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31 DE JANEIRO DE 1952 335

económicas, os bairros operários e as mil e uma outras medidas que neste e naquele sector se destinam ou se repercutem favoravelmente na defesa dos aspectos materiais da vida da família.

Vozes: - Muito bem!

A Oradora: - A verdade, porém, é que poucas têm sido as providências destinadas a defender a família dos elementos de desagregação e decomposição internas, a defendê-la contra os desvarios, as irregularidade» ou as baixezas daqueles que a compõem, e nomeadamente daqueles aquém Deus confiou a nobre missão de a guiarem e protegerem.
E não raro se verifica que o listado protege, com a falta de disposições, autênticos actos de espoliação ou de indignidade a que um membro da família sujeita os outros.
Ou então, a pretexto de salvaguardar a liberdade e os direitos do indivíduo, despreza ou contraria os direitos da família.
Muitas vezes a lei visa nitidamente defender à família na sua unidade e na sua essência, é certo, mas o exercício dos direitos que confere aparece de tal modo rodeado de formalidades e de obstáculos que as disposições legislativas resultam praticamente ineficazes.
Que objecções de toda a ordem para uma declaração judicial de indignidade .paterna, mesmo quando é notória uma vida de promiscuidade e desmoralização, que todas as leis humanas e divinas condenam!
Que dificuldades para obter a inibição do poder paternal, mesmo quando se sabe, até através de organismos oficiais e de assistência, que ele é exercido com desprezo dos direitos essenciais dos filhos ou com abuso manifesto de direitos que Deus conferiu e, que, por isso, deveriam ser exercidos quase religiosamente!
Que dificuldades para se obter a concessão de uma pensão alimentar!
E para que citar mais, se todos VV. Exas. melhor do que eu poderão recordar casos espantosos de desmoralização familiar que não podem remediar-se por carência de meios legais ou excesso de formalidades?
Sr. Presidente: nós que andamos mergulhadas nas realidades da vida, nós que por vocação vamos de encontro às misérias, nós que por missão as temos de ouvir e lhes temos de dar solução não podemos calar os clamores de tanta fome, de tanta necessidade, de tanta desordem que vai por essas famílias! Perdoe, Sr. Presidente, que eu venha sempre com a nota triste dos casos sociais, mas não sou capaz de alhear-me de mini própria. Aliás, todos nós queremos mais e melhor; todos aqui estamos para dizer ao Governo onde é necessário acudir, onde é urgente melhorar.
Apesar de não ser capaz de apontar com minúcia todos os males que afligem lá fora a família portuguesa, creio, Sr. Presidente, que, adentro desta Casa, serei dos que mais profundamente sentem as lacuna(r) que ainda existem na nossa vida social e que afectam a vida dessas mesmas famílias. Como posso esquecer as necessidades, os problemas que encerram os 24:500 processos que passaram de há quatro anos para cá no Instituto de Assistência à Família! Que me seja, pois, perdoada a impertinência, pelo bem que desejo fazer-lhes.
O projecto de lei em discussão vem, sem dúvida, ajudar a fortalecer os direitos da família. E é necessário que os coloquemos no seu lugar próprio, para que se não diga que perfilhamos encobertamente as doutrinas individualistas, que condenamos às claras.
A nota que pretendo ferir é esta: o Estado necessita, se quiser defender a família, de protegê-la também contra si própria, de protegê-la contra a inércia, a incúria, o relaxamento, o impudor, a devassidão e, em resumo, a indignidade moral dos seus membros responsáveis.
Pouco servirá dar garantias económicas: à família, pouco servirá rodeá-la, de cautelas, de comodidades ou de garantias de segurança, se ela não for defendida contra as suas próprias irregularidades e disfunções.
É necessário não esquecer que aquelas garantias existem para as famílias normais ou, melhor, que só as famílias normais podem aproveitá-las integralmente. Mas
não podem servir de remédio, de efeitos seguros, para a recuperação do unia família indigna ou em que um dos seus membros padeça dessa mesma indignidade.
Também a acção educativa a exercer pelo serviço social é tão limitada e tão incompreendida, neste país que não pode ter só por si efeitos decisivos na matéria.
Há tanto o tenho sentido - necessidade por vezes de recorrer ao respeito ou ao temor das sanções para conseguir aquilo que a brandura, a persuasão e o sentimento da dignidade própria não conseguem.
Aprovo por isso - «minora pareça estranho que eu, mulher e assistente social, o faça - o objectivo do projecto em quanto ele pretende estabelecer sanções para as irregularidades e desvios funcionais do, vida do lar.
Em várias passagens do parecer da Câmara Corporativa transparece, e afirma-se- até, haver receios da ineficácia do projecto, já pela intervenção do Estado Jia vida da família, que por ele torna possível, já pela dificuldade prática da aplicação idas sanções penais prescritas, porquanto o recurso a essas sanções «repugna - como lá se diz- aos nossos costumes». Mas pergunto: não repugnarão mais os factos que lá se condenam?
São realmente ide tomar em conta umas e outras reservas apresentadas pela Câmara Corporativa relativamente ao (projecto e à sua orientação. Aliás, esta prudência é condição indiscutível e fundamental de eficácia sempre que, como neste, caso, as leis dizem respeito, tão de perto, aos mais sagrados problemas humanos. Mas daí a acusar-se o Estado de, pelo facto de, através do tribunal, tomar uma atitude contra a corrente de desmoralização que penetra nas famílias, se imiscuir na intimidade familiar vai longa distância. Não me parece que seja argumento bastante para minimizar o valor e a oportunidade do projecto.
Na missão que compete ao Estado de assegurar à Nação as condições de prosperidade moral e material, missão preconizada nas Encíclicas e muito especialmente na de Leão XIII, parece-me que está incluída a tutela social da família. O inegável dever de a proteger e defender contra os seus inimigos externos e contra a sua decomposição interna implica necessariamente um certo poder, não só de controle, mas de remédio para os vícios que a família não possa suprir por seus próprios meios naturais. Portanto, deve o Estado vedar para que se cumpram os deveres de ordem familiar. Sempre se admitiu que, em casos extremos - como os focados no diploma em discussão -, o Estado declare os pais indignos ou inibidos dos seus direitos paternais, com suas consequências.
Existe um conjunto de direitos e deveres que dimanam, naturalmente, da vida comunitária e prevalecem sobre os direitos do indivíduo. O Estado, guardião da ordem, tem o dever de harmonizar todos estes direitos e de os subordinar a um fim mais alto. No que respeita à família, já o dissemos, o seu papel reveste unia delicadeza particular, mas nem por isso ele deve aqui renunciar à sua vocação de defesa do agregado social.
Assim, um dos deveres essenciais do Estado é o de proteger, ajudar e educar a família, nunca procurando imiscuir-se nela e muito menos substituí-la.
No parecer da Câmara Corporativa descrê-se ainda da influência do Estado no caso particular do projecto.