480 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 134
ilustre do engenheiro Trigo de Morais, e que permitirá a fixação ali de algumas dezenas de milhares de colonos metropolitanos. Mas é necessário mais nessas ordens de aproveitamentos, e isso só é viável com capitais e com estudos preliminares dos cursos fluviais nas relações com a hidrologia, com os solos, com os climas, com a economia, etc. Tais estudos estuo num lamentável atraso.
Mas as necessidades preliminares da colonização não ficam por aqui. Quer em relação as qualidades e possibilidades dos colonos, quer em relação às populações indígenas, suas colaboradoras ou até competidoras eventuais, requer-se uma infinidade de estudos e tarefas preliminares em matérias que podemos abranger na designação genérica de ciências antropológicas ou ciências humanas, domínio em que se compreendem investigações sobre vitalidade, aclimação, alimentação, higiene, psicologia, organização social, direito, costumes, religião, linguística, história, etc.
Tarefa imensa, à qual já nalguns sectores e regiões meteram ombros investigadores da metrópole e do ultramar, principalmente nas Universidades, na Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar, nalguns serviços e organizações locais ultramarinos, etc. Mas ninguém hesitará em dizer que se está ainda muito longe do que é necessário fazer. E uma tarefa colossal, para a qual todos somos ainda poucos.
Não podemos nem devemos considerar o problema da colonização ultramarina sem entrarmos em conta, no maior espírito de justiça e de fraternidade humana, como já disse, com os interesses e os direitos dos indígenas. Os bons colonos, toda a gente na qual o sentimento cristão de bondade e amor fraternal para com os homens de todas as cores e de todas as raças não foi obliterado pelo egoísmo, pela cupidez ou pela perversidade, todos os que amam e seguem as melhores tradições lusitanas de afectuosa e compreensiva simpatia pelas populações do nosso ultramar pensam assim, sentem assim, agem assim.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Há, porém? quem lamentavelmente preconize a supremacia dos interesses do branco. São aqueles que não compreendem o valor real do negro, são aqueles de quem se pode dizer o que dizia André Gide: a Quanto menos inteligente é o branco, tanto mais o preto lhe parece estúpido». Julien diz encontrar-se talvez nesse ponto o que ele chama o «drama fundamental da colonização.
Não, meus senhores, por mim entendo que o grande Lyautey tinha razão quando afirmava que sem uma parcela de amor nenhuma obra é fecunda. Devemos amor fraterno aos colonos activos e bem sucedidos, gente prestante e laboriosa do nosso sangue, excelentes obreiros de um Portugal imenso e belo, devemo-lo aos náufragos da colonização, que sofrem mais as culpas da adversidade ou dos outros do que as próprias, devemo-lo aos elementos nativos, simpáticos e excelentes colaboradores da grandeza e da glória de Portugal.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Finalizo exprimindo os votos de que o problema demográfico português seja encarado pelo Centro dos Estudos Demográficos do Instituto Nacional de Estatística não só quantitativamente, mas qualitativamente, sendo-lhe fornecidos amplos recursos para um satisfatório desenvolvimento desses estudos; de que os organismos e a regulamentação sobre a emigração para países estrangeiros se inspirem cada vez mais nos ensinamentos sobre as qualidades desejáveis nos emigrantes
e sobre as realidades nacionais e mundiais relativas a deslocamentos de massas populacionais e seu condicionalismo e indicações; enfim, de que as colonizações do ultramar com os excedentes .metropolitanos sejam baseadas nos estudos preliminares que indiquei e consideradas na complexidade e variedade dos seus aspectos essenciais, não só pelas entidades adequadas para as ditas tarefas preliminares mas também por todos os serviços encarregados da efectivação dos planos adoptados de colonização.
Para o estabelecimento das bases científicas indispensáveis para a tarefa colonizadora sugiro a constituição de uma comissão coordenadora e orientadora dos estudos e planos necessários, na qual teriam representação ou com a qual colaborariam a Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar, a Escola Superior Colonial, o Instituto de Medicina Tropical, a Academia das Ciências de Lisboa, a Sociedade de Geografia de Lisboa, o novo Instituto Valflor, os sectores universitários especializados nas matérias respeitantes u colonização do ultramar, os serviços oficiais metropolitanos e ultramarinos e outras entidades que têm conhecimento especial da matéria.
A ideia de uma comissão desse género que foi aqui sugerida pelo ilustre Deputado e colonialista Sr. Tenente-Coronel Vaz Monteiro, acrescentarei a de uma divisão da mesma comissão nas subcomissões que forem julgadas convenientes para estudos e planos parcelares impostos pela complexidade de aspectos do assunto e ainda que não só se intensifiquem as iniciativas de fomento e educação que, visando a generalidade do território e da população, constituirão directa ou indirectamente a melhor base e estímulo para uma intensa fixação humana de origem metropolitana nos territórios ultramarinos, mas ainda se desenvolvam os meios e as tarefas de uma informação e propaganda adequadas, na metrópole e .no ultramar sobre o condicionalismo racional e concreto em que pode e deve operar-se aquela fixação.
Convém que todos, colonos e aspirantes a colonos, serviços que tratam da colonização sob qualquer aspecto, saibam o que estão a fazer, o que devem fazer, tenham a noção justa da finalidade nacional da sua função, dos deveres técnicos e morais que lhes cabem, de maneira que nos empreendimentos na matéria,, em todas as suas fases e modalidades, não faltem as condições mínimas que são garantia indispensável de êxito.
De acordo com o que afirmei mo decurso da minha exposição, não se esqueça que, pelo menos na situação actual do Mundo, a emigração e a colonização ultramarinas não constituem as soluções completas do problema dos excedentes demográficos metropolitanos. Há a contar também com a industrialização do País, de um modo geral com valorização e o aproveitamento devidos evidentemente em bases científicas dos recursos naturais e humanos de Portugal.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Melo Machado: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: suponho que desta vez tenho de justificar a minha presença nesta tribuna. Desde que o nosso ilustre colega Sr. Armando Cândido nos anunciou o seu aviso prévio, eu sempre o incitei a fazê-lo, afirmando todo o grande interesse que este problema tem para o País. Por essa razão, e porque lhe prometi o meu fraco concurso, não quis faltar, apesar de que me sinto neste momento grandemente diminuído por uma preocupação moral que me aflige.