O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

830 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 97

O Sr. Sócrates da Costa: - Sr. Presidente: aprovei a proposta da Comissão de Legislação e Redacção sobre a antecipação da revisão constitucional, com o fundamento de que ela ora oportuna o necessária para a satisfação das aspirações do Estado da índia.
E agora vejo, com desvanecimento, que a proposta de lei respeitante à integração das disposições do Acto Colonial na Constituição amplifica a alma da Pátria, levando aos povos do ultramar os seus ideais, para ai consolidar o estado social que existe, fundado na ordem, nas liberdades possíveis e no trabalho dos homens, essencial á sua felicidade, tanto na esfera temporal como espiritual.

Vozes: - Muito bem!

O Orador : - Com efeito, essa integração melhor realça a unidade política da Nação Portuguesa e acaba, deste modo, com o malfadado equívoco de que o Império não é unitariamente português, mas de natureza colonial, ao serviço da metrópole, o que tanto feria a dignidade e o patriotismo de muitos cidadãos portugueses do ultramar.
Apoiados.
Depois, a supressão das expressões "domínios ultramarinos", "colónias" e "império colonial" e o emprego, em vez delas, das designações tradicionais de "províncias ultramarinas" e "ultramar" não é um mero jogo de palavras, mas antes a clara revelação, do verdadeiro sentido da política da Nação Portuguesa, que pelo processo de colonização - não receio empregar este termo visa a incorporar no seu seio as comunidades ultramarinas.
E, se bem interpreto a proposta do Governo, o alargamento das vias de descentralização, tanto nas atribuições de ordem legislativa como executiva, facilita a satisfação das dignas e legítimas aspirações do povo do Estado da Índia, com o ajustamento dessas atribuições, em diploma especial, aos negócios daquele Estado, sob as directrizes que, segundo as sábias palavras do Sr. Presidente do Conselho, e imprimiram os antepassados à sombra da bandeira portuguesa".

O Sr. Mário de Figueiredo: -V. Ex.ª dá-me licença?
Estou autorizado a dizer que V. Ex.ª interpreta bem o pensamento do Governo Português.

O Orador: - Fortalecido com a afirmação que acaba de fazer o meu antigo professor, pessoa por quem tenho a maior consideração, o que representa nesta Assembleia a opinião do Governo, ou continuo:
Que directrizes são essas?
São as que, a meu ver, emergem inconfundíveis da espantosa obra de Afonso Albuquerque e mostram que para o Estado Português é já muito velha essa "missão sagrada de civilização" a que se refere o artigo 22.º do Pacto da Sociedade das Nações, produto da primeira Grande Guerra, como inspiradora das chamadas novas concepções coloniais, nesse pacto proclamadas.
Daí o particular relevo das palavras do Sr. Presidente do Conselho proferidas na abertura do ano político, em que, reconhecendo, embora, deficiências e até erros na acção histórica, S. Ex.ª tem a orgulhosa sinceridade de se ufanar dela e de concluir que, mesmo quando Portugal precise de ajudas, pode dispensar tutelas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em boa verdade, os progressos da autonomia financeira e administrativa, que estão na base das ditas concepções do Pacto, tendem a estes dois fins últimos e distintos.:

1.º A independência completa da comunidade colonial, logo que ela se encontre preparada, tanto económica como politicamente;
2.º A incorporação total da comunidade colonial no Estado colonizador, com o gozo dos mesmos direitos que a comunidade metropolitana.

Isto quer dizer que o status inferior, que a palavra "colónia" exprime, acaba por dois modos diferentes:
ou pela independência ou pela associação total a que é uso chamar-se assimilação.
Esta segunda finalidade atinge-se, como toda a gente sabe, pela educação e preparação da comunidade colonial para ela tomar parte no Governo o no sistema social o económico da metrópole.
E estas soluções diferentes resultam de duas concepções diversas da actividade colonizadora.
A independência é fatal para os que nessa actividade colonizadora dão primazia aos interesses materiais.
Ao passo que o termo normal da mesma actividade é a associação ou integração quando a potência que a exerce coloca acima de tudo a pessoa humana. É o sistema português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Na época dos descobrimentos o povo lusitano tinha já gravada na alma essa simpatia universal que lhe permitia ter da fraternidade humana, não apenas uma vaga noção, mas uma espécie de experiência vivida.
Por isso, Afonso de Albuquerque chegou á Índia e entrou em contacto com os povos civilizados que aí encontrou, não como um vulgar conquistador, mas antes domo portador dessa experiência.
De modo que esse encontro do Ocidente com o Oriente, operado pelos portugueses em Goa, sob a forma de uma associação ou sociedade de facto, transformou-se quase subitamente em uma associação ou sociedade de direito. Afonso de Albuquerque instituiu em Goa primeiro passo para a assimilação um senado municipal, com a orgânica do de Lisboa; a justiça o as finanças, no respeitante aos interesses locais, foram confiadas aos naturais de Goa; foram respeitados os costumes orientais compatíveis com o direito das gentes; conservou-se a organização agrária dos multisseculares comunidades aldeanas como parte integrante da vida local, o hindus entraram a desempenhar funções públicas nu tesourarias o feitorias.
Foi assim que Portugal, no período da sua heróica expansão, se estabeleceu na Índia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quaisquer que tenham sido da injustiças cometidas no decurso da ocupação, o sempre difíceis de justificar na sua origem, o tempo, porém, que por si só nada faz, mas dentro do qual tudo ao faz, segundo a fórmula de Grotious, vem demonstrar ao mundo de hoje que o encontro do Ocidente e do Oriente, realizado pelos portugueses em Goa, aí criou um núcleo social de tendências nitidamente universalistas, que para o bem da própria Humanidade, só pode viver o progredir em cooperação cada vez maior e mais estreita com o Estado Português.
Citarei um facto apenas para justificar esta afirmação.
0 facto é este:
Quando Portugal, sob pressões do princípio da chamada ocupação efectiva, agitado, com duvidosas intenções, na Conferência de Berlim de 1885, ganhou pela segunda vez os seus territórios africanos, muitos médicos formados pela Escola Médica de Goa e não menos sacerdotes saldos do Seminário de Rachol, impelidos pela lusitanidade, cooperaram na arriscada e heróica missão civilizadora da Nação Portuguesa.