146 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 173
Tudo o que pode imaginar-se de sentimentos expressivos pelas felizes notícias se pôde verificar na compacta multidão que desfilou até à Câmara Municipal, em ondas de espontâneo e irreprimível entusiasmo. Não resta dúvida de que a notícia do início das obras do porto dava a força mais vibrante ao testemunho popular, o que é compreensível, dado que o porto da Figueira, não só traz benefícios incalculáveis para aquela cidade, mas a torna chave de progresso e desenvolvimento das Beiras, traduzindo aspirações seculares do Centro do País.
Como Deputado pelo ciclo de Coimbra, associo-me, neste momento e neste lugar, às manifestações de aplauso tributadas ao Governo, e em particular ao Sr. Presidente do Conselho.
Quando da discussão do plano rodoviário, em Março de 1954, chamei a atenção do Governo para as estradas que servem a Figueira da Foz.
Com o inicio das obras do porto o problema torna-se agora, candente.
Com efeito, e em primeiro lugar, todo o atraso na solução ocasionará grandes aumentos de desposa com as expropriações, por motivos que vou expor.
O porto da Figueira, consoante o plano das obras, estender-se-á para leste, até à Beira da Fontela.
Isto implica o recuo da ponte actualmente existente no braço norte do Mondego, mima extensão de cerca de 1 km, até à futura estação portuária, por alturas da Fontela.
A ponte actual é estreita, baixa, muito pouco resistente, constituindo um obstáculo à navegação portuária.
Com a demolição da ponte, no decurso das obras, do porto, ficará interrompida a ligação do Norte com o Sul do País, s vice-versa, e também a ligação das Beiras, por Coimbra-Figueira, com o Sul.
Ora, o recuo da ponte do braço norte implica a necessidade do desvio da estrada n.º 109, que passa pela actual ponte, com outro trajecto em direcção à Brenha, e, além disso, um desvio da estrada de Coimbra (estrada n.º 111), a partir de ou nas proximidades de Maiorca, ao encontro da futura ponte. Estas novas direcções das estradas n.ºs 109 e 111 darão lugar a expropriações numa extensão linear de mais de uma dezena de quilómetros.
Desde que as obras do porto comecem a delinear-se, logo a Figueira comercial e industrial iniciará um movimento para leste, ficando a parte oeste da cidade logicamente destinada às construções próprias para praia e estância de turismo.
Mas este deslocamento comercial e industrial para leste virá a, efectuar-se com construções que tornarão os terrenos da área da Fontela, bem como para o norte, em direcção à Brenha, muito mais caros.
Penso, por isso, que deveriam efectuar-se imediatamente os desvios das estradas n.ºs 109 e 111 para a futura ponte, de modo que esta esteja concluída antes da inevitável demolição da ponte actual, resultante das obras do porto.
Neste entroncamento rodoviário da futura ponte deve ficar a estação comercial do porto, donde deve também partir uma estrada marginal para a cidade-praia, de que também falei neste lugar quando da discussão do plano rodoviário.
Esta estrada marginal seguiria pela Avenida de Saraiva de Carvalho, passaria na actual doca, prosseguindo junto ao mar, pela Esplanada Salazar, continuando sempre pela orla marítima, atingindo Buarcos e depois o início do ramal para o farol.
No arquivo da Câmara Municipal da Figueira da Foz encontra-se um projecto do engenheiro Eduardo Augusto Xavier da Cunha, com data de 25 de Julho de 1914, da construção duma avenida marginal entre o quebra-mar (próximo do Forte de Santa Catarina) e os baluartes de Buarcos. Esta avenida teria 36 m de largura (portaria de 27 de Junho de 1916, publicada no Diário do Governo n.º 153, 2.ª série, de 1 de Julho de 1916).
A avenida marginal, como se vê, é ideia que vive há muito tempo, mas ainda não foi efectivada. O malogrado Ministro Duarte Pacheco andava muito interessado por ela, mas, infelizmente, a sua morte veio atrasar a realização deste imperioso melhoramento turístico.
Esta estrada turística, partindo da futura estação comercial da Figueira da Foz, seguirá marginal em relação no Mondego, ou antes, ao futuro porto, indo depois pela orla marítima, passando em Buarcos, onde o que se vê agora é além de desagradável, sujo, inestético, mesquinho, incómodo e até constrangedor.
Se a estrada turística seguisse até à Murtinheira, indo depois a Quiaios e às Lagoas, para atingir a estrada n.º 109 em Cova de Serpa, teríamos um dos trajectos turísticos mais impressionantes de Portugal.
Quem se der ao trabalho de calcorrear o córrego que serve de ligação à Murtinheira, e que é um caminho público desde o farol novo à Murtinheira, poderá por vezes irritar-se com um ou outro tropeção nos pedregulho desta via tristemente abandonada, mas tudo esquecerá perante a paisagem dura e grandiosa, testemunho de uma grande convulsão geológica, caprichosa nos seus recortes, mais solene que o Poço do Inferno, na serra da Estrela, com o mar em baixo e por cima as estratificações do xisto e do calcário, desafiando as leis da gravidade, em especial no vale de Enforca-Cães, ante de se dobrar o cabo.
E quando se passa para além do cabo estende-se, a perder de vista, o areal até Mira, até Aveiro, numa mudança brusca de panorama, verdadeira transmutação teatral, que só gente embrutecida não terá capacidade para sentir e apreciar em sua impressionante e estranha beleza.
Pois é esta estrada turística que outra vez trago à atenção do Governo, e muito em especial ao estadista sério, grave, ponderado e ilustre que é o Sr. Engenheiro Arantes e Oliveira.
E não quero terminar esta minha intervenção no debate sem lhe agradecer, em nome dos Deputados pelo círculo de Coimbra, a construção, já bastante adiantada, da estrada de Marco dos Pereiros, que tantos benefícios traz à lavoura, ao comércio, à indústria e à camionagem dos concelhos de Coimbra, Miranda do Corvo, Penela, Ansião, Alvaiázere, Figueiró dos Vinhos, Pedrógão Grande e Sertã.
Aqui fica expresso ao Sr. Ministro das Obras Públicas o nosso sincero e vivo bem-haja.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. António Rodrigues: - Sr. Presidente: ao subir a esta tribuna pela primeira vez na presente sessão legislativa, apresento a V. Ex.ª os meus melhores cumprimentes.
Sr. Presidente: não é minha intenção apreciar o equilíbrio financeiro que o Governo nos garante na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o próximo ano, nem tão-pouco os seus propósitos de não agravar os impostos actuais n de impor rigorosa economia na utilização das verbas a todos os serviços do Estado, autónomos ou não, e aos organismos de coordenação económica e corporativa.
É preciso, todavia, registar os factos, não se vá supor estar esquecida a desordem financeira em que vivemos durante longos anos, ou que nenhum mérito se atribui