19 DE JANEIRO DE 1902 233
mercado interno, porque um acréscimo do volume de vendas determinaria, por certo, uma redução dos custos unitários de produção.
Assim se provocaria a elevação do nível de vida, tanto na metrópole como no ultramar, o duplo propósito de uma economia sã na sua função coordenadora e reguladora da vida económica e social das diversas unidades territoriais de Portugal de aquém e de além-mar. Como as coisas se têm passado viciando os terms of trade com as províncias ultramarinas, com graves reflexos sobre a produção algodoeira.
Vozes: - Muito bem, muito bom ! .
O Orador: - Há mais a propósito da economia dos algodões. Sabe a Câmara qual era o consumo médio de artefactos de algodão por habitante no (primeiro decénio do século, de 1901 a 1910? 2 kg, 540!
(Sabem qual foi o consumo do decénio de 1941 a 1950? 2 kg, 350 - uma redução de 8 por cento por habitante.
A Câmara tirará destes números as necessárias ilações.
O Sr. Botelho Moniz: - Isso não significa que o poder .de compra do habitante tenha diminuído; significa, sim, que o tecido de algodão foi substituído por outros tecidos. Veja V. Ex.ª a invasão feita no mercado pela seda artificial, que, de isso, se produz hoje também internamente.
O Orador: - Não creio que, o maior uso dos tecidos sintéticos possa, por si só, justificar esta redução no consumo dos produtos de algodão, quando seria antes de esperar um aumento de consumo de algodão num país em que o nível de vida tem ainda muito que crescer. De resto, a utilização de fibras sintéticas não se pode considerar generalizada a toda a população e deve ser tomada sobretudo como um sucedâneo da seda natural. Por outro lado, as quantidades totais de tecidos sintéticos consumidas hoje são menores do que a diferença verificada no consumo das manufacturas de algodão por habitante.
Mas voltemos u fisionomia do nosso comércio externo. Mais grave, "porém, do que o aspecto das importações é o tias exportações, pelo significado que elas têm como parcela mais apreciável do poder de compra internacional da Nação. Com efeito, é esta a função económica essencial .das exportações: prover os meios de pagamento às importações - cedermos aquilo de que não necessitamos para adquirirmos aquilo de que carecemos.
As exportações são o que nos sobra e as importações o que nos falta. Para a vida e bem-estar são estas que contam.
A redução quantitativa per capita do total das exportações foi de 4õ por cento entre o primeiro e último decénio do meio século decorrido.
Mas, tomando de novo como termos de comparação o decénio de 1921 a 1930 e o -decénio de 1941 a 1950, constatamos que a queda no volume relativo das exportações se concentrou nas matérias-primas e nas substâncias alimentícias - 38 a 40 por cento, respectivamente. Esta redução tem particular significado por se tratar dos dois principais grupos da nossa exportação, com 96 por cento das quantidades totais absolutas de 1921 a 1930, e ainda agora, nos últimos dez anos, com mais de 89 por cento.
No nosso decadente comércio externo nota-se, porém, um sintoma animador: o notável aumento de 82 por cento na exportação per capita de manufacturas diversas e de 163 por cento em aparelhos, máquinas e ferramentas, parecendo confirmar-o sentido natural da nossa industrialização para as indústrias de exportação, que são
aquelas que a extensão da área de consumo e as leis da especialização podem justificar. Com efeito, parece que serão aquelas indústrias capazes de concorrer no mercado internacional em qualidade e preço, as que, sobretudo, oferecem sadias condições de produção e, por isso, garantias de estabilidade, e não as que carecem da tripla protecção do condicionamento, licenciamento das importações e dos direitos proibitivos.
Apresenta-se assim o problema do planeamento industrial-definir o sentido em que, integrado no planejamento económico geral, deve desenvolver-se a indústria nacional.
A lei de condicionamento industrial quer ser o instrumento daquele planeamento. Mas de que plano? Parece que deveríamos começar por planear, sob pena de continuarmos a amontoar problemas insolúveis se o condicionamento não for integrado num vasto sistema.
A Lei de Reconstituição Económica foi uma tentativa de plano de conjunto, e, por isso, melhor se ajustou à função característica do Estado moderno o planeamento por oposição ao dirigismo, levado a extremos, em que o Mundo anda enredado, verdadeiro manto de retalhos cerzido em situações anormais e que quase sempre encobre a incapacidade de planear.
Estamos, contudo, ainda longe de termos realizado, ou, porventura, simplesmente concebido, o planeamento superior da economia nacional que considere a totalidade dos nossos vastos territórios como parte integrante de um todo político-económico, com as suas imensas possibilidades de matérias-primas, de mão-de-obra e, até, com certa potencialidade de consumo, que se irá efectivando à medida que se for elevando o nível de vida dos nossos dezoito a vinte milhões de habitantes, consumo variado pela diversidade dos climas e que, por isso mesmo, há-de imprimir carácter próprio à nossa economia industrial.
Vozes: - Muito bem, muito .bem!
O Orador:-Tudo isto se passa num momento em que o Mundo Ocidental anda empenhado na maior competição da história: a prova de resistência de dois sistemas económicos rivais. O que puder levar mais longe e por mais tempo o rearmamento preventivo sem interferir sensivelmente com o nível de vida das populações, aquele que puder realizar o rearmamento numa economia em expansão (expanding economy}, terá vencido o adversário.
Nesta emergência põe-se ,com especial agudeza o problema da produtividade. É nela que o nosso sistema económico da livre empresa terá de encontrar as reservas de potencial de produção que hão-de permitir realizar aquele grandioso objectivo.
Enfrenta, por isso, a indústria portuguesa este problema grave para ela. Chamada a cooperar no vasto movimento mundial para o aumento da produtividade, ou soçobra ante um Mundo que não recua perante os problemas da técnica aplicada que ela envolve, ou caminha a par do avanço geral.
Até que ponto e em que condições poderá a nossa indústria aumentar a produção por hora de trabalho humano?
São ponderosas questões que têm de ser encaradas desde já e resolvidas prontamente porque o tempo corre veloz e a oportunidade passa.
O ilustre Deputado Calheiros Lopes, referindo-se aqui à produtividade e ao pleno emprego, deu-nos a entender que existe uma relação directa entre ambos e que a produtividade crescente conduz ao pleno emprego. Não penso assim.
A experiência americana não indica que a produtividade crescente que se tem verificado por forma constante na indústria dos Estados Unidos tenha conduzido