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18 DE JULHO DE 1956 1357

A consciência corporativa desenvolver-se-á no sentido da solidariedade dos interesses.
Portanto, ficou estabelecida a protecção geral dos interesses do consumidor, pelo lado do poder comprador que lhes é atribuído, no mercado do trabalho.
Mas não fica prevista nem defendida nos casos de desvio, monopólio, luta intercorporativa, hermenêutica tendencial s nas relações para além dos assalariados, casos estes em que o Governo terá de dizer a última palavra ou uma (representação e fiscalização adequadas venham a funcionar para mais completa realização de princípios.
A primeira orientação -de que o problema não existe e a realização do corporativismo conduzirá, por si só, à harmonização automática de todos os interesses em jogo- assenta numa concepção quimérica.
Segundo ela, o problema não existe. O consumidor é todo o mundo e não é ninguém.
Na economia só há uma realidade viva e apreciável: o produtor -medalha esta com anverso e reverso-, que também é consumidor. E, portanto, organizar integralmente a produção significa organizar, sem dar por isso, o consumo. Defender o produtor implicitamente conduz a respeitar o seu duplo.
Vejamos mais de perto:
A corporação, ao subordinar o consumidor, pode não levar em linha de conta as suas faltas e fraquezas, ignorar as suas reivindicações, não considerar que a sua posição contraria a do homem na produção.
Aquela concepção de harmonização automática não tem em conta a célula fundamental, a realidade viva, o cimento social da família.
Quando S. S. o Papa Leão XIII lembrava os deveres dos ricos e dos patrões, o direito a um salário conveniente, o aliviamento da miséria, mandava cuidar de todas as classes de cidadãos e, sobretudo, dizia que o Estado teria de proteger de modo especial os fracos e indigentes e lutava ainda pelo salário justo, ao considerar que a natureza humana propende para os seus interesses, descurando os outros, fazia a mais eminente, a mais formosa, a mais justa defesa da família como unidade social e de consumo que convém acautelar e proteger.
Reconhecia, com alguns pensadores corporativos, que os seus problemas suo reais e destacados e não podem ser deixados ao abandono e à indecisão.
Ao lutar-se pelo preço justo combatiam-se as propensões e tendências para os preços monopolistas, excedentes, especulativos - injustos!
A intervenção acidental e esporádica de quem consome, embora não integrando categoria, revelava vulnerabilidade, que a ordem natural não corrigia.
Se estamos interessados em que o bem comum da sociedade e das famílias prepondere, seja qual for a construção social a empreender, teremos de prevenir e corrigir de harmonia com as lições seculares - e não abandonar o campo onde alguns podem pretender posições de benefício e monopólio.
A segunda solução, por ser importante, na ordem teórica, dada pela associação das cooperativas à construção do corporativismo, como que ajudando a completar o sistema.
Sem embargo de o livro, já invocado, de Manoilesco estar desapontado no tempo e se ajustar a uma concepção totalitária e descapitalizadora, começarei por ela.
Segundo o escritor do século do corporativismo, não há incompatibilidade entre os dois grandes sistemas - o das corporações e o das cooperativas -, porque ambos, a seu modo, procuram realizar a ideia de solidariedade económica, possuem virtualidade e tendem por igual para a eliminação do capital.

Mais até: como iniciativa relevante e realização dos interesses gerais, o corporativismo deve encorajar e ajudar o movimento cooperativo.
Sabemos que a cooperativa de consumo age por uma compra e fornecimentos pelo mais baixo preço, elimina o lucro comercial, obtém ainda vantagens especiais.
Realmente, é verdade que não existe incompatibilidade de princípio, nem de táctica, entre os dois sistemas.
Nos grémios de lavoura, nas Casas do Povo e nas Casas dos Pescadores funcionam autênticas cooperativas de consumo, cuja utilidade não pode discutir-se. Funcionam bem.
Há, porém, que discutir entre o enquadramento, de que dei exemplos, e a simples combinação harmónica e dois sistemas, no fundo distanciados, mas em que um e outro também se empenham em realizar uma única construção social.
Já em tempos mostrei que o nosso cooperativismo tinha a sua história desprestigiante e não autorizava na experiência portuguesa grandes esperanças. Há no Diário do Governo e no Tribunal de Contas documentação sobre o seu fracasso.
Mas os tempos são outros e o espírito que hoje anima as instituições públicas é diferente -o que nem todos reconhecem sem custo-, e é bem possível fundar outras esperanças na associação racional e cuidadosa dos dois sistemas.
Ë necessário decidir, porém, entre enquadramento e instituição de um sistema combinado, como era a instituição particular L'Ente Nazionale della Coope-razione em Itália.
Terceira solução - a do Governo.
E o Estado?
O Estado já ostenta uma posição de supremo árbitro no conjunto, dispõe de órgãos apropriados -os de coordenação, a Intendência, o fisco, etc.-, e conhece quando e como, fiscalizando, deverá no momento próprio intervir.
Mas se, pelos seus órgãos e agentes, intervier ou fiscalizar pesadamente, ele virá a atacar a índole do sistema, que reside na espontaneidade e voluntariedade doa corpos e associações, mais ou menos autónomos.
Quando muito, reconhece-se que ponha o seu veto às decisões insociais ou excessivas, porque só superiormente lhe incumbe fazer frente ao parasitismo e obter, em vez de um mercado favorável, o salário mais elevado como poder de consumo.
Uma final solução aparece nos escritores da especialidade, menos rigorista, menos fundada, menos plausível - a da corporação do consumo.
Esta não tem defesa teórica; a atitude acidental não traduz categoria.
A intervenção esporádica e contratual não assegura representação.
O consumidor, em certa maneira, tem de ser deixado a si mesmo.
Quem pode impedi-lo de pagar mais se quiser, se escolher e calcular de forma diversa do seu vizinho ?
Ele é inenquadrável.
Não pode com ele formar-se uma corporação.
Portanto, o problema existe nos factos, nos desvios, nas tendências, no gosto pelas vantagens particulares, na ausência de impecabilidade, e não se deve fugir a ele.
Convém associar as cooperativas ao corporativismo, mas reconhecendo que este é o material de construção primordial.
Não devemos iludir-nos sobre a harmonização automática dos interesses no regime que vem aí.
O Estado não deve abandonar o campo, mas não pode ser intrometido.