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21 DE MARÇO DE 1963 975

organização. E todos os aspectos se denunciavam merecedores de exame, desde a estrutura administrativa ao campo de aplicação, ao esquema de benefícios, ao regime financeiro e à prestação dos serviços assistenciais. Estava em boa posição quem assim mandava. A revisão, que é sempre uma atitude científica, põe-se para os homens do Governo como um dever de consciência.
Os anos vão passando. E este problema, que é dos mais vultosos da nossa hora, e esta ideia, que é das mais belas do regime, continuam detidos. Temos já elementos para os rever? Podemos obstar a que os erros tanchem raízes mais fundas, as situações se compliquem no seu desarticulado e no seu indefinido? Ganhámos consciência bastante para rectificar doutrinàriamente, expurgando os enxertos de teor ou de finalidade contrários aos nossos princípios político-sociais?
Tenho estudado e oferecido a minha colaboração na Previdência Social o melhor que sei e posso. Pela força do cargo, pesado mas honroso, que a corporação dos médicos portugueses me confiou, tenho vivido, talvez mais profundamente do que ninguém, as realizações mais expressivas da nossa Previdência Social.
Na mesma atitude me mantenho hoje ao erguer aqui, até ao Governo, este magno problema, com a serena consciência e também com a perfeita responsabilidade do interesse que ele desperta no País: quero, ainda e simplesmente, ao lado de quantos trabalham para a reorganização da nossa Previdência Social, continuar no estudo e na colaboração. Tudo o que eu possa dizer tem assim de ficar num plano de crítica séria e objectiva.
Nunca também seria de outro modo, porque o impede a minha formação, para a qual, justo é confessá-lo, muito contribuem estes trinta e quatro anos que já levo de trabalho científico, na disciplina da Medicina, onde os factos se movem no campo mais objectivo, a verdade se busca pela verdade e a revisão dos conceitos se propõe e impõe a toda a hora.
Estou certo de que não abandonarão o mesmo terreno alto aqueles que, porventura, participem no debate. Todos conhecem -e melhor do que eu a função que nos cabe nestes lugares: a de dar ao Governo e ao Pais a certeza de que estamos atentos ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -... de que nos entram na inteligência e no sentimento todos os problemas dos diferentes andares em que se hierarquiza e se entrelaça a vida da Nação, desde os morais aos sociais e desde os espirituais aos económicos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Só uma coisa peço aos que me escutam: é que se lembrem de que não sou técnico de previdência ou de seguros, nem tenho por mim as repartições especializadas, e me perdoem se; para. fora das grandes linhas da construção doutrinária e administrativa, eu cair em erros de pormenor.
Ora o que me oferece o aspecto actual da nossa organização de Previdência Social? Como está edificado até agora? Tem erros de construção? Se os tem, como rectificá-los? E em que perspectivas delinear ç remate do edifício?
O que vou dizer não é matéria perfeitamente nova. É apenas o enfeixamento e a culminação de ideias que já apontei na Assembleia Nacional ao discutir a lei de combate à tuberculose, que já referi no parecer n.º 35 da Câmara Corporativa sobre a lei de combate às doenças infecto-contagiosas e que andam espalhados por estudos vindos a lume ou nas revistas médicas ou nos jornais do grande público.
É também certo que algumas das sugestões e das soluções que vou enunciar coincidem com outras que estão gravadas por diferentes lados ou que ouvi de bocas autorizadas; mas a coincidência não significa que eu filtre para aqui posições ou critérios oficiais nem me obriga claramente à reserva das opiniões.
Vou então desenvolver o exame pela ordem que tracei na minha nota:

I) ESTRUTURA ADMINISTRATIVA. - A primeira protecção obtida para os nossos operários foi a de doença. E começaram a usufruí-la pela acção dos sindicatos. Nos dez anos que se seguiram à promulgação do Estatuto do Trabalho Nacional, ou seja nos primeiros oito de vigência da lei que criou as instituições de previdência e as separou em grupos, foram os sindicatos, e não as caixas, que dominaram na assistência médica então prestada. Ainda em 1944 as caixas sindicais gastaram apenas 673 contos com a assistência médica e os sindicatos despenderam quase três vezes mais com as mesmas despesas.
Por essa altura arrancava já o grande movimento ascensional das caixas, favorecido pelo Decreto de 20 de Fevereiro de 1943, que punha no Instituto Nacional do Trabalho e Previdência a iniciativa da constituição de caixas de reforma ou de previdência. Foi rápida a expansão; em 1946 estavam erguidas 72 caixas, com uma população de beneficiários ao redor de 300 000.
Pode dizer-se que esta velocidade de progressão não foi regida por boa disciplina. Houve o propósito de estender o seguro obrigatório, e cumpriu-se. Mas faltou uma visão e um plano de conjunto. Se é certo que entre nós se pisava terreno virgem, por isso mesmo os passos deviam ter sido mais cautelosos. Existia, de resto, na Europa, por essa hora, já delineadas e legisladas, organizações de seguros obrigatórios que bem podiam servir-nos para meditar na necessidade de não construir sem uma disciplina em extensão e em profundidade.
Criaram-se rapidamente muitas caixas, sem dúvida. Cada uma delas ficou, no entanto, com um regime, a bem dizer, próprio: organizou como quis os seus quadros administrativos e burocráticos; com mais ou menos folgança remunerou-os a seu talante e instalou-se como melhor lhe apeteceu.
Justamente porque não havia nem risco nem moldes, algumas perderam-se nos caminhos e foi preciso retirar-lhes a espontaneidade de governo e impor comissões administrativas. Ficou tão gritante o desacordo entre elas no que diz respeito a quadros, categorias e remuneração do pessoal que acabou por estudar-se um regulamento, agora mesmo publicado, para, ainda que dentro de tipos, as uniformizar e, como diz o despacho respectivo, as dotar e um mínimo de disciplina indispensável.
A esta disparidade do lado administrativo juntava-se igual desencontro do lado assistencial. Cada caixa tinha o seu esquema de protecção à doença: umas davam muito, outras pouco; aqui, apenas se lograva a visita e a consulta; acolá, também as especialidades e os meios laboratoriais de diagnóstico; além, toda a assistência farmacêutica; depois, os internamentos; mais adiante, a cirurgia e, para além ainda, o auxílio à maternidade. E viam-se os mais opostos sistemas: umas caixas tinham postos privativos e médicos avençados, outras deixavam que o beneficiário consultasse o médico da sua escolha e pagavam os preços comuns ou uma tabela combinada. Se em tão larga escala de diferenças intervinham, naturalmente, os recursos de cada instituição, também é certo que regiam, em grande parte, o critério e tino administrativos.
Paralelamente às caixas de previdência montaram-se outras caixas para abono de família, depois do Decreto-