concretizava a consciência da Nação, não depôs o regime da República? Evidentemente porque não era o regime que estava em causa, mas sim os métodos e os abusos do algumas das suas instituições.
E, assim, provisório porquG, embora sujeito às modificações que a experiência e as circunstâncias aconselham? O caleidoscópio a que alguém se referiu é realmente um facto, um maravilhoso facto, que nos pôs perante a vista extasiada a mudança da desordem paru a ordem, da quase falência para o crédito firme, interno e externo, da carência de tanto para a realidade de tanta coisa em tão variados campos.
Mas o caleidoscópio não se aplica apenas à República - que, felizmente, se mudou do avesso - mas a toda a vida, quer dos homens quer das nações.

O Sr. Carlos Moreira: - Todas as coisas viradas do avesso servem sempre mal.

O Orador: - Conforme, mas no caso político nosso ainda bem que nos virámos do avesso.
Que extraordinário caleidoscópio é todo o evolucionar da nossa vigorosa e brilhante história, desde o berço de Portugal! E o Sr. João Ameal sabe-o melhor do que eu, porque é, pelos livros que já publicou, um historiador esclarecido e probo, a quem presto neste momento, e com sincero prazer, as minhas homenagens.
Sr. Presidente: terminadas estas breves palavras de legítimo desabafo, volverei a minha atenção pana a proposta do Governo de alterações à Constituição.
De uma maneira geral, concordo -com a proposta em discussão, porque não altera na essência a Constituição em vigor.
Focando apenas os pontos principais, começo por me referir ao artigo 74.º da proposta, que acho bem, desde que fique esclarecida a forma de eleição, que não deve por nenhum princípio ficar relegada para a lei ordinária.
Assim, convém de facto a inclusão da expressão: "por sufrágio directo pelos cidadãos eleitores".
Quanto a mim, seria preferível a eleição indirecta pelas duas Câmaras em conjunto - Assembleia Nacional e Câmara Corporativa -, se essa forma de eleição não viesse, como viria fatalmente, atingir em cheio a independência dos órgãos da soberania: Assembleia Nacional e Governo, passando este à dependência indirecta desta Câmara.
No que respeita à selecção de candidatos à Presidência da República, alguma coisa realmente se deve fazer no sentido de se evitar o chamado "golpe de estado constitucional".
Se alguém, ou alguma facção, se resolver algum dia a modificar o statu quo, que o faça pela via do verdadeiro golpe de estado, que então se verá como a Nação reage, e estou certo que reagirá pelo bom senso, o que tanto monta a dizer: pela determinação das circunstâncias que imperarem.
Mas golpes de estado utilizando ou traindo a Constituição, à sombra da qual se faz uma eleição para a chefia da Nação, seria o cúmulo do absurdo.
Portanto, há que acautelar a manutenção da ordem e as instituições que a Constituição preconiza e defende.
Eu receio que o sistema de filtragem através do Conselho de Estado tenha também os seus perigos, por se arvorarem em vítimas os candidatos rejeitados, com todo o cortejo de nefasta propaganda à sua volta.
Como, porém, os inconvenientes surgem sempre de qualquer solução que se adopte, o sistema da intervenção do Conselho de Estado arrastará o menor.
A mutabilidade dos dez membros do Conselho nomeados pelo Chefe do Estado, preconizada no artigo 83.º, tem as suas vantagens com "a substituição possível de metade, porque quem tem a responsabilidade máxima