O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

27 DE ABRIL DE 1951 939

A sua posição na crise política do final do século esclarece-se ainda melhor pelas expressivas palavras dirigidas a Oliveira Martins quando, em pleno Verão de 1890, sob o choque traumático do ultimato, a agitação atingia acuidade alarmante.
Refugiado em Candemil - o seu Vale de Lobos - recebeu António Cândido do autor do Portugal Contemporâneo uma carta em que este o informava do protesto em marcha «contra a política dos partidos e a oligarquia da inépcia».
O ponto de apoio da reacção inadiável era a guarnição de Lisboa, que tomara por chefe o general João Crisóstomo de Abreu e Sousa, talvez ladeado, no futuro Ministério a formar, por Martens Ferirão e o conde de Casal Ribeiro. «Estes três nomes» - acentuava Oliveira Martins - «são o triângulo da nova situação, em que eu, a ser convidado, entrarei, apesar dos perigos... Considero isso um dever de honra e entendo que neste momento ninguém pode escusar-se».
Extraio da resposta admirável de António Cândido, quase desconhecida da maioria das pessoas, estes períodos lapidares:

Soou a tua hora, dificílima e, por isso mesmo, digna do teu coração e do teu espírito. Não hesites, não vaciles e põe toda a tua coragem no cumprimento do teu dever, por mais duro que ele se apresente.

Isto para encorajar e estimular o doutrinador da Vida Nova. Agora o juízo de conjunto acerca da situação política e dos remédios a aplicar-lhe:
Consola-me o que me dizes. Se o movimento é como tu o vês (e é decerto), esta hora poderá resgatar os erros, os crimes e as misérias da nossa desonrada e desgraçada política.
... ignorava que a acção militar se tivesse manifestado tão intensamente. Ainda bem. O Exército, protegendo com a sua força a aspiração nacional, honra-se mais do que com a mais assinalada vitória.
... em 1868 a ignorância dos Ministros e a má vontade do rei foram as causas do insucesso; temos agora um rei que quer e só falta um ministério que queira e saiba. Venha esse ministério; aplaudi-lo-ei com toda a minha alma, defendê-lo-ei através de todos os perigos. Podes ficar certo disso. Um ministério de conciliação seria um perfeito disparate; é preciso, é indispensável, é urgente, um ministério de reacção.

Estas linhas têm a data de 21 de Setembro de 1890. Três semanas volvidas, a 13 de Outubro, constituía-se o novo Governo, presidido, de facto, pelo general João Crisóstomo de Abreu e Sousa. Afinal ainda nele não entrava Oliveira Martins; em compensação, António Cândido, Ministro do Reino, era a segunda figura do elenco governamental.
E foi como Ministro do Reino que teve de defrontar e liquidar a revolta de 31 de Janeiro.
A 4 de Março seguinte, na abertura do Parlamento, Latino Coelho, escritor de mérito e leader da oposição republicana, por estar ausente Elias Garcia, levantou a voz contra a energia do Governo na repressão da tentativa revolucionária do Porto; e carpia, com trémulos na garganta, a as vítimas da liberdade».
Replicou-lhe António Cândido com vigorosa e esmagadora lógica, e na defesa da política seguida ao serviço da Pátria e da Ordem inseriu este luminoso resumo das suas aspirações:

Quero a Vida Nova em tudo, nos governos, nos partidos, nas classes, na política e na administração; para que esteja cada um no seu lugar; para que o princípio de autoridade seja mantido sempre; para que ninguém abuse das liberdades que as leis garantem; para que todos amem a Pátria mais do que os seus partidos, mais do que as veleidades pessoais; para que desta forma a sociedade portuguesa tenha quem a sirva e defenda contra os inimigos de dentro, que lhe minam a ordem pública, e contra os de fora que possam querer cerceá-la nos seus direitos e vencê-la na sua altiva dignidade...

Pergunto agora, para terminar, Sr. Presidente: isto que li é de 1891 ou de 1951?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não vemos aqui o orador erguido a profeta? Não surge, nestes lúcidos períodos, a flagrante, impressionante, antevisão do que havia de ser a Vida Nova que vivemos nos últimos vinte e cinco anos? E não aparece gravada a perfeita justificação do futuro 28 de Maio de 1926, mais de três décadas atrás, pelo homem que escrevia:

O Exército, protegendo com a sua força a aspiração nacional, honra-se mais do que com a mais assinalada vitória?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o busto hoje descerrado nesta Casa é, já o sabíamos, o de um grande mestre da palavra; é também, sabemo-lo agora, o de um precursor, daqueles raros portugueses que, a quase meio século de distância, sonharam e anunciaram Portugal ressurgido!
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Lopes de Almeida: - Sr. Presidente: o ilustre Deputado Sr. Paulo Cancela de Abreu sugeria em tempo que a Assembleia Nacional recordasse, por forma condigna, duas personalidades da vida política portuguesa de há cinquenta anos cuja actuação nesta Casa se recortou vivamente pela dignidade do exercício parlamentar e pelo fulgor da sua palavra. Com excessiva confiança, lembrou o meu nome para memorar uma delas, a do conselheiro Ernesto Rodolfo Hintze Ribeiro, e, já que esta homenagem é puramente evocativa, eu não poderei fazer mais do que dar uma nota impressiva sobre esse homem, que foi no seu tempo um dos mais inteligentes, dos mais dignos e dos mais leais servidores da monarquia constitucional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Por aquela razão, tomei a palavra, pela obrigação que me cumpre de dar satisfação ao desejo da Assembleia Nacional.
Sr. Presidente: porque se trata, sobretudo, de evocar a grande figura de parlamentar que foi Hintze Ribeiro, e por isso mesmo um momento particularmente intenso e até feliz da história da vida parlamentar por obra e intervenção de um homem integro e sincero em quem se reconheciam excepcionais dotes de orador, se o meu temperamento permitisse, tentaria falar com espontaneidade e ao sabor da inspiração. Se as minhas possibilidades de expressão verbal permitissem, desejaria encontrar o tom e os modos próprios que requerem a tribuna parlamentar. Mas, ai de mim! Já agora não poderei desprender-me destas pobres notas que estão na minha frente e tenho sincera pena.