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630 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 133

Entretanto os produtores de leite e de manteiga continuam em crise. Era fatal que isto acontecesse. Nenhum mérito tive no prevê-lo, há mais de dois anos, nesta Assembleia.
Na melhor das intenções, quiseram fazer-nos felizes u força, e aqui estamos, graças ao dirigismo mui conduzido, mais infelizes do que éramos.
Talvez seja viável, em nações ricas, que o Governo continue a comprar e armazenar os excedentes de produção. Estou desconfiado de que, com o andar dos anos, este processo democrático de aquisição de votos acabará por se tornar ruinoso e impraticável. Deus nos livre de vê-lo implantado em Portugal.
Pode aceitar-se, como medida excepcional, a cumpra e imobilização dos excedentes, pelos organismos próprios da lavoura ou da indústria, com financiamentos bancários ou oficiais, quando se preveja colocação em futuro próximo. Não é sistema capaz de resolver crises de abundância permanente. Pelo contrário, tende a agravar a sobreprodução enquanto se mantiverem preços remuneradores.
É muito mais fácil realizar dirigismo económico no comércio ou na indústria que na agricultura. Não necessito explicar porquê. Mas, em todos os casos, como muito bem acentuou aqui o nosso distinto colega engenheiro Camilo Mendonça, o dirigismo económico só deve ser exercido em alto nível, na generalidade, na orientação superior e nunca nos pormenores. Acrescentarei, como corolário, que convém ser tanto quanto possível indirecto e maleável.
No sector do comércio externo, são exemplos clássicos de dirigismo em alto nível, exercido de fornia indirecta, as quebras de valor da moeda nacional, voluntárias ou consentidas, como fórmula de redução de déficit das balanças de pagamentos, isto é, para fomento de exportações e de turismo e para redução de importações.
É exemplo de dirigismo em alto nível, mas directo, a proibição pura e simples de importações ou de exportações, de que tanto se tem usado e até abusado entre nós.
Frequentemente, queixamo-nos da perda de mercados estrangeiros que outrora adquiriam produtos nossos. E queixamo-nos também, com justiça, de termos u nossa exportação metropolitana e ultramarina concentrada sobre número escasso de produtos tradicionais - vinhos licorosos, conservas, cortiça, cacau, café, etc.-, quando deveríamos multiplicar o número de produtos exportáveis, a fim de dividirmos melhor os riscos naturais do comércio externo.
Ora, na verdade, por medidas de dirigismo directo e de pormenor, perdemos totalmente os mercados estrangeiros compradores de primores agrícolas e já não possuímos organização comercial para os readquirir. Nem valerá a pena ressuscitá-la se, ao mais pequeno prenúncio de carência no mercado metropolitano, surgirem as proibições de exportação.
A Grã-Bretanha, depois da última guerra, adoptou processo inverso: quer o Governo Trabalhista, quero Conservador, para reconquistarem os mercados fizeram exportar para o estrangeiro, durante anos, produtos que ficavam faltando, total ou parcialmente, ao consumo interno.
A opinião pública britânica aceitou corajosamente as privações consequentes, porque, depois de ganha a guerra militar, era preciso vencer a batalha económica. Aqui, em Portugal, a mentalidade é outra: continua, infelizmente, aquela que o Prof. Armando Marques Guedes definia magistralmente em frase lapidar: «Vida barata e algibeira vazia».
Se os ovos sobem dez tostões em dúzia, por efeito da exportação para Espanha, logo a fiscalização intervém para impedi-la. Se o café, que agora abunda no Mundo, viaja para o país vizinho, logo surge um complicado mecanismo que dificulta a exportação e obriga as populações dos concelhos fronteiriços a só poderem adquirir café moído, com mais grão e cevada que café.
Matou-se a produção de batata para exportação na Moita e arredores. Chegou-se, num ano que parecia de falta de fruta, a proibir a exportação de melões, e estes acabaram por ser vendidos aqui mais baratos que as abóboras para consumo de porcos. Lembro-me de ter comprado algumas camionetas a tostão o quilo.
E o que tem sucedido com o azeite português, até mesmo para os mercados ultramarinos e do Brasil?
Conclusão deste capítulo: há que criar espírito comercial, tanto nos governantes da economia como nos governados.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Para reduzir ou eliminar o deficit da balança comercial aconselhasse a realização de operações de compensação. Esta formula surgiu, como se fosse novidade, em consequência da última guerra e deu origem ao aparecimento de uma fauna especial de traficantes internacionais com maiores ou menores aparentamentos políticos. Trata-se, afinal, do sistema primitivo do toma lá dá cá, usado nos tempos em que o dinheiro ainda não estava inventado.
Admita-se, como inevitável ou quase inevitável, nas relações comerciais com países para além da «cortina de ferro». O facto de, fora dessa zona, havermos realizado algumas transacções deste género não deve animar-nos a dar-lhes foros de sistema sempre vantajoso e corrente. A compensação directa não passa de mero expediente ocasional.
Anuncia-se agora como quase concluída uma operação deste tipo entre Portugal e a República das Filipinas, mercê da qual exportaremos entre 14 000 t e 20 000 t de arroz, em troca de quantidade igual de açúcar filipino.
Como medida de emergência para escoamento momentâneo de excedentes, parece, bem. Sob o ponto do vista de encargos não possuo elementos que me permitam pronunciar-me. Mas os orizicultores não podem basear o seu futuro em esperanças de continuidade de compensações. Está sucedendo na cultura do arroz o que acontece em muitos sectores da vida económica nacional.
Os preços acham-se estabelecidos de fornia a assegurarem algum lucro aos agricultores menos favorecidos pelas condições regionais. Portanto, garantem remuneração superior aos das regiões onde a produção é mais económica.
Se se reduzir o preço do arroz, impede-se o cultivo em grandes áreas do Centro do País, onde sai mais caro, e criam-se dificuldades graves aos agricultores respectivos.
Se não baixa o preço do arroz, continuará a sobreprodução e cria-se outro problema que inquietará permanentemente os governantes e os governos.
Há que escolher entre dois males, mas torna-se preciso escolher enquanto é tempo. Racionalmente, as regras de produtividade conduziriam à baixa de preço. Social e politicamente, há que evitar a ruína dos orizicultores da Beira Litoral, onde a crise agrícola é neste momento mais acentuada que noutras regiões.
Entretanto, não desanimemos em relação ao aproveitamento das grandes obras de irrigação concluídas ou em curso. Hão-de ser úteis. Hão-de constituir título de glória do Estado Novo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!