476 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 134
sob o risco de se MOS assacarem culpas que não temos, que são de todos ou que cabem u nossa geração em grau muito menor do que às anteriores. Sobretudo, não nos detenhamos em devaneios de imaginação ou de retórica ou em pormenorizações desconexas, numa visão insuficiente e fragmentária dum problema tão complexo e transcendente que exige coordenação eficaz de múltiplas soluções adequadas.
Estou recordando os últimos períodos do livro de Ezequiel de Campos Problemas Fundamentais Portugueses, em que, depois de expor os tópicos do enorme e variado programa de realizações que são necessárias na metrópole e no ultramar para bem da gente portuguesa, das gerações actual e futuras, programa que ele com inteligente e nobre tenacidade aponta, sempre nas suas declarações de voto em pareceres da Câmara Corporativa, conclui afirmando que, depois da conquista de Portugal aos Mouros e ida conquista da independência nacional, ainda não conquistámos o nosso território de aquém e de além-mar à natureza, o que é o mesmo que dizer a esterilidade, ao deserto, à erosão, aos factores destrutivos, a tudo o que é desvalorização, infecundidade, prejuízo, desperdício de fontes de riqueza, de recursos úteis, de factores de progresso e felicidade humana.
Creio, como pensam aliás ilustres economistas, que, bem aproveitado, o território continental ainda pode garantir a existência a uma população maior do que a actual, mesmo do que os 10 milhões que se prevêem para 1960.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Mas é indispensável prosseguir activamente na tarefa de aproveitamento indicada. Mas isto não significa que devamos desinteressar-nos do problema do escoamento dos excedentes demográficos, quer pela emigração, quer pela colonização, dado que a valorização dos recursos nacionais no sentido de prover às necessidades actuais da população não se pode efectuar de repente, como sob a acção de uma varinha mágica, nem deixa de ser uma das bases do progresso e do enriquecimento do País a plena laboriosidade dos núcleos migratórios ou colonizadores constituídos ou a constituir.
E de justiça, quanto à emigração portuguesa, pôr em relevo, com elogio, as providências tomadas nos últimos anos no sentido de proteger e valorizar o emigrante e de evitar uma série de desastres, de que, infelizmente, não faltam exemplos. Entretanto, basta atentar nas estatísticas de emigração para se verificar quanto estamos, nos quantitativos correspondentes, aquém dos números elevados que a nossa emigração atingiu, em várias fases, antes da última grande guerra. As restrições opostas nos países de destino ao afluxo imigratório tem sido, sem dúvida, ,uma das causas mais importantes da redução observada. Mas é inegável que, com são critério, humanitarismo e patriotismo, também do nosso lado tem havido uma regulamentação do êxodo populacional, de modo a evitarem-se os desastres a que aludi.
A salvaguarda da nossa mão-de-obra, a valorização da fonte de riqueza que é o homem, o próprio prestígio do nome português não dispensam, porém, o prosseguimento e o aperfeiçoamento de uma política que louvavelmente se iniciou. É certo que os emigrantes portugueses, segundo inquéritos vários levados a efeito pelo Governo e pela Sociedade de Geografia, dão, em geral, nos países estrangeiros as melhores provas da sua laboriosidade, da sua honradez e ,da sua boa índole. Estou pensando na admirável colónia portuguesa no Brasil, que tive a alegria de visitar em 1934 e em 1937. Essa gente magnífica, ao mesmo tempo que honra a sua pátria, colabora valiosamente no engrandecimento do nobre e querido Brasil.
Recordo a minha visita recente a alguns importantes núcleos luso-americanos na parte oriental dos Estados Unidos. Que impressão forte e grata eu trouxe desses excelentes portugueses da América do Norte, das. suas qualidades de trabalho, das suas qualidades morais e afectivas, do seu sentimento de patriotismo, apesar da poderosa força assaniladora e plástica do meio novo, rico e tão diverso do nosso, mo qual se instalaram e ganham o seu pão!
Meus senhores: até em descendentes de portugueses que só falavam o inglês e ocupavam funções oficiais importantes no grande país do Novo Mundo eu verifiquei a existência de uma enternecida simpatia pela pátria antiga dos seus antepassados, uma simpatia que se manifestava nas suas atitudes connosco, no apoio dado a iniciativas luso-americanas, na afectuosa curiosidade que manifestavam pelos assuntos portugueses. Mas descortinei em muitos dos nossos patrícios um complexo, muitos complexos de inferioridade, claros ou latentes, perante o meio envolvente, perante a grandeza e o poderio da nação que os abriga e lhes dá trabalho e pão.
Sem hesitação, sem ambages, direi o que penso desse ou desses complexos, que, se não alcançam diminuir nos seus portadores o amor pela pátria distante, enfraquecem as possibilidades de resistência às múltiplas acções assimiladoras provenientes do meio movo, da sua língua, dos seus costumes, das suas instituições sociais, económicas e políticas. Há, em primeiro lugar, a humildade nata da boa gente portuguesa, uma sua xenofilia deferente, que traduz bondade fraterna, e não submissão antipatriótica. Se o ferem nos seus sentimentos de amor pátrio, o Português reage energicamente, mas, se assim não sucede, ele é hospitaleiro, amável, benévolo, para toda a gente. Por outro lado, a massa migratória, em grande parte, não possui o conhecimento satisfatório os motivos de orgulho nacional que se encontram na nossa história, como em tantas realizações do presente. No fundo das aldeias ou na lonjura das ilhas, de que nunca saíra antes de emigrar, não vira nada de comparável aos arranha-céus de Nova Iorque ou aos grandes equipamentos ferroviários ou portuários americanos ... Com patriótica mágoa e insuficiente cultura de certos valores compara os enormes buildings americanos com as choupanas da sua aldeia natal. E não são demasiadas todas as [propagandas que façamos para os pormos ao facto das melhores realidades nacionais. Mas o. factor principal da situação moral e económica dos nossos emigrantes em países estranhos consiste na deficiência da preparação que deveriam ter levado da Pátria.
Por mais confortantes que sejam os resultados dos inquéritos a que fiz referência sobre as qualidades manifestadas pelos nossos emigrantes, não podemos dar-nos por satisfeitos quanto ao êxito por eles obtido noa meios novos para onde foram ganhar a vida. Direi apenas que o seu êxito teria sido incomensuràvelmente maior, com vantagem para cies e para os países de origem e de destino, se as suas excelentes qualidades inatas tivessem tido a reforçá-las na preparação, o adestramento, os conhecimentos gerais e técnicos que dão categoria à simples mão-de-obra. Milagres, verdadeiros milagres, fazem eles por intuição, pelos seus méritos próprios. O que não poderiam fazer com outro apetrechamento?!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não discuto agora os fundamentos da legislação dos vários países no que respeita à admissão de emigrantes. Pode ser que nalguns tivesse havido a interferência de discutíveis critérios raciais: está neste caso o Norte-americano Johnson Act, anterior à segunda