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28 DE ABRIL DE 1951 971

Dificilmente se encontrará departamento em que mais necessidade tenha o pretor de se ocupar de coisas mínimas!
As simples páginas de anúncios concorrem mais eficientemente para corromper a Língua do que as páginas literárias e os compêndios escolares para a purificar e manter. Todas as escolas juntas não suprem a má escola da vida. Por isso é necessária uma acção mais ampla, que não só proteja as actividades que a servem na escola e fora da escola, mas ainda que a defenda dos males que diariamente a viciam e lhe vão desnacionalizando e poluindo o carácter.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Porque em boa verdade a Língua precisa das duas coisas: de protecção e de defesa.
Depois da exposição que tive a honra de fazer a VV. Ex.ªs sobre alguns dos múltiplos aspectos de tão alto problema, VV. Ex.ªs compreenderão bem quão longe se encontra o parecer do espírito da nossa proposta.
O espírito que a determinou exprime justamente a necessidade de não limitar o largo, profundo e variado panorama dos problemas da Língua a este plano elementar, que apenas poderá satisfazer plenamente as pequenas nações que não têm possibilidades de projectar a sua alma em almas irmãs disseminadas por todo o Universo! Porém, nós temos posições a defender.
Temos de interpretar e medirar numa experiência da política da inteligência realizada há quase cinco séculos e que nos cabe a honra de termos iniciado pela primeira vez no Mundo e com tal perfeição que durante anos até as nações estrangeiras se viam obrigadas a escrever, imprimir e falar a nossa língua para poderem ter qualquer comércio espiritual ou económico com as nações de todo o Oriente.
Impõe-se-nos a necessidade de revigorar esta tradição política, de olhos postos no futuro, com o mesmo sentimento de perenidade com que os nossos antepassados espalharam a alma da Pátria pelo Universo inteiro.
Nós temos um país espalhado por todos os velhos continentes e por todos eles temos de defender um património que nos foi legado. Nós temos na quarta parte nova uma nação irmã que nos dá altíssimos exemplos de amor e de estudo pela língua comum. Quem tem uma língua que foi um dos maiores elementos de civilização da Renascença, e ainda hoje palpita em todos os cantos do Mundo, não pode limitar o conceito da sua defesa à vaga expressão do artigo 43.º, que nem em si, nem muito menos no seu parágrafo, contém o espírito do que se pretende abranger no artigo proposto.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Acrescenta o parecer que o que não se encontra na Constituição está expresso na Convenção de 1943. Que convenção é esta? A Convenção Ortográfica! Mas, salvo o devido respeito, o parecer continua inteiramente fora do espírito e da letra do artigo proposto.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Confunde-se um problema geral com um simples aspecto de pormenor. A Convenção Ortográfica não representa um princípio. Por muito importante que seja - e sem dúvida que o é -, não significa mais do que um caso de técnica aplicada a um dos muitos objectivos parcelares que no aditamento se contêm.
De resto, ainda que houvesse na verdade um corpo de diplomas legislativos completo, isso não explicaria que se considerasse desnecessário enunciar no texto da Constituição os princípios que os determinaram.
O fim da Constituição não é o de dispensar diplomas legislativos, mas o de professar os grandes princípios a que deve obedecer a vida espiritual e material da Nação.
O Sr. Bartolomeu Gromicho:-Afinal de contas isso era exactamente como se para se ser católico fosse necessária a Concordata; para falar português não é necessário existir a Convenção Luso-Brasileira.

O Orador: - Agradeço o aparte de V. Ex.ª, que corresponde a uma observação que apresentarei no decorrer das minhas considerações.
Analisemos agora a segunda objecção do parecer. Consiste em considerar o aditamento inoportuno, porque o Brasil pode não gostar! E pode não gostar porquê? Por causa do condomínio da Língua.
Voltemos a ler o artigo proposto:

O Estado tomará as providências necessárias tendentes à protecção e defesa da Língua, como instrumento basilar da cultura lusíada e da projecção do nome português no Mundo.

Mas então não será o Brasil a primeira nação a regozijar-se e a louvar-nos por este enriquecimento do espírito da nossa Constituição, que se destina a realizar um interesse comum ? Existirá na redacção do artigo alguma coisa que colida com os interesses da nação irmã e não seja, muito pelo contrário, da maior conveniência para a projecção do Brasil no Mundo?
Se a circunstância de o Brasil falar a mesma língua pudesse ser razão para se melindrar com o nosso propósito de defendermos e propagarmos a língua-mãe, haveria realmente motivos para que não consignássemos na Constituição qualquer reconhecimento de preferência pela Igreja Católica, por ter receio de melindrar o Estado do Vaticano! E o receio basear-se-ia na realidade de um senhorio mais alto do que o do simples condomínio.
Poderia a América do Norte achar que a Inglaterra a ofendia se consignasse na sua Constituição Política a protecção e propaganda da língua comum?
Pois o parecer é de opinião que o aditamento «pode ser interpretado como possível preparação do regresso de Portugal à política de isolamento que produziu o erro de 1911, quer dizer, como indício de que o nosso país, por qualquer razão, prefere administrar sozinho o morgadio da Língua».
Perante estas palavras textuais pergunto, de cada vez mais surpreendido: haverá no aditamento que se propõe alguma coisa susceptível de ser interpretada como um desejo de que o Brasil não nos exceda mesmo no valor dos seus trabalhos e iniciativas em prol da língua comum? Esta suave e poderosa língua de que falava Olavo Bilac! Leio e releio o texto, e não posso extrair-me à impressão de que a final o que o parecer condena, e muitíssimo bem, não é o artigo proposto, mas sim a letra de um artigo hipotético que ninguém propôs e contra o qual os signatários deste são os primeiros a protestar calorosamente.
A Convenção -diz noutro passo o cauteloso parecer- «entrega a defesa, expansão e prestígio da Língua Portuguesa não apenas à guarda de uma nação, mas ao zelo fraterno de ambas».
Pois se tão honrosa incumbência ficou entregue ao zelo de ambas, como se pode achar intempestivo o zelo de Portugal?

O Sr. Silva Dias: - Julgo mesmo que a preocupação da defesa da Língua transcende a Nação Portuguesa, porque ela é na actual conjuntura cultural uma forma de cidadania moderna no Mundo.

O Orador: - É a defesa das etnias e do sen valor moral e económico.