17 DE ABRIL DE 1952 715
Houve quem julgasse que o saldo da balança comercial do período da guerra se manteria -, como mais tarde, ultimamente, a alta de preços de mercadorias de exportação e, de novo, o volfrâmio viriam alimentar novas ilusões.
Imaginámos, em certa altura, que a nossa prosperidade tornaria dispensável a aceitação da ajuda americana, e hoje estamos perante o problema difícil de resolver a nossa situação credora na U. E. P. de modo a obtermos benefícios efectivos, não apenas nominais, da nossa participação, com vantagem real para o nosso equipamento e para o aumento da nossa riqueza, não exclusivamente em benefício alheio e detrimento próprio. Mas não antecipemos considerações sobre as correlações económicas das nossas finanças públicas.
Com justa preocupação e decisão louvável, tomaram-se em 1949 as restrições que todos conhecem e que subsistiram na gerência inteira de 1950.
£ o que nos dizem as verbas globais de receitas e despesas, os saldos obtidos nessa gerência, a evolução do crédito do Estado e da dívida pública, a nossa posição monetária em ligação com o volume da circulação e a proporção desta com as reservas legais, enfim as possibilidades financeiras que o balanço dessa gerência permite entrever para a satisfação de encargos indeclináveis e de realizações desejáveis?
Resumidamente, o panorama é este: receitas ordinárias quase estacionárias; receitas extraordinárias em enorme regressão (seja pela redução dos saldos de gerência, seja pela redução voluntária e prudente do recurso ao empréstimo); despesas ordinárias resistindo aos esforços de redução, insuficientes para todos os encargos necessários, em progressão; despesas extraordinárias cerceadíssimas por medida de prudência e por serem cada vez mais limitadas as disponibilidades das receitas ordinárias, susceptíveis de as suportarem; saldos cada vez menores, embora firmemente mantidos com o sinal a prosseguimento da desvalorização do escudo, não já em relação aos padrões ouro e a moedas que eram tradicionalmente fortes, mas em relação aos preços, ao custo da vida, apesar de todos os esforços oficiais para combate da subida de preços, sobretudo em géneros mais indispensáveis; aumento da circulação monetária, embora com firme e louvável excesso da percentagem das reservas ou da sua contrapartida em relação à legal; aumento da dívida pública, embora em menor proporção do que nos anos anteriores.
Estos são os factos mais impressivos, juntamente com restrições severas, com um funcionalismo que os sacrifícios mais enérgicos do Tesouro não bastaram ainda para remunerar satisfatoriamente nem para premiar e estimular com todos os acessos justos a postos superiores ou mais adequados, com uma penúria frequente de possibilidades de trabalho, de material, de apetrechamento, etc., com uma redução recente do realizações produtivas, culturais e de outras ordens que constituem um dos justos motivos de desvanecimento e orgulho de uma Administração com dependência cada vez maior de obrigações internacionais e sobretudo de pesadíssimos encargos de rearmamento e defesa militares ...
Nem tudo, porém, é efectivamente desanimador no breve bosquejo feito, mas há neste, de facto, muitos incentivos de desânimo ou, pelo menos, de preocupação.
Parece-me, porém; que uma análise atenta de alguns factos fornece elementos susceptíveis de atenuar algumas cores sombrias do quadro esboçado.
Eu não creio que o confronto das receitas ou despesas em anos sucessivos, da circulação monetária, dos depósitos bancários da dívida, etc., em períodos diferentes, possa dar-nos uma noção real da situação financeira correspondente, do esforço desenvolvido, dos encargos assumidos, da riqueza amealhada ou consumida, se nos abstivermos de referir os quantitativos de cada época, tanto quanto possível, a uma unidade fixa, a um padrão comum.
Doutro modo lidamos com valores nominalmente comparáveis, mas efectivamente heterogéneos, insusceptíveis de confronto.
Simplesmente, todos sabem aqui, melhor do que eu, a dificuldade que há em encontrar padrão que permita comparar os escudos do 1938, por exemplo, aos de 1900 ou de 1952.
O tempo do padrão-ouro passou: o ouro tornou-se uma mercadoria de custo sujeito a oscilações que denunciam uma grande instabilidade de poder aquisitivo.
Os índices de preços ou de custo da vida são influenciados por providências governativas tendentes a combater a elevação respectiva, especialmente em mercadorias mais necessárias às populações.
Além disso, não há segurança absoluta no significado de alguns elementos que servem para a construção desses índices, apesar de todo o escrúpulo e cuidados que na matéria tem, por exemplo, o Instituto Nacional de Estatística.
Por mais que ao valor real da unidade monetária oficial ande ligado um factor psicológico que é sobretudo de confiança, e por mais que ele dependa também, como diz o nosso prezado colega Dr. Pinto Barriga, dum concentracionismo ou da tendência oposta, que chamarei difusionismo ou dispersionismo, a verdade é que há uma base, decerto razoavelmente significativa, na utilização dos índices de preços, especialmente dos de grosso, para o cálculo da unidade fixa indispensável aos confrontos de quantias expressas em escudos de épocas diversas.
Tomando como base o escudo de 1938=100, é legítimo atribuir ao de 1950 um número-índice de cerca de 250.
Os preços por grosso, segundo o Instituto Nacional de Estatística, foram, com a base de 100 para Junho de 1927, de 103 em 1939, 131 em 1940, subindo os índices consideràvelmente de 177 em 1942 para 221 em 1943 e 248 em 1944, caindo depois ligeiramente, para subirem de novo de 1945 para 1949, em que foi de 251,9 o índice, baixando levemente em 1950 para 248,9, para já em 1951 ultrapassarem os valores antecedentes, atingindo 272,5. Cabe distinguir índices de preços de produtos alimentares ou de outros, de produtos nacionais ou de produtos de importação, mas para a visão aproximativa de conjunto que pretendíamos bastavam-nos aqueles.
Pois bem. Exprimindo as receitas e as despesas em unidade fixa, o escudo de 1938, de 1940 e de 1950 (como fez para as receitas a Comissão das Contas Públicas), o estacionamento das receitas ordinárias e o carácter imperativo do volume crescente das despesas ordinárias podem tomar aspectos mais graves ainda se os apreciarmos em relação com o aumento de população nos períodos considerados.
Calculei a capitação tributária em escudos de 1938, em 225$ para 1940, em 227£ para 1950. Tantas somas invertidas, com sacrifícios heróicos, durante vinte anos, em realizações, em obras que honram uma política, e, no fim de tudo, o Estado não obtém mais do que 2$ por habitante de aumento na receita!... Evidentemente o caso não se oferece com esta aparente simplicidade.
O ilustre Ministro das Finanças lançou mãos com oportunidade a um inquérito sério sobre a capacidade tributária, as possibilidades de aumento e melhor repartição de carga fiscal na população do País.
Poder-se-á ir muito longe em tal aumento? Poderá esto resultar substancial, valioso, de uma melhor justiça tributária? São perguntas a que o inquérito fornecerá respostas.
Os encargos da dívida pública passaram de 284:744 contos em 1938 para 423:980 contos em 1950, que se