12 DE MARÇO DE 1952 481
Por consequência, VV. Ex.ªs terão de me desculpar se a minha intervenção neste debate é, porventura, mais insignificante do que aquelas do que costumo fazer, mas espero que vejam nela uma expressão de boa vontade.
De resto, Sr. Presidente, o que me interessa sobretudo é a colonização; e eu descendo de uma família que exerceu durante toda a sua vida acção em todas as nossas províncias ultramarinas, em Macau, Índia, Angola e Moçambique. Por consequência, na minha vida quase não ouvi falar noutra coisa que não fosse de assuntos coloniais.
Assisti mesmo à fundação da cidade da Beira e sei a pobreza de recursos com que se trabalhava nesse tempo, como era preciso ter a fibra rija e a inteligência viva, a energia dinâmica para poder realizar essa obra admirável em que hoje nos podemos rever.
Vi a pobreza de meios com que se trabalhava e vejo hoje como tudo mudou, graças à acção do homem providencial que dirige neste momento os destinos do Pais, até chegarmos ao ponto de podermos realizar nessa mesma cidade da Beira a rescisão do contrato com uma companhia estrangeira e tomar inteiramente para nós e para a nossa Administração o porto e o caminho de ferro com resultados que nos honram inteiramente.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Mas, além destas razões, ninguém dirá que a emigração não é um problema de natureza económica, e entre nós, se a emigração há-de necessariamente tomar a feição de colonização, não há dúvida nenhuma de que é sobretudo dum problema de natureza económica que se trata.
Por um lado, temos o continente, cuja população aumenta 1 milhão em cada dez anos e que já com dificuldade encontra colocação, precisamente porque há muita gente para tão pouca terra.
Por outro lado, vastíssimas províncias ultramarinas, onde o problema se apresenta ao contrário. Quer dizer, grandes superfícies e densidade de população fraquíssima. Esta simples observação faz-nos ver que a colonização precisa de ser uma das nossas preocupações dominantes se queremos melhorar o nível económico da nossa população. Outro motivo há porém para que a colonização passe a ser uma das nossas mais instantes preocupações.
No estado actual da nossa civilização quem dispõe de grandes superfícies territoriais precisa de realizar todo o esforço para as fazer produzir, para, numa palavra, serem úteis à comunidade depois de terem sido úteis a quem as possui.
Isto é um ponto que é já de capital interesse e que nos leva, quer queiramos quer não, a encarar com todo o cuidado este problema da colonização
Mas podemos realizar esta missão tão necessária e tão útil? Eis outra pergunta, Sr. Presidente, que a nós, Portugueses, se não pode fazer.
Quantos éramos e o que podíamos económicamente quando iniciámos as nossas viagens pelo mar tenebroso? Pois, se pudemos então realizar o esforço imenso que realizámos, em que mais do que forças materiais empenhámos forças morais, coragem indómita, resistência física, além de tudo o que possa imaginar-se, construindo tudo o que ainda hoje é objecto da maior admiração, porque é que havemos agora de hesitar em enfrentar um problema grande, sem dúvida, mas insignificante em relação ao esforço desse punhado de portugueses que levaram a nossa bandeira e a nossa fé, a nossa soberania e a nossa acção a todas as partes do Mundo, desse Mundo que só pela nossa mão se conheceu, engrandecendo-se.
O Sr. Carlos Moreira: - Isso levou-me realmente a concluir com V. Ex.ª ou além dos argumentos de V. Ex.ª
É que não se trata apenas de uma necessidade demográfica, porque nesse tempo a que V. Ex.ª se refere não tínhamos essa necessidade demográfica, mas sim a vocação dum povo colonizador e missionário, e V. Ex.ª vê, quando do Brasil, que não foi uma necessidade de excesso de população mas sim essa vocação a que me referi.
O Orador: - Tem V. Ex.ª inteiramente razão.
Não, meus senhores, nós não podemos hesitar em abordar a colonização tão decidida e inteligentemente como temos abordado, para as resolver, outras questões que durante muitos anos pareceram insolúveis e são hoje prometedoras realidades.
Para que havemos de dar os nossos braços e o nosso sangue para ajudar a construir ou engrandecer outras nações, quando imensas regiões esperam improdutivas ou fracamente utilizadas o nosso esforço e a nossa inteligência?
Quem realizou essa imensa nação, promessa maravilhosa, além de realidade fecunda, que é o Brasil não pode ter desculpa para se não debruçar sobre as suas próprias províncias ultramarinas, cumulando nelas todo o esforço que vem desbaratando pelo Mundo.
A verdade, porém, é que apesar da nossa tradição, apesar do muito que temos feito, há ainda muito que, com proveito nosso, podemos e devemos realizar.
Nos últimos tempos não são muito numerosas as tentativas de colonização ordenada, dirigida, que temos realizado, mas manda a verdade que se diga que cada uma se conta por um insucesso.
Não há melhor nem mais fácil colonização que a que se realiza voluntariamente. Ai temos o exemplo da nossa emigração para o Brasil. O homem do Norte vende as suas leiras, junta todas as suas possibilidades para partir para o Brasil, país irmão certamente, mas nem sempre acolhedor para quem o procura com o ardor da fé que vence montanhas e inteiramente compreensivo para o nosso emigrante, o único que lhe pode ser inteiramente útil sem nunca ser perigoso ou ingrato.
Se através da actual prosperidade de Angola pudéssemos despertar uma colonização voluntária, não só a colonização dos débeis económicos, mas também a colonização dos que dispõem de alguns bens, que nas nossas províncias ultramarinas poderiam com eles criar uma situação muito mais desafogada do que a que podem ter no continente, teríamos facilitado enormemente a realização de uma obra que, por ser imperiosa e enorme, precisa de ser realizada com inteligência, com preparação, com método, com persistência, com todos os cuidados que garantam a vitória, pois não podemos arriscar-nos a novos insucessos.
A colonização voluntária tal como a que acabamos de visionar é neste momento talvez muito mais viável do que porventura se imagina: requer, apesar de tudo, uma larga e proficiente preparação.
Haveria que escolher os terrenos mais adequados, facilitar a sua aquisição, ter em cada região quem, conhecendo-a profundamente, pudesse orientar com segurança os colonos nas culturas a realizar, nos processos técnicos a adoptar, por forma a garantir tanto quanto possível o sucesso dos colonos voluntários, pois desse sucesso inicial depende fazer-se substituir o sonho do Brasil pelo sonho de Angola ou Moçambique, uma nova era, um novo élan da nossa raça, novo engrandecimento, novas forças, novas produções, neste Mundo em pendor manifesto para a insuficiência, para a instabilidade, para a catástrofe. Um sonho? Não; uma realidade perfeitamente possível.
Há muitos anos, talvez por volta de 1914, recordo-me de ter lido numa revista francesa de agricultura, de