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11 DE ABRIL DE 1956 763

A proposta é clara no que respeita a essa concentração, pois ali se diz que virá a ser o Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, pelos seus serviços de turismo, que exercerá essa função de comando, orientação e coordenação.
É sabido que o turismo envolve problemas de ordem geral e local.
Quanto aos primeiros, impõe-se que os planos sejam organizados por entidade de escalão nacional, que é o caso do Secretariado.
Quanto aos segundos - os problemas de ordem local -, não podem nem devem ser excessivamente embaraçados pela entidade centralizadora, coarctando-se a iniciativa e a actuação das entidades locais, que melhor do que ninguém conhecem o seu meio e as suas necessidades.
Muitos e graves inconvenientes se têm verificado na vigência das actuais leis e regulamentos de feição dirigista.
Alguns exemplos denunciam o perigo da excessiva intromissão da entidade centralizadora.
Certa câmara municipal pretendeu publicar plaquettes de propaganda da sua região. Um artista local fez gratuitamente o projecto, com as legendas de um conhecido escritor. Os serviços de turismo do Secretariado rejeitaram o projecto e indicaram artista da sua confiança. Simplesmente, esse indicado artista exigia 8 contos pelo trabalho.
Outra câmara editou há um ano prospectos de propaganda, tipo de guia de via reduzida para orientação dos visitantes.
Foi uma discussão difícil entre a comissão de turismo interessada e o Secretariado, porque este impunha e impôs o tipo de papel, o formato das plaquettes, a disposição das gravuras e até a cor da tinta.
Outra câmara ainda quis publicar um cartaz anunciador de certa exposição. Também tinha projecto gratuito de artista local de envergadura. Pois não foi aprovado, e em troca recebeu e pagou cartazes, enviados de Lisboa, que não mereceram, pela sua fealdade, ser publicados e foram lançados no cesto dos papéis.
Porque será que a propaganda local por plaquettes e cartazes não poderá ser executada por artistas locais, que generosamente oferecem os seus trabalhos?
Será necessário que esses elementos de propaganda vistam uniforme ou sejam executados em espécie de monopólio?
O que é preciso é fazer e intensificar a propaganda local, em moldes convenientes, é certo, mas até lucram se forem expressivos e originais.
Publica-se em Évora, desde 1943, o boletim A Cidade de Évora, órgão da comissão municipal de turismo, exclusivamente de assuntos eborenses, com vista à valorização e melhor conhecimento do seu património artístico e histórico. Nele têm colaborado nomes de alto valor nacional.
O próprio actual ilustre Ministro da Presidência considerou em carta enviada à Câmara o referido boletim uma publicação de excepcional valor literário e regionalista.
Realmente o boletim A Cidade de Évora é uma autêntica continuação dos Estudos Eborenses, de Gabriel Pereira.
Que se saberia dos monumentos de Évora e da sua história se não tivessem surgido os trabalhos de André de Resende, dos irmãos Estaços, dos. padres Fialho e Fonseca, do cónego Severino de Faria e, nos tempos mais modernos, de Alexandre Herculano, Gabriel Pereira, Filipe Simões, António Barata, Câmara Manuel, Celestino David e Queirós Veloso ?
Pois bem. Tem sido uma luta ingrata para a comissão de turismo manter essa erudita publicação, porque o Secretariado tem sistematicamente reprovado a verba
orçamental que lhe serve de base e tentado fazer substituí-la por outra de tipo espectacular, mas de fundo «sobre o joelho».
Ora, est modus in rebus.
Se as publicações que o Secretariado edita merecem louvor pela propaganda genérica, que é e deve ser da sua alçada, um boletim como A Cidade de Évora, o de Beja, Porto e outras localidades não devem ser perseguidos como indesejáveis, porquanto a sua missão é a da valorização dos patrimónios locais, com vista a estudiosos e a turistas.
Demais, sabe-se que o turismo em Évora não é de belas paisagens, mas de panorama e, essencialmente, de arte, arqueologia e história.
Évora, a cidade de Portugal mais rica em monumentos e uma das mais típicas e pitorescas da península; Évora, que é verdadeira acrópole de Portugal, tem naturalmente de adoptar e seguir um método de propaganda sui generis, diferente daquele que é frutuoso e lógico para a Costa do Sol, Sintra e tantas zonas de altíssimo valor paisagístico.
Portanto, o Secretariado que se encarregue da propaganda genérica interna e internacional e deixe, embora com discreta e moderada fiscalização, às localidades a iniciativa da sua valorização e propaganda.
De resto, quem conhece os cantos da casa é quem a habita. A quilómetros de distância é difícil conhecer e sentir os locais, e mais difícil ainda é sentir os anseios das populações interessadas.
A experiência tem demonstrado que também na direcção da propaganda turística tem tido aplicação o velho provérbio: «Longe da vista, longe do coração».
Assim, vejamos um exemplo: o Secretariado tem publicado em edições sucessivas blocos de lindos selos reclamativos de monumentos e paisagens. Curioso e eficaz meio de propaganda, que só merece louvores. Simplesmente nem um só selo, que eu saiba, se refere ao Alentejo ou ao Algarve.

O Sr. Alberto Cruz: - O Minho também não existe para o turismo.

O Orador: - O receio de esquecimento futuro dos interesses do Sul do Tejo será pura alergia sem causa?
Vou contar a VV. Ex.ªs um caso espantoso ocorrido em Évora: na vigência da actual Câmara Municipal, foi a essa cidade um inspector do Secretariado -portanto funcionário da mais alta categoria - e esse funcionário teve uma entrevista com o presidente da referida Câmara no sentido de animar o turismo local e de apresentar as suas sugestões. Pois bem, a certa altura esse Sr. Inspector do Secretariado disse, duma forma insinuante e premente, que não se compreendia que, sendo Évora uma cidade daquela importância, não tivesse um jardim público, uma mata para animar não só a vida citadina, mas ainda para regozijo e repouso dos turistas que visitassem a cidade.
Ora, Évora possui um dos mais lindos jardins de Portugal, e seria até o mais belo do nosso país se o ciclone de 1941 não tivesse derrubado muitas das suas mais valiosas espécies.
A calma do presidente da Câmara não pôde ir mais além e disse, indicando a porta de saída do gabinete: «Sr. Inspector: saia, alugue um taxi e ao fundo da Rua do Paço encontrará um gradeamento; entre e então verá se Évora tem ainda de construir o seu jardim».
Isto significa qualquer coisa de importante, não contra o organismo, mas contra a selecção do funcionalismo responsável, que assim é mandado à deriva.
Oxalá que o futuro cure essa alergia e cimente a confiança.