4-(6) DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 169
guiar os trabalhos da Câmara, de modo a evitar que eles decorram com excessivas demoras ou com intempestivas precipitações ou, mesmo, se diluam em desaconselháveis e dispersivos pormenores.
Autoridade que tem de executar uma grande tarefa, embora sem alarde, porque decorre, em grande parte, no ambiente recatado das nossas salas de conferência.
Tarefa que exige permanente atenção e o conhecimento dos assuntos e da feição psicológica das pessoas que os versam; que tem de ser exigente e minuciosa até ao ponto do intervir (nos raros casos em que for necessário e com criteriosa medida) na vigilância da redacção dos pareceres - para que deles não transpareça alguma paixão que possa ser tida como excessiva (embora individualmente justificável), e portanto imprópria da nobre tradição da nossa Câmara, alicerçada na isenção, que se não corrompe, e na serenidade, que se não perturba.
E mais: tarefa que se alarga até à sincronização do aproveitamento dos limitados recursos e instalações de que dispomos, e só termina com a última prova tipográfica saída da Imprensa Nacional para ser urgentemente enviada à Presidência do Conselho ou à Presidência da Assembleia Nacional.
Ora, é certo que a facilitarão desta complexa e tanta vez melindrosa actividade depende da boa vontade e, direi mesmo, do zelo dos que são chamados a nela colaborar, como V. Ex.ª Sr. Presidente, amavelmente pôs em relevo.
Mas deve-se, primacialmente, a V. Ex.ª
A V. Ex.ª, que, para além dos seus peregrinos dotes de talento e dos seus méritos de professor universitário, possui o perfeito sentido das altas conveniências do Estado, o dilatado conhecimento da generalidade dos ramos da administração pública e aquelas capacidades de trabalho e persistente energia que o apontam como homem público de invulgar quilate.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Estou certo de interpretar o sentimento de toda esta Câmara ao rememorar a viagem que V. Ex.ª ainda há bem poucas semanas fez pelos vastos territórios da África, felicitando-o quer pelo êxito da sua missão oficial, quer pelo acolhimento que mereceu das leais gentes do nosso Império ultramarino, com um luzimento pessoal cujo reflexo atingiu a Câmara da sua digna presidência e a própria comunidade nacional, que, sob a direcção inspirada o verdadeiramente superior do um grande Chefe de Governo, atravessa um período de renascimento que está já inscrito, em letras indeléveis, nas páginas da história de Portugal.
Vozes: - Muito tem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e Dignos Procuradores: aqui, mais que em qualquer outra instituição de trabalho mental em comum, quem preside não pode limitar-se ao mero papel de ordenador da disciplina das discussões. Tem de ser um autêntico condutor de trabalho, pesquisador de aptidões, animador de energias, e ainda um colaborador sagaz e ponderado, com a subtileza de um diplomata e a inflexível autoridade e o sentido da harmonia de um regente, pois que da própria essência da formação corporativa da nossa Câmara dimana que a diversidade das origens dos conhecimentos especializados se subordinará ao conceito do superior interesse da Nação, de modo a procurar o predomínio da justiça social sobre o egoísmo individual.
Neste sentido é que se tem conseguido achar, na harmonia das soluções, a unidade das deliberações proferidas em nome da Câmara, sem embargo do acatamento e registo que mereçam algumas divergências, irredutíveis e bem fundamentadas, cuja apreciação convenha levar ao conhecimento de quem tenha de decidir em última instância.
Continuo seguro do interpretar o pensamento de todos os Dignos Procuradores proclamando que V. Ex.ª tem firmado com zeloso cuidado, ou, para melhor dizer, com brilhante actividade, esta orientação, sabendo manter o prestígio da Câmara nas suas relações exteriores e assegurando e tudo fazendo dentro do forçado limite das possibilidades de momento para que as nossas instalações e as condições em que temos de efectuar os nossos trabalhos não nos diminuam em relação à dignidade das nossas funções, nem nos entibiem em relação à vontade de bem servir.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - É esta, como V. Ex.ª salientou, a última sessão desta legislatura. É bem provável que eu não tenha outra ocasião como esta para dizer publicamente, não só quanto o admiro pelas faculdades do estadista já reveladas, mas também quanto espero da sua devoção cívica nas horas incertas de um futuro que se nos não apresenta desanuviado, pois que é de caligem e de tempestade o aspecto do céu que cobre o Mundo.
Restringindo-me, porém, como cumpre, aos assuntos que imediatamente interessam a esta Câmara, permito-me lembrar a conveniência de não cessar as diligências para que a biblioteca do Parlamento, tão monumental no aspecto das suas vastas salas, corresponda ao fim a que se destina, pela urgente elaboração de um catálogo ideográfico, sem o qual não podemos ter conhecimento dos recursos que ali se podem oferecer para o estudo dos problemas da administração pública.
Não nos podemos esquecer de que os Dignos Procuradores, e nomeadamente os que representam por eleição as organizações corporativas, muitas delas de fora da capital, carecem de ter aqui, sem sujeição à benevolência de amigos nem a inevitáveis perdas de tempo, os elementos necessários para poderem fazer mais seguro juízo sobre as questões que desejem ou precisem de tratar. Uma biblioteca apenas com o catálogo bibliográfico de nomes de obras e autores é sempre útil e respeitável; mas, no fundo, não passa de um museu de livros, cujo conteúdo ficará na maior parte desconhecido. Está, pois, longe de ser o instrumento de trabalho correspondente às necessidades de uma instituição parlamentar, em que a rapidez e a segurança do estudo são predominantes.
Por outro lado, sentimos a necessidade de ver rapidamente preenchidas as vagas que se abrem nas nossas fileiras. É grande a sobrecarga de trabalho que impende sobre alguns Dignos Procuradores - vítimas, é certo, das suas excepcionais aptidões -, e creio até poder acrescentar que há secções insuficientemente dotadas em número de Procuradores e mesmo secções que será conveniente desdobrar.
É ao contacto das realidades de um trabalho que solicita o concurso de variados e competentes especialistas que a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se terá revelado esta necessidade. Bem o sentimos, nos últimos tempos, quando esta Câmara teve do ocupar-se simultaneamente de numerosos problemas, da maior transcendência, tanto para a metrópole como para o ultramar. Eu sou, sem dúvida, partidário da severa aplicação dos dinheiros públicos; e por isso aplaudo as medidas tomadas sobre a atribuição do subsídio de exercício de funções aos Dignos Procuradores. Entendo, porém, que, quanto ao número destes, a preocupação meramente orçamental não tem razão de ser. A economia é uma virtude apenas no limite em que não cai no exagero de sufocar actividades úteis à colectividade.