24 DE MARÇO DE 1953 1071
e até da boa economia da Nação, é forçoso estruturar convenientemente a organização da lavoura.
Não me parece que tal se possa fazer sem que os grémios da lavoura e as Casas do Povo realizem um trabalho de entendimento e colaboração, que até agora não existiu.
A organização profissional dos lavradores deve ser tão simples e fácil que se adapte à pobreza dos caseiros e rendeiros e tão completa que não deixe sem amparo e auxilio qualquer aspecto da vida do associado.
Há necessidade de que não falte em cada organismo profissional e primário dos lavradores a secção de formação e cultura - formação moral, sindical e técnica ou de exploração da terra.
É que não vale nem resulta ter associados uns tantos lavradores; o que vale é convencê-los do valor e necessidade da associação e criar-lhes uma consciência moral e sindical que seja elemento de mística associativa e, mais do que a lei, os congregue em defesa colectiva própria e sempre a bem da Nação.
Este trabalho educativo no aspecto moral e sindical está por fazer. Por isso é que se não ama a organização, pois falta a consciência do seu valor.
O Ministério das Corporações deveria intervir nesse aspecto da vida associativa agrícola, como intervém na vida dos sindicatos operários.
E permitam-me que, sem intuito de ofensa para ninguém, diga que os delegados do Instituto Nacional do Trabalho não deviam ser simples bacharéis em Direito, mas preparados em escola especializada, para que fossem nos seus distritos os disciplinadores e educadores de funcionários, que não seriam apenas burocratas, mas propagandistas do corporativismo e associativismo e capazes de formar um escol de dirigentes entre os associados das várias profissões.
Sem este esforço a organização corporativa terá quadros - os quadros determinados pela lei -, mas não terá mística nem almas e cairá num baixo materialismo de interesses e de luta de classes.
Quando este trabalho de educação sindical, associativa e social se fizer no sector agrícola é ainda preciso defender os associados contra dois grandes inimigos da vida associativa: o usurário e o mau negociante ou negociante ganancioso.
Contra a usara, que aflige a lavoura, mormente a pequena lavoura, são indispensáveis as secções de crédito dentro dos organismos agrícolas e, em união com a secção de crédito e em íntima colaboração com ela, a secção de cooperativas de produção e compra e venda exclusivamente a favor dos associados.
Não se compreende nem justifica que o crédito agrícola não tenha sido ainda reformado e se encontre desarticulado da organização da lavoura, em que se devia incluir, fazendo parte, assim como as cooperativas, da secção económica da organização sindical ou profissional.
O que acabo de dizer, tendente a que se faça das organizações profissionais organismos completos, só é novidade por se não ter praticado. Está, porém, na história, tradição e essência do corporativismo português.
É sabido que as confrarias não eram apenas associações de piedade, com o objectivo da formação religiosa e moral dos associados, mas bancos populares, contra a usura e mutualidades de seguro dos homens, e até dos animais, como as confrarias de Santo Antão, de que encontramos ainda memória em velhos arquivos das nossas paróquias do Minho e de que as mútuas indemnizadoras de gado bovino não são mais que o prolongamento e continuação.
A nossa vizinha Espanha não esqueceu estes ensinamentos e lições da história e mantém prósperas as suas irmandades de lavradores.
Da maneira como ela fomenta o crédito e os organismos populares de economia e crédito entre as populações rurais nos dão eloquente testemunho os cartazes que nas aldeias da Galiza chamam a atenção dos viajantes para a existência em cada localidade da «cajá de abonos».
O problema é vasto e eu já me alarguei em demasia no seu exame ou crítica e estou por isso a cansar V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a Câmara.
É que se trata de uma questão de vida ou de morte para a pequena lavoura. Ou esta vive da força e auxilio de uma boa organização ou perece, à míngua de um mínimo económico indispensável.
E o desaparecimento da pequena lavoura, que é o mesmo que dizer da pequena e média propriedade, não se dará sem que toda a vida da Nação se ressinta e o facto traga sérias consequências económicas, sociais e de ordem pública.
Para as evitar se expressa o desejo de que não tardem as federações regionais da lavoura, pelas quais há tempo se clama em vão, e de que o lavrador, ao mesmo tempo que encontre crédito e colocação ajusto preço dos seus produtos, como serviços da organização a que pertence, receba ainda dela a cultura e a educação social, moral e associativa, que não tinha ao lançar-se a organização e que nada se fez para lhe dar.
E que, logo que seja possível - pois vai sendo tempo-, os organismos de coordenação económica, que, por circunstâncias especiais da guerra, se intrometeram na vida da organização corporativa, abandonem as posições tomadas e não estorvem nem tornem odiosa essa organização, permitindo-se nela direitos e funções que a rigor lhes não pertencem.
Sr. Presidente: quando o turista, português ou estrangeiro, se dirige ao Alto Minho, para aceder ao convite do autor do Minho Pitoresco e poder confrontar as belezas das margens do rio Minho com as do rio Lima - que se disputam à porfia vantagens e primazias, pleito difícil que o referido autor se não decide a resolver, comparando-o ao eterno e insolúvel problema dos olhos azuis e dos olhos negros -, e, entrando em Viana do Castelo, sobe a esse incomparável miradouro que é o monte de Santa Luzia, sentirá todo o assombro da maravilha da paisagem, viva, garrida e variegada.
Se, porém, além de admirar a paisagem, o interessa a vida da gente que habita esse rincão português de incomparável beleza, notará bem depressa que o rio
- que em linguagem poética beija os pés da cidade, sua dama, e abraça os campos -, assoreado no seu leito, invade os terrenos marginais e rouba às gentes de Viana e de Ponte de Lima o pão, ou seja as culturas de algumas centenas de hectares de terreno.
É a nota triste o desoladora no meio de tanta garridice e policromia de tons da paisagem e do traje das raparigas.
Muitas vezes tenho contemplado entristecido este pormenor da paisagem e da vida da gente das margens do rio Lima e perguntado a mim próprio se não há quem veja aquilo e se para o caso se não encontrará remédio.
Tendo exposto a alguém o meu sentir em conversa de minhoto que mais ama a sua pátria através da região em que nasceu, vim a saber que já há estudos feitos sobre o aproveitamento total do rio Lima, de que resultará, com outras vantagens, não só o desaparecimento do espectáculo desolador que entristece o turista, mas ainda o melhoramento da barra de Viana do Castelo, a rega e o enxugo do muitas terras marginais e o aproveitamento hidroeléctrico do rio.
De facto, vêm de longe os estudos sobre o assunto, que é hoje de mais importância e de mais urgência na solução, dado que na sua parte inferior se agravam cada