520 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 196
cão e mais altos salários, tiver um apoio e um prémio para além das vantagens materiais que a organização lhe acarrete e o Estado deverá respeitar, haverá exemplos que frutificarão em benefício da indiscutível falta e verdadeira mentalidade industrial que é frequente ainda no País; e se tudo se fizer de modo tal que, por novos investimentos, não só mantenha o pessoal fabril ou crie novas possibilidades para alargamento dos seus quadros, haverá que definir formas de especial compensação que o premeie e incentive.
Em contrapartida, será de compreender que o Estado, analisados os casos de per si, crie períodos de transição para qualquer reorganização que se imponha, definindo desde logo qual o sistema que vigorará em futuro mais ou menos próximo e dentro do qual se poderá tornar próspera uma produção reorganizada e cada vez mais difícil aquela que obstinadamente teime em manter-se em situações que não interessam ao País, e a qual, inclusivamente, poderá deixar de ter da parte do condicionamento industrial as protecções de que, a par das aduaneiras, precisa para se poder manter. O Estado deverá reservar - isso sim - a sua capacidade de intervenções directas e determinantes para aqueles casos que se apresentam de tal forma graves que, mais do que atrasando a solução que procuramos, criam problemas que a podem comprometer; devo dizer, aliás, que incluo dentro dessa obrigação a de atender, por suspensão de direitos até, à circunstância lamentável de poder haver, num momento em que tudo se deve aproveitar, quem possua meios ou factores de produção de que não tira, por incapacidade ou por incúria, o proveito que interesse à economia nacional. Afora isso, numa política de aproveitamento integral das nossas possibilidades, deve caber ao Estado neste campo de reorganização da produção muito mais o papel de impulsionador, do condutor, de auxiliador e de coordenador, do que propriamente o de executor. E só assim avançaremos como podemos e se impõe.
As dificuldades serão sem conta, bem o sei, mas só nas dificuldades é que os homens se afirmam, e os políticos também.
Como sei, por outro lado, que esta solução de reorganização e de concentração industriais perturba ainda o espírito de muita gente, para quem o ideal estaria na pulverização industrial, na pequena unidade, quase na indústria caseira, à sombra da qual, aliás, no nosso país se cometem os maiores atentados (apoiados) contra os princípios económicos e sociais do próprio Estado.
É evidente que as grandes concentrações industriais, as grandes unidades, estiveram e estuo, de certo modo ainda, na base de perturbações sociais gravíssimas e podem prestar-se, em muitos casos, mais a servir interesses do que n servir as nações; mas a realidade esta em que temos de viver no mundo, que nos comporta, e a técnica de produção actual não é, de forma alguma, compatível, nas indústrias de particular importância, com processos que estariam mais, de acordo com a nossa forma de sentir tradicional. Forma de sentir, aliás, que temos de rever para mudar, a não ser que queiramos viver tão afastados das possibilidades do presente que paguemos sempre com a pobreza o direito de sermos originais.
De resto, a concentração não exclui a existência de pequenas unidades que podem ajudar a resolver, por exemplo, o gravíssimo problema das chamadas crises rurais; e a forma actualmente mais corrente da energia, que é a electricidade, facilita até certo ponto e em bons moldes económicos a desconcentrarão.
Tudo vai, porém, de definir e de assentar quais as indústrias em que a concentração ou a desconcentrarão se impõe; o se para aquelas as dimensões máximas entre nós possíveis, em consequência da exiguidade do nosso mercado interno, suo hoje ainda muito inferiores às médias que encontramos pelo Mundo a concorrer connosco, ou trabalhamos no máximo da dimensão que pudermos para conseguir o menor agravamento de custo em relação aos outros, ou sacrificamos o sistema por uma disseminação que mais vai encarecer ainda o custo da nossa vida, sem deixar possibilidades de melhor valorizar o trabalho nacional.
O problema das dimensões é um problema devidamente esclarecido hoje em dia no campo da análise de redução dos custos de produção; as suas consequências nocivas -e tudo o que depende da solução dos homens tem de bom e de mau- estão, por seu lado, em grande parte dependentes da própria política económica do Estado.
E só no esquecimento desta indiscutível verdade reside a confusão, tantas vezes frequente, de concentração com monopólio, de grande dimensão industrial com falta de concorrência.
Vejamos se não é assim.
O facto de haver uma única unidade industrial pura a produção de determinado artigo a laborar num país - e coloco-me propositadamente na situação extrema - não pode significar, de forma alguma e como se torna evidente, que estejamos perante um monopólio; a situação monopolista de venda criar-se-ia, de facto, se o Governo interditasse a entrada de produtos congéneres do estrangeiro mais baratos ou indirectamente promovesse tal interdição mediante taxas aduaneiras elevadas que os onerassem no nosso mercado interno acima do preço normal.
E evidente que, se, por uma circunstância anormal e estranha, pudéssemos fabricar a custo F. O. B. inferior ao estrangeiro, criar-se-ia, de igual modo, uma situação monopolista se o Governo interditasse outra qualquer instalação que, em conjunto com esta, conseguisse um preço médio do custo inferior ainda aos artigos provenientes dos mercados externos.
Fora disso, a tal unidade tem por concorrente toda a produção mundial, na medida em que o Governo entenda condicioná-la no nosso mercado interno até ao ponto, evidentemente, em que a nossa balança de pagamentos o consinta; é ele, portanto, que lhe poderá criar ou não essa situação de monopólio, e não unicamente a existência duma unidade só por si.
Esta pode então justificar-se pela necessidade de criar de momento condições ao empreendimento capazes de lhe permitir que subsista temporariamente, isto é, enquanto as dimensões do nosso mercado de consumo não aumentam, até ao ponto de garantirem um consumo suficiente para que duas ou mais unidades - o que será sempre o ideal- possam manter-se depois som agravamento dos preços de custo e, consequentemente, dos de venda, dado que normalmente estes mão diminuem indefinidamente com o aumento da produção, mas cada caso tem o preço de custo mais baixo -num dado volume dela. Essa necessidade pode ser tão imperiosa até que o próprio Estado u reconheça através de uma legislação que lhe permite conceder exclusivos por dez anos; exclusivos, mas não monopólios, que a própria lei, aliás, não permite prolongar em circunstância alguma, para evitar abusos, sem prejuízo de poder manter, contudo, uma protecção contra desaconselháveis concorrências através do condicionamento Industrial.
Qual a vantagem, para uma dimensão apertada pelo total do nosso consumo, de aceitar o princípio de ter de haver sempre, e em qualquer caso, duas ou mais unidades em vez de uma?
Concorrência de preço e concorrência de qualidade, dir-se-á. Simplesmente, se a segunda era mais compreensível -a concorrência de qualidade estrangeira