13 DE DEZEMBRO DE 1956 147
à despesa do contribuinte e ao equilíbrio das contas públicas, em que se baseia toda a nossa obra administrativa lia mais de um quarto de século.
Feita esta simples referência à política fiscal do Governo, devo declarar, desde já, que na sua proposta de lei a minha atenção recaiu, de modo particular, nos investimentos públicos, que se traduzem em melhoria das condições de vida nos aglomerados rurais. Oxalá tenha chegado o momento de se encararem de frente alguns dos seus mais prementes problemas.
Nada mais necessário e mais justo do que olhar-se para a boa gente dos nossos campos, neste momento atenta aos trabalhos desta Assembleia, para verificar até que ponto é conhecida a sua situação aflitiva e como se pretendem satisfazer as suas legítimas aspirações.
Andamos a afirmar, a cada passo, que Portugal é um país agrícola, mas a verdade é que só nos lembramos disso quando os produtos rareiam nos centros urbanos e se torna forçoso importar, desde o trigo às batatas e desde a carne aos lacticínios, que podíamos produzir em abundância. Em períodos normais, em que nada falta, a lavoura regressa ao tradicional esquecimento, deveras impressionante, e os trabalhadores rurais acabam por não encontrar melhor solução para a sua vida, cheia de preocupações e canseiras, do que a fuga para os grandes centros ou para o estrangeiro, em quaisquer condições. Agora, que o Governo manifesta uma especial atenção por importantes problemas da lavoura e aglomerados rurais, não posso deixar de me congratular com o facto e aproveitar o ensejo para fazer algumas considerações a tal respeito.
Sr. Presidente: o aproveitamento hidráulico de bacias hidrográficas figura em primeiro lugar entre as obras de fomento económico a levar a efeito em 1957.
Foram inaugurados vários e importantes aproveitamentos no último decénio, e no próximo ano, com a entrada ao serviço dos de Paradela e Picote, eleva-se consideràvelmente a produção de energia, de interesse vital para as grandes cidades e pequenas aldeias.
Para que assim suceda e a electricidade se não transforme em privilégio de uns tantos, é preciso que aquele aumento de produção não seja apenas canalizado para as zonas de grande consumo, com desprezo total pelas zonas rurais, cujas populações aguardam pacientemente o seu benefício. Também estas precisam de a utilizar, tanto para melhoria do conforto e bem-estar, como para aplicações industriais e agrícolas. A sua distribuição deve, por isso, ser orientada no sentido de uma eficaz protecção das regiões rurais desfavorecidas, através de um regime excepcional que permita, por um lado, obter o equilíbrio económico da exploração e, por outro, promover que as tarifas de venda ao público possam ser estabelecidas em níveis aceitáveis. Foi esta a orientação posta em prática pelo Governo para o Baixo Alentejo e Algarve, pelo Decreto-Lei n.º 39 130, de 9 de Março de 1953. e para o Nordeste do País, pelo Decreto-Lei n.º 40 322, de 19 de Setembro de 1955, por verificar haver ali uma vasta zona em que a rede eléctrica nacional ainda não conseguiu penetrar ou em que essa penetração é demasiadamente limitada e insuficiente.
A meu ver, também só um regime especial de distribuição permitirá que a electricidade seja levada a tantas outras regiões do interior do País, ansiosas por esse benefício, mas que jamais poderão ver satisfeito o seu desejo nas condições actuais, ainda que à custa dos maiores sacrifícios, dadas as exigências das empresas distribuidoras.
Não se pretende que estas façam explorações ruinosas, nem mesmo deficitárias, mas apenas que os seus muitos milhares de contos de lucros líquidos anuais levem algum benefício aos consumidores modestos das suas zonas de concessão. £ preciso acabar com o conceito, de certo modo justificado nos meios rurais, de que as concessões são decretadas para protecção das empresas, e não dos consumidores.
O Sr. Augusto Simões: - Se não são, parece que são! Não há nada mais parecido! E, portanto, a confusão, se existir, é legítima.
O Orador: - Tem V. Ex.ª muita razão. Trata-se de serviços de interesse colectivo, comum a grandes e pequenos consumidores, que o Governo não pode deixar de fazer acautelar.
De contrário, as empresas distribuidoras, com a preocupação única e exclusiva dos saldos de gerência, manterão a sua corrida aos grandes centros, disputando entre si os maiores consumidores, nem sempre com concessão que a tanto as autorize, e continuarão a ignorar os centros de menor consumo. Para estes reservam o direito de conhecer os efeitos da electricidade pelas culturas destruídas, muros derrubados, árvores cortadas e servidões impostas nas suas propriedades com a montagem de linhas e construção de subestações ou postos de transformação.
O Sr. Augusto Simões: - Chego-se até ao cúmulo de algumas povoações próximas das barragens não serem beneficiadas pela energia que essas barragens produzem, nem por qualquer outra, continuando, por isso, às escuras!
O Orador: - E tudo isto, quantas vezes, sem ser paga a devida indemnização pelos prejuízos causados. Ë conhecido o sistema posto em prática pelas empresas: só mandam avaliar aqueles prejuízos no termo das obras, que podem levar longos meses, ou seja quando nos terrenos haja novas culturas, as árvores cortadas tenham sido retiradas, pelo dono ou por estranhos, os muros reconstruídos e as próprias servidões cultivadas. Então, se os proprietários ainda não esqueceram os prejuízos, resta-lhes receber o que for oferecido pelos concessionários, porque a arbitragem facultada por lei, na falta de acordo, já não pode encontrar elementos para a fixação do montante exacto dos danos.
Creio que o meu desejo de ver facilitada a electrificação de pequenos centros está em conformidade com o disposto na Lei n.º 2075, de 21 de Maio de 1955, regulamentada pelo Decreto n.º 40 212, de 30 de Junho do mesmo ano. As comparticipações previstas nestes diplomas durante muito tempo não puderam ser concedidas por dificuldades surgidas na Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, que se revelava inadequada à multiplicidade de funções resultante do incremento da electrificação geral do País.
Depois das alterações introduzidas na organização dos seus serviços pelo Decreto-Lei n.º 40 726, de 9 de Agosto último, é justo que as comparticipações solicitadas pelas câmaras municipais sejam concedidas com urgência e com preferência para as que estejam a suportar encargos de empréstimos contraídos na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência para esse fim.
Depois de concluídos os grandes aproveitamentos hidráulicos, se não for possível fazê-lo simultaneamente, torna-se necessário levar a efeito outros, cuja importância nunca é de mais encarecer.
O aproveitamento do rio Mondego, por exemplo, além da considerável fonte de energia eléctrica que representa, torna-se imperioso para protecção dos campos marginais do próprio rio e seus afluentes, desde as proximidades da Guarda até à Figueira da Foz.
São frequentes e elevados os prejuízos ali causados cheias nas épocas de grandes chuvas e degelo das