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958 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 104

O Sr. Ribalro Cazaes: - Sr. Presidente: não me é possível falar agora, com a altura que merece, do assunto que o Sr. Deputado Silva Dias acaba de tratar tão brilhantemente.
Mal avisado andará quem sobre ele se debruçar sem a calma da reflexão, sem o estudo cuidadoso da experiência sofrida e o conhecimento, tanto quanto possível exacto, do progresso técnico, sem o sentido das realidades do mundo de hoje, em que não se encontra limitação alguma ao desenvolvimento dos ataques das forças do mal.
Na verdade, a organização da «frente do interior», até mesmo pela simples visão retrospectiva das notícias publicadas sobre desgraças que alguns países sofreram na última guerra, dá a toda a gente a certeza de que não é problema que se olhe ligeiramente, antes de transcendental importância, a que está inteiramente ligada a sobrevivência dos povos.
Apoiados.
Mas, ao ouvir falar em a f rente interna», não posso ficar silencioso e indiferente, pelo respeito e gratidão que devo a muitos milhares de homens que comigo serviram e a quem me honrou confiando-me a missão do comando da defesa civil do território, quando tal serviço foi criado.
Portugal pode reinvindicar a honra de ser o primeiro país que se apercebeu da imperiosa necessidade da organização da « frente do interior D como meio indispensável de resistir e vencer, numa visão clara das possibilidades da guerra total, isto é, da guerra sem limitados campos de batalha e sem limitados meios de destruição, que os povos haviam de suportar, face ao assombroso incremento da técnica e ... da maldade humana.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Hoje já os peritos militares dos vários países são de opinião dê que na terceira guerra mundial se deverá enfrentar um conceito de guerra inteiramente novo com o desenvolvimento do desgaste feito pelas 5.ª colunas e pelas armas nucleares, electrónicas e biológicas - as chamadas armas N.º E. B. - tudo levando a admitir que as primeiras quinhentas horas de luta poderão decidir da vida dum povo.
Isto, só por si, sem mais largas considerações, permite-nos compreender que a defesa nacional não pode prescindir da organização da «frente interna».
Na última guerra, a Inglaterra, com a sua Home Guard, foi o mais vivo exemplo da importância de tal organização e, eu afirmo, como então o fiz, que a nossa velha aliada pôde alicerçar ali, mais do que nos seus canhões e nas suas esquadras, a resistência e a vitória.
A França, por outro lado, olhando descuidadamente a organização da sua «frente interna», apesar de possuir um exército bem equipado e instruído, cedo sentiu que estava perdida.
E o interior? - bradava um chefe militar ao assumir o comando das suas tropas.
Os exércitos da França precisavam de movimentar-se e não tinham espaço para manobrar, queriam avançar e eram apunhalados pelas costas, resistir e verificavam a sabotagem por toda a parte, desde as munições às almas, enfim, a retaguarda não correspondia aos esforços hercúleos que necessitavam de desenvolver contra a apocalíptica avalanche das tropas germânicas.
Portugal, através da Legião Portuguesa, deu, em Maio de 1940, o seu primeiro passo, publicamente, para a organização da «frente interna», numa demonstração, próximo de Lisboa, em colaboração com o Exército, com a aeronáutica, com as autoridades civis e com a população da localidade.
Emprestou a esse acto especial importância a presença de dois ilustres homens públicos: os Srs. Dr. João Pinto da Costa Leite, então Ministro das Finanças e presidente da Junta Central da Legião Portuguesa, e tenente-coronel Fernando dos Santos Costa, então capitão e Subsecretário de Estado da Guerra.
A eles se deve, acima de tudo, o que daí em diante se fez.
Desejo aproveitar esta oportunidade para lhes render, por isso, as minhas homenagens de profunda gratidão como português e como soldado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não foi difícil assim ir mais adiante e devo confessar que o mais duro trabalho consistiu no afastamento dos que possuíam títulos e diplomas, mais para brilhar do que para produzir, no esmagamento dos comerciantes das máscaras e abrigos, na neutralização dos pregadores do «passivismo» e duma certa paz que todos conhecemos.
Terminei com duas simples palavras as ligeiras considerações que julguei conveniente fazer, depois do primeiro exercício de defesa civil: «Deixem-nos trabalhar».
E trabalhou-se muito - sem descanso e com fé inquebrantável.
Muitas medidas de carácter militar vertebralizaram os trabalhos em curso, e, embora nem todos se tenham logo apercebido dos largos passos dados, e que seria longo enumerar, a verdade é que o povo português sentiu o incessante labor e a f é que nos animava.
Em Setembro de 1941 apresentei perante a Junta Central da Legião Portuguesa as bases dum projecto de lei sobre a defesa civil do território, e em Abril de 1942 o Decreto-Lei n.º 31:956 regulava definitivamente o assunto.
De Agosto a Outubro montou-se mós Açores e Madeira a organização da «frente interna» e, ao apresentar à Junta Central da Legião Portuguesa o meu relatório sobre os trabalhos efectuados, declarei não poder continuar com o comando que me fora confiado por entender que o interesse nacional impunha que a defesa civil do território fosse o subtítulo da Legião Portuguesa.
Pensava eu que esse patriótico organismo poderia, assim, ser (nacionalizado, isto é, considerado como elemento indispensável da vida da Nação, pois ficara abundantemente demonstrado que, através da defesa civil do território, era possível conjugar os esforços de todos, independentemente do credo que possuíssem, fazendo, desta forma, de cada português um soldado.
Depois... Não é agora ocasião de falar mais no assunto, mas dada a (gravidade e importância do problema, tenho pena que a intervenção do Sr. Deputado Silva Dias não comporte um aviso prévio.
Antes de terminar, julgo do meu dever afirmar que vão por caminho errado os que só buscam em livros e diplomas, em experiências doutrem ou interesses que não tenham na base o bem comum, a solução dos múltiplos problemas, que urge resolver, de organização da «frente interna».
A defesa civil do território alicerça-se, sobretudo, como sempre afirmei, numa mobilização das almas e é com a alma que temos de servi-la.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A Legião Portuguesa tem um altíssimo dever a cumprir e só ela pode montar devidamente a D. C. T., porque legionário é antónimo de funcionário, porque ser legionário é dar-se todo pelos outros.