23 DE MARÇO DE 1956 631
O Orador: - Simplesmente, por agora, tal qual já sucedeu noutros países que as realizaram antes de nós, encontramo-nos no período de transição ou de adaptação, que é uma espécie de parto doloroso. Mas sem rato nem gato.
Terminando o comentário ao sistema de coordenação que seria preciso impor para generalizar a prática, de compensações, acrescentarei ainda o seguinte: estas operações são, por si próprias, inevitavelmente mais demoradas que as transacções correntes. Em vez de um só comprador e um único vendedor, exigem, pelo menos, dois compradores e dois vendedores, além dos intermediários habilidosos que aparecem pelo meio.
Se às demoras próprias juntássemos as provenientes da intervenção ou coordenação oficial, destinada a obter o comprador e o vendedor adicionais, indicados pelos Governos, complicaríamos ainda mais a transacção, atrasaríamos as decisões e talvez acabássemos por perder oportunidades.
Suponhamos o caso citado de uma grande, barragem. Em geral os equipamentos adquirem-se, não num único país, mas em diversos. E dentro de cada país compram-se a vários fornecedores. Numa compra normal, só é indispensável coordenar os prazos de entrega das fracções encomendadas, de forma que o atraso de um fornecedor não provoque o retardamento geral da colocação em marcha do empreendimento, juntando-se a isto a complicação dos entendimentos com cada país e cada fornecedor acerca de pagamentos em mercadoria, conclui-se pela inviabilidade do sistema.
Além disso, em muitos casos os equipamentos são pagáveis em prestações, a prazos que atingem anos. Como conciliá-los com troca de produtos? Que organismo especial haveria que criar ou aproveitar para o efeito?
Por último, em regime, do compensação os equipamentos sairiam mais caros, fariam aumentar os encargos de 1.º estabelecimento e o custo de produção. Porquê? Porque, em operações deste género, Portugal achar-se-á sempre, inevitavelmente, em condições de inferioridade em relação aos países vendedores das máquinas e acessórios. Nós precisamos desses equipamentos; eles não precisam dos nossos produtos.
Para que no-los comprem teremos de aceitar, explícita ou veladamente, o encarecimento daquilo que nos vendem.
No decorrer do debate ouvi oradores infinitamente mais categorizados do que eu preconizarem a criação ou elevação de taxas sobre vinhos na zona da Junta Nacional, a queima dos vinhos de várzea, a ressurreição do Ministério da Agricultura ou a instalação em plano infraministerial, de um novo órgão coordenador das actividades agrícolas.
Quanto a organismos novos, já opinei pela negativa, porque quantos mais forem mais dificultam e demoram a coordenação. Quanto aos vinhos de várzea, já escutámos as vozes dos Deputados do Ribatejo a demonstrarem que, quantitativamente, são muito menos do que o vulgo supõe. E quanto às taxas, não compreendo como possam suportá-las, produtos francamente desvalorizados e já, talvez, excessivamente onerados.
O Sr. Proença Duarte: - Mas os vinhos de várzea também suportam taxas porque a Junta Nacional do Vinho vive precisamente das taxas que os retalhistas cobram sobre cada litro de vinho, à custa da produção.
O Orador: - O orador a que me estava referindo falou sobre a necessidade de imobilização dos vinhos de várzea, a fim de declinar esses vinhos exclusivamente à queima para aguardente.
O Sr. Melo Machado: - O que era preciso era consumir a aguardente em excesso que já se acha imobilizada, sem necessidade de novas imobilizações.
O Orador: - Permito-me não acreditar na eficiência das taxas como remédio para a crise vinícola, a não ser que lhes acrescentemos um d e um a ...
Entretanto, consolemo-nos com a notícia de que vai ser autorizada a instalação de uma nova fábrica de cerveja ...
Para terminar a ideia mestra do aviso prévio do ilustre deputado Melo Machado é melhorar o nível de vida da população portuguesa, em especial do trabalhador braçal agrícola, que está sendo, normalmente, o pior remunerado entre todos os operários. É indiscutível que, se lhe aumentarmos o poder de compra, crescerá o consumo de géneros agrícolas e industriais, o que permitirá desenvolver a produção.
Todos sabemos que existe diferença fundamental entre «aumento do poder de compra» e «aumento de salários».
De nada serve elevar salários se por efeito de agravamento de custo de produção, ou em consequência de fenómenos inflativos, os preços de venda subirem na mesma escala.
Foi aqui citado o exemplo revolucionário de Henrique Ford I, a que será justo acrescentar outra citação: a do actual esforço reformador de seu neto. Henrique Ford II.
Em princípio, advogo sistemàticamente o aumento de salários e vencimentos como forma de desenvolver a produção. Mas há necessidade de distinguir entre as possibilidades das industrias fortemente mecanizadas o as doutras indústrias, como as agrícolas, que empregam volume grande de trabalho manual.
Entretanto, se estudarmos com olhos de ver a influência dos salários nos custos de produção, concluiremos que, como regra geral, à elevação dos salários corresponde elevação relativamente menor dos preços de venda e, por consequência, melhoria geral do poder de compra.
Portanto, no mercado interno nenhum inconveniente aparece à primeira vista. Mas como fomentar a exportação se elevarmos os preços?
A pequenez do mercado lusitano força-nos a trabalho escravo em favor do estrangeiro. Por mais duro que seja confessá-lo, o problema não pode obter solução rápida. Mas gradualmente, talvez me«mo em progressão constante, atingiremos o objectivo comum de elevação do poder de comprar e do nível de vida graças à instalação de fontes de energia e de indústrias novas bem apetrechadas.
Algumas, como a de azotados, promoverão directa e indirectamente, pela redução dos preços actuais de vida, rendimento melhor na agricultura. Todas absorverão braços e obrigarão a elevar salários até aos trabalhadores da terra.
Mas então os empresários agrícolas já poderão suportar esse acréscimo de encargos, por estar compensado, quer pela redução doutras despesas, quer pela mecanização provocada pela falta de trabalhadores, quer ainda pela maior produtividade das empresas.
Atingiremos com segurança o nosso objectivo se não nus preocuparmos com críticas demagógicas. Não aceitemos como verdadeira a divergência de interesses entre produtores e consumidores. Condenemo-la como mentira económica.
Todos os homens que trabalham são produtores. E, como tal, pelo aumento voluntário ou involuntário da produtividade própria, e até indirectamente, pelo acréscimo dos rendimentos alheios, conseguirão realmente ganhar mais poupar mais e consumir mais, melhorando assim as condições de vida das famílias a