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12 DE MARÇO DE 1952 475

gressos, sobretudo médicos, no sentido do aumento de população, do outro lado, o reflexo que nas estatísticas populacionais possa vir a ter dentro de poucos decénios ou até de poucos anos o emprego dos meios de destruição maciça descobertos nos últimos tempos.
Creio que, como, numa colectânea recente de crítica a Maltus, afirma Létinier, a evolução demográfica depende de qualquer coisa que escapou a Maltus e que Létinier chama lei eterna da população: é que aquela evolução depende da vontade individual e colectiva de viver, a qual não é apenas regulada por instintos naturais, mas por condições morais e económicas. Para muitos autores a questão do aumento da população e da sobrepopulação é frequentemente encarada sob o impulso de factores sentimentais, não faltando mesmo quem entre em conta com descobertas ainda não realizadas das quais venha a resultar o aumento concomitante de recursos para a sustentação dos quantitativos atingidos.
O assunto é tão complexo e implica uma tal multiplicidade de elementos que não pode ser orientado apenas por cálculos simplistas, como os daqueles que, pegando num papel e num lápis, multiplicavam o número de quilómetros quadrados de área de um continente por uma densidade hipotética e certamente demasiado optimista de população, chegando, por exemplo, para a África a mais de 2 biliões de habitantes, ou seja quase toda a população actual do Globo. Mas também não pode basear-se num simples impulso de esperança ou de fé, embora a meu ver esta seja necessária nesta matéria, como em tudo. Sem fé nenhuma grande realização é possível. E devemos ter fé em que se consigam os recursos e o clima necessários para que muitos seres humanos, encontrem ainda na face ida Terra condições de vida e de felicidade.
Aliás eu pergunto se alguém ousa, pelo simples exame dos factos objectivos e excluindo qualquer parcela subjectiva de desejo, de esperança ou de fé, prever a marcha da economia mundial, das relações internacionais, da humanidade de hoje para a felicidade ou para o abismo.
Alguém está, por exemplo, seguro de fenómenos mais simples, como a evolução do comércio mundial, a liquidação dos encargos e compromissos assumidos pelas nações, etc. Meus senhores: tem de haver um sopro de fé, um lampejo de confiança no traçado das perspectivas de futuro para o homem. Ai de nós todos se por frias e implacáveis especulaçõe, se por desanimadora verificação de muitos males, a fé, a confiança nos destinos humanos se varresse de nossas almas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas esta atitude não implica o menosprezo das aquisições científicas dos elementos úteis de apreciação destes assuntos. Pelo contrário, seria indigno entregar à sua sorte, sem qualquer esforço de aperfeiçoamento, de estudo, de salvação, tantos seres humanos, tantos irmãos nossos.
Eis por que as dificuldades destes problemas, a insuficiência dos meios de estudo e de acção, a permanência de muitos males contra os melhores, mais dedicados e mais lúcidos esforços não devem ser motivo de renúncia. Aliás, devemos nós, Portugueses, agradecer à Providência não termos sido, até agora, dos povos mais cruel e duramente atingidos pelos sofrimentos que afligem a humanidade de hoje.
Os acontecimentos trágicos que o mundo contemporâneo nos proporciona têm, mercê de Deus e das circunstâncias providenciais, que não é preciso rememorar, em grande parcela, encontrado Portugal imunizado contra eles de modo feliz.
Falando de emigração e de colonização, pensemos, por exemplo, como somos ditosos em confronto com outros países da Europa, aos quais não bastou terem sido talados por uma guerra impiedosa e destruidora, mas se encontram agora a braços, numa situação deplorável, com a exacerbação dos seus problemas de sobrepopulação, sem possibilidades migratórias como, apesar de já escassas para o estrangeiro, as que temos) e sem vastas, pacíficas e prósperas províncias ultramarinas em que possam (depositar as belas esperanças que nos faculta o nosso ultramar. Eu leio as revistas italianas, por exemplo. Posso ajuizar do carácter de ansiedade, de angústia, de tragédia que revestem os problemas actuais da população em Itália.
O ilustre autor do aviso prévio descreveu as dificílimas circunstâncias em que vive grande parte da nossa população, sobretudo nas ilhas adjacentes. O quadro é profundamente triste e (requer remédio, o mais eficaz e pronto possível. Mas não é muito diferente a situação outros pontos do País e do ultramar. Cá no continente conhecemos factos análogos. Verifiquei, eu próprio, no Porto que muitas crianças iam para a escola sem refeição alguma e que não eram raras as que não tinham no dia inteiro outra refeição além da que lhes era fornecida pelas cantinas escolares. Em Cabo Verde são tràgicamente notórias as consequências para a população das longas estiagens, da falta de trabalho, da insignificância de muitos salários.
Apesar das providências tomadas pelo Governo, a natureza inclemente, o adensamento populacional, as limitações forçadas do habitat insular, as restrições postas no estrangeiro à emigração, tudo concorre para um estado de coisas que quase levaria o homem a fazer como as cabras, cuja fome compensa a míngua dos pastos, devorando caixas de fósforos vazias, papéis rasgados lançados no solo, ou panos e peças de roupa imprudentemente postas ao alcance dos seus dentes ...
Mas espectáculos tão deploráveis nem são exclusivos de alguns infelizes sectores da gente portuguesa, nem são exclusivamente de hoje, nem tem encontrado a inerte indiferença - que seria criminosa - das entidades responsáveis. Há infelizmente por esse Mundo muitas coisas análogas ou até piores. Desafio quem quer que seja a negar que tais males existiram outrora, mesmo, porventura, em certos casos e nalgumas ocasiões ainda com maior gravidade. E, se a despeito das providências governativas tomadas subsistem ainda quadros lancinantes de miséria, temos o direito de perguntar às gerações que nos antecederam se foram tantos e mais eficazes os esforços que desenvolveram para remediar tais males e para obstar à sua repetição ou ao seu prosseguimento no futuro.

ozes: - Muito bem!

O Orador:.- Não percamos tempo em recriminações, por mais que o apuramento de responsabilidades tenha interesse histórico e moral e possa fornecer lições preciosas de conduta política, uma serena, sã e firme filosofia, ideias e directrizes justas. O que não queremos e apenas que se especule tendenciosa e malevolamente com a miséria. Esta, a fome, a desventura merecem muito respeito para que seja legítimo, àqueles que não tentaram seriamente dar-lhes remédio ou evitá-las, àqueles que não trazem na sua bagagem nenhum elemento positivo para o seu combate, fazerem delas estandarte de protesto, no serviço das suas ambições pessoais ou das suas doentias e perigosas paixões sectárias.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não percamos tempo em recriminações. Não hesitemos em continuar apontando os males, mesmo