1120 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 168
porária vale metade da energia permanente, reconheceremos, mediante uma couta muito fácil, que 400 milhões numa central do Douro apenas valem 33G milhões de uma central do Zêzere.
É aqui que a maior parte das pessoas se engana quando fax contas; toma o total da produção do Douro como permanente e chega, erradamente, a preços que desnorteiam, quando a realidade é que a energia permanente do Douro nacional (pelo que se sabe de Carrapatelo) tem aproximadamente o mesmo valor (à roda de $20, como atrás se referiu) que têm alguns dos outros sistemas em construção ou projecto (Zêzere, Cávado, Côa, Távora, etc.).
Resulta isto de que o Douro nacional, se oferece vantagens, também oferece inconvenientes; a construção das suas centrais não é barata, porque têm de dar escoante a um elevadíssimo caudal de cheia (o que é um encargo), e porque têm numerosas restrições, devido às construções ribeirinhas (povoações, caminho de ferro, estradas, pontes, etc.).
Não há, pois, razão justificada de preferência pelo Douro nacional em relação aos outros sistemas conhecidos, a não ser pela energia temporária que ele produz abundantemente; mas, além de que essa energia temporária só em 1952 começou a ter consumo sensível com a laboração das duas fábricas de amoníaco (Estarreja e Alferrarede), tem-se a impressão de que não será indispensável o Douro para as alimentar. Se outra indústria do mesmo género se vier a montar (por exemplo a electrossiderurgia) o Douro terá então uma prioridade indiscutível. Por outro lado, essa energia temporária, vista no aspecto da conjugação com energia de albufeiras, só agora começa a ter alguma possibilidade de aproveitamento, porque só agora começa a haver grandes albufeiras de regularização anual.
Ao que se lê, uma vantagem suplementar se aponta ao aproveitamento do Douro nacional: a navegabilidade do rio.
Tem-se a impressão de que este aspecto, sem ser de desprezar, não é primordial. Parece não haver para descer o Douro mais de dois artigos de algum peso: o vinho e os minérios; e a prova é que lhe corre paralelo, em toda a extensão de 200 km, um caminho de ferro quase sem tráfego. Antes de se gastarem quantiosos milhares de contos em obras de navegação, parece de aconselhar que se traduza em números a vantagem da via fluvial ou se reflicta na maneira de limitar ao nível reputado indispensável as tarifas do comboio. Já hoje se transporta no caminho de ferro minério de Moncorvo para exportação em quantidade apreciável, em condições técnicas que não são as melhores - e só não se transporta mais porque as minas ainda não estão suficientemente equipadas para o produzir.
Se essas condições técnicas melhorarem - e certamente melhoram se liou ver tráfego intenso e seguro -, as condições de preço melhorarão em relação às actuais, que já são viáveis, e teremos assim caminhado para o objectivo, que é segura condição de êxito, mas donde às vezes nos afastamos, atrás da novidade ou da independência: aumentar a utilização dos nossos instrumentos económicos. Minério de ferro circulando de comboio 100 ou 200 km é banalidade pelo Mundo.
A navegação do Douro, se não custasse dinheiro, seria óptima, mas, como custa, há que reconhecer que não se apresenta essencial para a saída do minério - e o minério é dos artigos mais pobres que se transportam.
Que o aproveitamento da energia arraste a navegação do Douro é assunto que não se discute; que a navegação dê prioridade às obras do Douro é matéria que não se contesta, mas sobre que se têm dúvidas.
Digamos agora duas palavras sobre o Douro internacional. Assente, por convénio com a Espanha, que nos pertence a energia gerada no troço de montante desde o seu começo, em Paradela, até à foz do Tormes, na vizinhança de Bemposta, desde 1935, ano em que a central do Esla entrou em serviço, que se tem a certeza de residir ali a melhor fonte hidroeléctrica portuguesa. Mas se pensarmos em que a sua produção total é da ordem de 2 000 milhões de kilowatts-hora, a aproveitar ein duas ou três quedas, concluiremos que qualquer delas, tendo produção maior que as do Douro nacional, seria, com mais forte razão, grande de mais para nos ter interessado até agora. Não será inoportuno recordar que a central do Esla, prevista para uma produção média anual de 436 milhões de kilowatts-hora, esteve sete anos com produções inferiores a metade da sua capacidade normal por falta de mercado, numa situação financeira difícil, e só no oitavo ano (1942) produziu um pouco mais de 300 milhões. Se isto se tivesse passado em Portugal com uma central no Douro, não faltariam acusações!
No momento presente as perspectivas são outras. O nosso consumo aumenta por ano perto de 150 milhões de kilowatts-hora, não só porque a lei natural de crescimento é, como já se disse, a progressão geométrica, mas ainda porque, depois da guerra, se tem notado certa aceleração nos consumos industriais e domésticos. O Douro internacional, se ainda é grande, começa a não ser disparatado; simplesmente, porque nunca foi estudado a fundo, só há a seu respeito ideias de superfície que estão longe de permitir uma construção imediata. O Douro nacional, se está melhor colocado a esse respeito, não possui, contudo, um projecto definitivo; há, do Carrapatelo, uni anteprojecto.
Se é de esperar que o Douro internacional nos produza energia permanente a preço inferior aos $20 que se apontaram acima, importa não esquecer que ele se encontra desfavoravelmente localizado em relação aos centros de consumo. A sua ligação à subestação de Ermesinde por duas linhas a 150 000 volts, com 200 km cada, custará cerca de 120:000 contos, enquanto que a ligação de Carrapatelo à mesma subestação exigirá apenas duas linhas de 50 km, correspondendo, portanto, a um quarto da despesa; mas a provável necessidade de recorrer a uma tensão mais alta poderá ainda afectar o custo desse transporte. Apesar disso, o Douro internacional é, sem contestação, a nossa melhor fonte.
Esta é a verdade sobre o Douro, que a Câmara Corporativa entendeu dever antepor ia análise do Plano, para esclarecer comentários que se têm feito sobre o aproveitamento deste rio, orientar a discussão que certamente se fará e justificar a posição que tomará adiante na ordem de prioridade das novas centrais a construir.
Existe um quinto ponto sobre que a opinião pública anda desnorteada: o problema das tarifas de electricidade. Mas, como o assunto é longo e não interessa directamente ao objectivo deste parecer, a Câmara entende não dever abordá-lo.
2) A POSIÇÃO DO PROBLEMA. - Embora praticadas desde o último quartel do século passado, a produção de energia hidroeléctrica e a interligação das fontes produtoras começaram a ganhar prestígio e expansão em toda a Europa a partir da primeira grande guerra (1914-1918).
Até então, no nosso país, de entre os actuais grandes sistemas de serviço público, só a central da Senhora do Desterro, do grupo da serra da Estrela, estava em serviço desde 1909; é da mesma data a primeira Central do rio Varosa, já hoje desmontada.