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23 DE JANEIRO DE 1953 515

de eleitores, e elegíveis bastantes para o seu bom funcionamento.
Pelo que acabo de dizer, vê-se, pois, que a extensão das leis da metrópole ao Estado da Índia, ou, melhor, a sua assimilação jurídica à metrópole, fez dos seus naturais, não uns tantos «assimilados», como com rigor jurídico se diz por vezes, mas historicamente verdadeiros portugueses da Índia, qualidade esta que teoria alguma ou ideal de uniformidade administrativa do ultramar pode modificar ou suprimir.
Foi precisamente por isso que a Carta Orgânica do Império constituiu para eles uma espécie de colete de forças.
E a própria Câmara Corporativa diz, no douto parecer já referido, que «sabe de um certo mal-estar político subsistente numa ou noutra província, das críticas e representações que de certa ou certas delas intermitentemente têm partido, originadas no sistema de governo e de administração talhado uniformemente para todas, o qual, se quadra com as condições de algumas, é mais ou menos inadequado para essoutras».
Sr. Presidente e Srs. Deputados: sabem VV. Ex.ªs que se tem discutido a possibilidade de ser outorgado um estatuto especial para o Estado da Índia.
No decurso das diligências feitas oficialmente na Índia para se auscultar a opinião pública pude compreender que as pessoas sensatas tendiam para uma solução que pouco mais representa que um regresso ao regime das bases orgânicas de 1920, isto é, para uma autonomia muito acentuada.
Não me inclinei muito para essa solução por dois motivos:
1.° Porque as circunstâncias de hoje, interna e externamente, são muito diferentes das de 1920. Precisamos agora de uma orgânica que nos permita preparar o futuro em condições de resistirmos aos abalos semelhantes aos do momento que passa;
2.° Porque o Estado da índia não é uma colónia, podendo eu afirmar que na base dos ressentimentos e do mal-estar das suas populações está precisamente o facto de o Acto Colonial e a Carta Orgânica vigente assim o terem considerado e classificado, com as consequências que daí resultaram.
Ao passo que a autonomia quer das bases orgânicas de 1920 ou outras mais amplas só é possível num regime colonial, com a correlativa tutela ou sujeição por parte da metrópole.
O problema não está apenas na interferência mais ou menos activa do elemento popular na gerência e fiscalização das contas do Estado pelo sistema e métodos do regime colonial ou ultramarino, como agora se dirá.
Não. O problema fundamental está em se tirar o Estado da Índia do sistema da administração colonial ou ultramarina, para melhor se integrar depois no regime administrativo metropolitano, com um estatuto especial, semelhante, por exemplo, ao das ilhas adjacentes, com as modificações que a distância, certas peculiaridades de ordem económica e a proximidade de países recentemente formados exigirem.
Em suma, a realidade social e cultural do histórico Estado da Índia pede uma orgânica que contribua para uma maior ligação directa a Portugal, isto é, sem ser por intermédio do bloco ultramarino, numa perfeita identificação espiritual e maior assimilação jurídica.
Quando a Câmara Corporativa apreciou, no seu douto parecer n.° 10/V, a proposta de lei sobre a revisão do Acto Colonial, verificando a ideia de assimilação que no novo texto despontava, chamou muito particularmente a atenção para os perigos de uma assimilação prematura dos territórios ultramarinos à metrópole.
Salientou que as diferenças das condições sociais e económicas da maior parte deles exigem especialização do Governo, da administração e das leis.
É indubitável que não pode deixar de se atribuir uma organização administrativa quase totalmente diversa da metropolitana às províncias que a própria Câmara descreve pela forma seguinte:

... territórios africanos, situados na zona intertropical, com vastas extensões por desbravar, populações em regime tribal, núcleos europeus constituídos por colonos em número mínimo, desgarrados das suas famílias e dos meios sociais tradicionais e ainda não congregados em novas comunidades estáveis.

Mas a própria Câmara admite, e com muita razão, que Cabo Verde, por já estar aí terminada a fase de colonização, pode passar do estatuto de colónia ou ultramarino ao das ilhas adjacentes.
Poder-se-á negar orgânica parecida ao Estado da Índia, que nunca foi colónia?
Se é certo que, sem uma emenda constitucional, a administração do Estado da índia não poderá ser totalmente integrada no sistema da administração metropolitana, é evidente, por outro lado, que, pelo menos em parte, pode ser juridicamente assimilado à metrópole, ao abrigo dos artigos 149.° e 153.º da Constituição, e reger-se por um diploma ou estatuto especial que retire todo o carácter colonial a essa administração.

O Sr. Melo Machado: - Parece-me que a característica deste diploma que estamos a discutir é estabelecer para cada província ultramarina, de certo modo, uma legislação.

O Orador: - Eu prevejo que na futura orgânica do Estado da índia se estabelecerá uma nova solução.
Porém, segundo o parecer da Câmara Corporativa acerca do projecto de lei em discussão, «não deve haver províncias ultramarinas que vivam, à sombra de um estatuto excepcional. Que vivam, sim - insiste a Câmara -, simultaneamente de acordo com o regime geral do governo de todas elas e com o seu próprio estatuto. Assim, de resto - acrescenta -, se evita que quanto fosse excepcionalmente concedido só a uma viesse sucessivamente a ser reclamado ou exigido por qualquer das restantes províncias de além-mar».
Mas eu, por mim, penso, Sr. Presidente, que em política não existem fórmulas absolutas. Um sistema ideal de política, segundo considerações de pura ordem teórica, força as realidades. Por isso é preciso partir destas para a teoria e dos factos para os sistemas.
Parece-me, portanto, que não é razoável recusar ao Estado da Índia uma organização que corresponda as realidades, não só em homenagem ao ideal de uniformidade, mas ainda sobre a consideração de que outros territórios -Angola ou Moçambique, por exemplo - reclamem orgânica igual.
O Estado da Índia não tem a veleidade de se considerar superior a Angola e Moçambique, nem o é, mas estranha que se não queira ver que é diferente.
E, exactamente porque é diferente, diverso tem de ser o seu regime administrativo.
Conquanto Portugal seja juridicamente um Estado unitário, com um só território, uma só população e um só Governo, a realidade é que, na parte ultramarina do mesmo território, a população é composta por duas classe jurídicas: os cidadãos e os indígenas.
Na revisão a que em 1945 se procedeu na Carta Orgânica dispôs-se no artigo 246.°, § único, que «no Estado da Índia e nas colónias de Macau e Cabo Verde as