922 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 220
tação que resultam de toda essa legislação díspar, visto que o projecto que se discute agora versa apenas um dos seus aspectos, ou seja o da avaliação do prédio a expropriar.
Preconiza-se o estabelecimento de recurso para os tribunais superiores de forma a obter-se uma possível correcção dos valores lixados pelo juiz da l.a instância.
Nada há que objectar.
Mas, como muito bem se acentua no parecer da Camará Corporativa, desde que se trata de estabelecer a possibilidade de um recurso é legítimo alargar a admissibilidade deste a todos os despachos proferidos pelo juiz, tanto na fase arbitrai como na fase propriamente contenciosa, pois todos eles podem de forma decisiva influir no resultado da expropriação.
Conheço um caso em que um juiz complacente permitiu que se instaurasse um processo de expropriação de vários prédios para a construção de um teatro sem que aquela tivesse sido devidamente decretada-e nunca o foi. Quando os proprietários lesados quiseram reagir eficazmente, ficaram disso impedidos pela própria lei, e só evitaram ser desapossados daquilo que era deles - em benefício não da colectividade mas sim de um capitalista clarividente - pela oportuna intervenção do Governo.
Penso, por isso, que o texto proposto pela Câmara Corporativa se ajusta melhor à situação e não me repugna aceitar a emenda do Deputado Sr. Dr. Sá Carneiro tendente a subordinar a admissibilidade do recurso às alçadas estabelecidas na lei geral.
Ouso, porém, lembrar todos os restantes casos de expropriações não regidos pelo Decreto n.º 37 758 e ainda aqueles em que hajam de fixar-se indemnizações pela constituição de receitas de interesse público sobre bens de domínio privado, como acontece com as instalações eléctricas, com a exploração mineira e outros. É justo que nestes casos se admita o recurso para os tribunais, e neste sentido mando para a Mesa uma proposta de aditamento de um novo artigo.
E ainda, visto que da avaliação de prédios a expropriar estamos a tratar, creio não exceder o âmbito do projecto em discussão focando um aspecto da questão que utilmente pode ser esclarecido nesta oportunidade.
Eu refiro-me à forma de apresentação dos laudos, pelos árbitros, para deles se obter a média aritmética dos que mais se aproximem, como se prescreve no artigo 22.º do mencionado Decreto n.º 37 758.
Na prática já vimos os árbitros jogarem às escondidas, procurando cada um deles conhecer os laudos dos restantes antes de dar o seu; para o aproximar daquele que mais lhe convenha, para com este fazer a média aritmética e tornar inaproveitável o outro laudo.
Trata-se dum artificio que tanto pode prejudicar o expropriante como o expropriado e que ó preciso evitar, o que é fácil desde que se estabeleça o segredo da apresentação dos laudos até que todos os árbitros tenham votado.
Neste sentido mando para a Mesa uma proposta de votação de um novo artigo para ser aditado ao projecto que se discute e que, a meu ver, é complemento dos motivos que o inspiraram.
E, para terminar, dirijo as minhas saudações aos ilustres Deputados que mais uma vez tiveram a ideia de agitar o problema das expropriações, se não para que fique resolvido definitivamente, como foi voto desta Assembleia ao discutir-se a Lei n.º 2 030, para que, ao mesmo, se sanem algumas das dificuldades existentes.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Cerveira Pinto: - Sr. Presidente: pedi a palavra e subi a esta tribuna para dizer que votarei o projecto de lei em discussão se para fazer algumas considerações, que neste momento se me afiguram indispensáveis, sobre o grave problema das expropriações por utilidade pública.
O § 2.º do artigo 31.º do Decreto n.º 37 758, de 22 de Fevereiro de 1950, preceitua que da decisão do juiz que fixar a indemnização nas expropriações por utilidade pública não haverá recurso. E isto não obstante ficar a constar do processo a prova produzida, visto toda ela ser reduzida a escrito e serem até escritas as próprias alegações das partes.
A inexistência de recurso nestes processos representa, portanto, um absurdo, devendo-se, no entanto, acentuar que já não é tão grande como o que se encontrava estatuído na Lei n.º 2 018 e seu decreto regulamentar, pois que aí também não havia recurso, apesar de as provas e alegações serem reduzidas a escrito e de o julgamento se fazer com a intervenção do tribunal colectivo.
Com a nova lei em que certamente se converterá o projecto em discussão esse absurdo vai acabar, e este motivo, só por si, já me parece suficiente para que a Câmara lhe dê a sua aprovação.
Mas, convertido este projecto em lei, o processo de expropriação ficará coerente e harmónico com os princípios de direito processual estatuídos no nosso Código?
Evidentemente que não.
Toda a gente sabe mesmo os que não são profissionais do foro - que o Código de Processo Civil consagrou o princípio da oralidade da instrução e discussão das causas judiciais.
Ora, não se concebe que nos processos de expropriação por utilidade pública, que por sua própria natureza e por expressa determinação legal têm de correr com a máxima brevidade, se esteja a perder tempo com depoimentos escritos e alegações escritas, quando é certo não existir este luxo em causas muito mais solenes e que não estão sujeitas à urgência que para as expropriações a lei exige.
Como VV. Ex.ªs vêem, o processo estabelecido para as expropriações é incoerente e inconveniente.
Para que este processo ficasse integrado nos princípios gerais de direito processual em vigor, a solução a adoptar seria a seguinte:
Se ò processo, pelo seu valor, está dentro da alçada do juiz de direito, a produção de prova excepção feita, evidentemente, a avaliação, porque esta é, pela sua própria mecânica, sempre escrita seria oral;
Se o processo tem valor superior a 20 contos, mas não excede os 50, e se as partes não prescindirem de recurso, os depoimentos seriam escritos por extracto na acta da audiência, em conformidade com o preceituado no artigo 791.º do Código de Processo Civil, e o julgamento competiria ao juiz singular;
Se o valor ultrapassa 50 contos, a produção de prova seria prestada oralmente perante o tribunal colectivo, que fixaria u justa indemnização a atribuir ao expropriado.
As alegações das partes seriam sempre orais, fosse qual fosse o valor do processo.
Por esta forma o processo de expropriação por utilidade pública, além de ficar harmónico com os princípios gerais, obteria ainda a vantagem de ser mais célere do que é hoje.
Determina o n.º 2.º do artigo 20.º da Lei n.º 2030 que o Governo deverá reunir mim único diploma todos os preceitos relativos ao regime jurídico das expropriações por utilidade pública.