DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 120 400
(...) conhecida como a planta forrageira por excelência das regiões meridionais, das atmosferas quentes, capaz de suportar melhor as sequeiras do que as outras leguminosas (trevos, sanfenos, etc.), resistindo bem aos frios depois de enraizada e mantendo-se na terra vários anos -quatro, cinco ou seis- em boa produção.
Seja-me permitido recordar que um luzernal de seis anos, produzindo anualmente 6000 kg de feno por hectare, pode deixar no solo mais de 400 kg de azoto, graças ao privilégio do bacilus radicicola em o absorver do ar e fixá-lo na raiz dos leguminosos, onde se multiplica em feliz simbiose.
O enriquecimento do solo em azoto é de tal ordem que, logo a seguir a um luzernal, se recomenda uma cultura esgotante, como o milho, por exemplo, em vez do trigo, que então correria o risco de acamar, por demasiado viçoso.
Nunca percebi, digo, porque não tem sido maior a expansão de tal planta, credora dos maiores serviços prestados à lavoura em muitos países progressivos, tanto mais que os ensaios oficiais têm demonstrado a sua adaptação aos nossos terrenos dispondo de um pH adequado.
Sr. Presidente: não me quero alongar mais sobre o assunto, pois já disse o necessário para manifestar a minha convicção de que, neste país aquecido pelo sol, quem dispuser de água pode obter boas produções forrageiras, aumentar a capitação dos gados e da carne, para melhor alimento dos Portugueses. E neste capítulo ouso ainda formular o voto de que o façamos, de preferência, com as nossas possibilidades continentais, na previsão prudente de situações de emergência, tanto mais que outras partes do nosso império, sobretudo os Açores, possuem condições óptimas para concorrerem nos mercados mundiais.
Outro aspecto desejo focar, ou seja o manifestado pela possível utilização dos excedentes do milho continental no sustento do gado fornecido à produção, depois de desnaturado, com um bónus equivalente ao prejuízo que a Federação dos Produtores de Trigo terá de suportar se voltar a recorrer à exportação, pois que assim será transformado em carne obtida a menor preço do que a importada, com a manifesta vantagem de mantermos e multiplicarmos o nosso potencial de gados.
Haverá economia de cambiais exportando milho com prejuízo e importando carne com prejuízo?
Finalmente, também me quero referir aos pequenos matadouros existentes em muitos municípios e que se sentem condenados à morte, em obediência a uma possível industrialização dos matadouros que implicaria a sua concentração ou redução a um pequeno número, única forma de utilizar economicamente os seus resíduos (sangue, sebo, pêlos, ossos, peças reprovadas, etc.).
Não defendo o Estado comerciante ou industrial - e o mesmo direi das câmaras-, mas não posso esquecer que a estas cumpre, sem mira de lucros, velar pelo bem-estar e, portanto, pelo conveniente abastecimento das respectivas populações.
Ora, os pequenos centros sentem que, uma vez privados da regalia dos seus matadouros e canalizado todo o gado regional para os das grandes cidades, ficariam na contingência de comer a carne que estes lhes quisessem ceder, correriam o risco de ter de ir à cidade ou para a cidade quando quisessem comer um bife!
Eu sei que vista a questão num plano nacional, nos devemos sacrificar em ordem ao bem comum; mas, não havendo carne, como até aqui. Como se passariam então as coisas na prática?
A propósito direi quanto surpreende que volvidos mais de dez anos sobre a última guerra, mercê de faltas postas em foco por este aviso prévio ou mercê de se não haverem tomado medidas ora julgadas salutares, estejamos ainda a submeter os concelhos rurais, mesmo os auto-abastecidos, a uma redução de matanças, para que a carne não falte nos grandes centros, destruindo assim a compensação ou o pequeno regalo a que poderia aspirar quem teima em viver no campo: comer a hortaliça da sua horta, a fruta dos seus pomares, as aves da sua capoeira e a carne do gado que por lá se cria com tanto suor!
Em tempo de guerra, Sr. Presidente, os homens das aldeias estão prontos a todos os sacrifícios, a sacrificar até a sua própria vida; mas, volvidos dez anos, será por acaso ainda necessário que tenham de se privar daquilo que podia ser importado oportunamente, para abastecimento do País e até servir de moeda de troca das sobras da produção nacional? Lastimável é que assim tenha de ser, Sr. Presidente.
Será também necessário estabelecer tabelas, fixando grandes diferenças de preços entre os que vigoram nos meios rurais e nos grandes centros de consumo, para que nos primeiros -os rurais- já não seja possível manter os preços oficiais sem risco de escoar-se toda a carne para os segundos - os urbanos -, aliás em regime de candonga?
Não será possível criar condições de trabalho sem obrigar os que pretendem viver honestamente a praticar desvios da lei?
«Onde não há pão todos ralham sem razão».
E onde não há carne?
Haverá que importá-la ou alimentar mais gado, com vista a obtermos aquele «um tudo-nada mais do que o necessário».
Entretanto, obedeçamos ao sábio incitamento: «A regar! A regar!».
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Nunes Mexia: - Sr. Presidente: ao subir de novo a esta tribuna para encerrar o debate do aviso prévio sobre o problema do abastecimento de carnes e seus derivados, quero começar por agradecer a comparticipação valiosa, o brilho e a elevação que lhe vieram dar os ilustres Deputados, e tantos foram, que na sua discussão intervieram, predicados que me faltavam, muito por defeito próprio e pela obrigação de me cingir à crueza das realidades.
As referências que lhe foram feitas, a concordância, bem manifestada por todos, quanto às suas linhas gerais, tudo levo à consideração, que muito me desvanece, de que ele foi oportuno, objectivo e construtivo, como convinha.
Sinto assim bem facilitada a minha tarefa neste momento, visto que, não se tendo posto uma discordância de fundo, tenho apenas que registar que fica de pé uma acção comum de todos nós, pois para a qual cada um trouxe um elemento de complemento, uma observação mais detalhada de um ou outro pormenor, um esclarecimento de possibilidades e até mesmo o esboçar de planos de trabalho para uma solução que se impõe.
Não pensava, assim, referir-me, em especial, a qualquer das intervenções. Tenho, porém, de abrir uma excepção.
É que, tendo o Sr. Deputado Águedo de Oliveira invocado o nome de meu pai, em preito de consideração à sua memória, como pessoa que soube ser útil, em toda a extensão do significado da palavra, e ainda como colaborador sincero do Sr. Presidente do Conselho, nas horas difíceis e incertas do início da sua obra, eu não podia deixar de lhe agradecer esse preito de conside-(...)