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20 DE MARÇO DE 1953 923

Faço votos para que, se não for antes, ao menos na altura em que se cumprir o preceituado na disposição legal que deixo referida, sejam tidas na consideração que merecem as desataviadas sugestões que acabo de fazer.
Mas, e retomando o fio do discurso: com a lei que sairá do actual projecto, o processo de expropriação melhora, pelo menos, teoricamente. Por isso merece aprovação.
A verdade, porém, é que não foi por simples razoes de melhoria processual que os dois ilustres Deputados Drs. Bustorff da Silva e Sá Carneiro apresentaram o actual projecto de lei. O seu objectivo é mais substancial: o que se pretende é que, por via de recurso, os tribunais superiores possam corrigir as porventura erradas decisões da l.a instância.
Esta é a essência do projecto.
Neste ponto, que, repito, é o essencial, o meu entusiasmo pelo projecto é muitíssimo comedido. Vou dizer porquê, embora corra o risco de ferir susceptibilidades, prejudicar interesses e criar antipatias e malquerenças. Amicus Pinto, sed magis amica Veritas.
Por isso, corra os riscos que correr, aquilo que em minha consciência entendo ser a verdade sobre este candente problema das expropriações não o ocultarei.
No processo de expropriarão os depoimentos de testemunhas constituem uma prova de reduzido ou nulo valor; e este é mais um argumento que milita contra o actual sistema de esses depoimentos serem reduzidos a escrito.
As testemunhas não sabem, por via de regra, atribuir valor aos bens a expropriar. E quando o atribuem, as cifras que apontam são tão díspares e tão distanciadas umas das outras que não dão margem a que o julgador possa extrair qualquer conclusão, já não digo certa, mas ao menos de aparência não muito errónea.
As próprias comparações que, por vezes, as testemunhas fazem com valores por que foram transaccionados outros prédios -por via de regra de diferente configuração e tamanho, de diversa localização e de desigual qualidade- são praticamente inúteis.
Nestes processos a grande prova, a pedra angular em que assenta a decisão é o arbitramento, sob a forma de avaliação.
E aqui é que reside a parte trágica das expropriações.
A forma de liquidação das indemnizações devidas pelas expropriações necessárias à execução das obras comemorativas dos centenários, prevista pelo Decreto--Lei n.º 28 797, de l de Julho de 1938, provocou da parte dos expropriados sérias reacções, de que a própria Assembleia Nacional se fez eco, votando a Lei n.º 2018.
E o que se passou depois de votada esta lei? E o que se está a passar no domínio da Lei n.º 2 030 e seu decreto regulamentar?
Se havia injustiça nas expropriações feitas à sombra do chamado «decreto dos centenários», ela não acabou com a publicação das duas leis que ficam referidas.
Pelo contrário: a injustiça atingiu maiores e mais escandalosas proporções. Simplesmente mudou de sinal.
Antigamente os prejudicados eram os proprietários dos prédios objecto das expropriações. Por isso toda a gente protestava.
Hoje, as grandes vítimas são as entidades expropriantes, por via de regra o Estado e as câmaras municipais.
Por isso toda a gente está calada.
E de onde deriva a injustiça que o Estado e as câmaras municipais têm sofrido nas expropriações feitas desde que entrou em vigor a Lei n.º 2018 até hoje?
Não deriva, geralmente, do julgamento feito pelos árbitros, porque nesse julgamento há um travão para os desmandos escandalosos.
Como, SP não houver unanimidade ou maioria na decisão, valerá como tal a média aritmética dos laudos que mais se aproximarem, os árbitros são, naturalmente, solicitados a não se afastar muito da verdade, visto que não será tomado em conta o laudo daquele que exageradamente se distanciar do valor real do prédio expropriando.
Mas, geralmente, lia recurso para o tribunal, interposto sempre, ou quase sempre, pelos expropriados.
E na avaliação feita no recurso não há limite de espécie alguma.
E, porque não há limite nenhum, têm-se visto os laudos mais espantosos e inacreditáveis.
Toda a gente sabe que o arbitramento é uni meio de prova admitido em juízo e que, por isso mesmo, os peritos têm de se comprometer, sob juramento, a desempenhar-se conscienciosamente do encargo que lhes é confiado.
Pois há peritos que entendem que, ou o juramento que prestam é uma formalidade sem importância, ou o compromisso de se desempenharem conscienciosamente do encargo que lhes é confiado significa o dever de defenderem, por fás ou por nefas, os interesses materiais da parte que os nomeia.
Entrou já na linguagem usual de certos peritos o chamarem a quem os designa o seu constituinte.
Ora, partindo-se deste falso e perigosíssimo princípio, pode chegar-se, e chega-se quase sempre, aos resultados mais absurdos e mais injustos.
Isto, por um lado.
Por outro lado, constitui axioma indiscutível que o Estado e as câmaras municipais vão para os recursos de expropriações numa «posição de manifesta inferioridade em relação aos particulares. E isto porque nem o Estado nem os corpos administrativos têm, por todos os motivos e até por evidentes razões de ordem moral, possibilidade e a capacidade de manobra junto das testemunhas e dos peritos- que possuem os proprietários dos prédios expropriandos.
O Estado e os corpos administrativos limitam-se a indicar testemunhas e a nomear peritos, devendo aquelas e estes agir apenas segundo os ditames da sua consciência.
Julgo que não é necessário ser mais explícito sobre este ponto.
Por todos os ponderosos e infelizmente verídicos motivos que ficam apontados, deparam-se-nos todos os dias nos recursos de expropriações laudos verdadeiramente monstruosos.
Eu poderia, se quisesse, apresentar aqui muitos exemplos concretos que ilustram a verdade do que afirmo.
Não o faço para não tornar demasiadamente fastidioso o meu falamento.
Limitar-me-ei a perguntar se será possível que dois engenheiros estranhos aos serviços da câmara que os nomeou peritos na expropriação de um- prédio rústico tenham dito no processo que o prédio valia 280.800$ e que outros dois engenheiros, designados pelo expropriado, tenham afirmado que o valor do terreno era de 809.094$?!
Sim, é possível. O facto deu-se. E um de entre muitos outros que eu poderia aqui apontar.
Estes quatro peritos, diplomados com um curso superior, sabedores do seu ofício, colocados perante o mesmo facto concreto, cumpriram todos o seu dever de consciência? E evidente que não.
Alguns traíram a verdade por eles conhecida e faltaram ao juramento prestado.
Mas, com base em laudos desta espécie (e - nunca é demais repeti-lo - a avaliação é que constitui a prova mestra em processos de expropriação), só por um dom