40 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 64
É necessário ainda fazer uma observação a respeito da referência à Lei n.º 2038: é certo que só o corpo do artigo 6.º desta lei tem aplicação à política fiscal. Hás como o conteúdo do § 2.º tem vindo a ser incluído nesta disposição - embora respeite à determinação do valor nos inventários e partilhas judiciais -, convirá mante-lo, uma vez que não se pretende alterar, por via de omissão revogadora, um sistema que vigora há anos junto dos tribunais.
Toda a parte restante do artigo 6.º da última Lei de Meios deverá ser mantida, excepto a que respeita ao adicionamento do imposto complementar, uma vez que, quanto a este, se modifica em certo modo o seu regime, que terá de obedecer, portanto, a uma formulação especial.
Mantém-se em vigor o conteúdo dos artigos 4.° e 7.º da última lei, repetindo-se a sua expressão formal, por não sofrerem ainda qualquer modificação.
Da arrumação das matérias não afins em alíneas separadas resultará, por certo, maior clareza para a sua compreensão.
As alterações mais importantes respeitam ao imposto complementar, mas a elas se faz mais adiante pormenorizada referência.
I. -A reforma fiscal
107. O sistema fiscal português dos últimos trinta anos tem-se caracterizado por um constante esforço de adaptação a novas circunstâncias, dentro dos quadros invariáveis de um reduzido número de princípios básicos. Com efeito, toda a evolução processada, ao longo das três décadas precedentes, tanto na legislação tributária como na prática administrativa e na jurisprudência do contencioso, traduz a preocupação de continuar, melhorando-a, e de parcialmente renovar, enriquecendo-a, uma determinada orientação de base - a orientação da reforma de 1929.
Mas esta reforma, concebida num período de graves dificuldades financeiras e executada quando se difundia por toda a parte a mais ameaçadora crise económica, não podia desligar-se do condicionalismo da época. Por isso visou, sobretudo, a assegurar estabilidade às finanças e à economia, criando simultaneamente um nível adequado de receitas e a garantia da certeza na tributação. Não pretendeu a reforma de 1929, nem facilmente o poderia, acompanhar de perto a marcha de uma conjuntura sujeita, com toda a probabilidade, a acentuadas variações, dificilmente previsíveis à luz dos métodos científicos e da experiência da época; teve, untes, como objectivo, criar à economia nacional condições de sobrevivência, assegurando a possibilidade da restauração financeira do Estado e propiciando à iniciativa privada um ambiente de confiança e de estímulo.
Ora, justamente porque a reforma de 1929 era a mais indicada para um período de regeneração financeira e de reconstituirão económica, é que, com o rodar dos anos, se tornou necessário adaptá-la a condições que, por diversos modos, foram evoluindo.
As naturais consequências de uma considerável transformação do País conduziram, no ponto de vista da estrutura fiscal, à necessidade de um reajustamento mais completo, à luz de novas exigências dos factos, o para mais eficaz salvaguarda dos princípios. Foi assim que o progresso da industrialização do País, integrada numa larga política de fomento de iniciativa e orientação do Governo -sem já folar na criação de um clima mais favorável a maior justiça social e, por isso mesmo, propenso a exigir equitativa distribuição da carga tributária -, tornou indispensável uma revisão profunda do sistema fiscal em vigor.
108. O objectivo concreto dos estudos previstos na Lei n.º 2045, de 23 de Dezembro de 1950, era a reforma dos impostos directos, a efectuar logo que o estado dos trabalhos empreendidos o permitisse.
Ora, não se apresentava fácil, nem podia razoavelmente esperar-se, que com extrema rapidez ficasse concluído o estudo da projectada reforma. A acrescer ás dificuldades, bem conhecidas, de ordem política, económica e jurídica, comuns a todas as reformas tributárias em qualquer época e em qualquer país,
somavam-se, no nosso caso, as decorrentes de uma economia em via de desenvolvimento, e as resultantes de unia cooperação europeia cada vez mais estreita e mais extensa, implicando conveniente ponderação das orientações e métodos a adoptar.
Finalmente, os trabalhos da reforma fiscal aproximam-se do termo da sua 1.ª fase. o que permitirá a próxima publicação dos respectivos diploma, cuja entrada em vigor condicionará outros passos da tarefa de revisão há anos iniciada.
Espera-se promulgar, ainda neste mês de Novembro, o código da sisa e do imposto sobre as sucessões e doações, que são -na terminologia orçamental- os nossos dois impostos directos sobre o património. Mas os códigos dos restantes impostos, isto é, dos impostos directos sobre o rendimento, só poderão ser publicados a partir de Janeiro de 1959. Precisa, portanto, o Governo da competente autorização da Assembleia Nacional, e por isso lhe vem prestar os esclarecimentos indispensáveis sobre as linhas gerais da reforma desses impostos.
109. Dos vários pontos de contacto entre n reforma de 1929 e a que vai levar-se a cabo importa destacar, antes de mais, a adopção de análogo método realista, quanto à subordinação do sistema fiscal ás imposições das circunstâncias, fora de preocupações meramente doutrinárias e à luz dos ensinamentos da experiência.
Neste sentido, constitui orientação geral da reforma a preocupação de remodelar e actualizar, sim, mas aproveitando o mais possível as estruturas orgânicas e jurídicas existentes, de modo a não alterar, de um ímpeto, os quadros tradicionais.
Manter-se-á o sistema, actualmente em vigor, de uma pluralidade de impostos parcelares incidindo sobre os rendimentos da propriedade imobiliária, do comércio e da indústria, do trabalho e da aplicação de capitais, corrigidos por um imposto pessoal de sobreposição - o imposto complementar.
Não que se desconheçam nu minimizem as vantagens de um único imposto sobre o rendimento, de tipo anglo-saxónico, as quais consistem, não propriamente em o imposto ser único, que na realidade o não é, mas em ser único o conhecimento. E o conhecimento único, além da comodidade que oferece ao contribuinte, permite uma efectiva isenção do mínimo de existência.
Contudo, a substituição de vários por um único conhecimento exigiria uma vasto remodelação dos serviços de finanças, totalmente inviável a curto prazo. Acresce que pareceu melhor aguardarem-se os resultados das alterações introduzidas nos impostos actuais para, com base nos ensinamentos da experiência, se proceder com mais segurança ú estruturação do único imposto que venha substituí-los. E, quanto à isenção do mínimo de existência, procurou-se satisfazê-la desde já em larga medida, através do desagravamento de maior número de rendimentos diminutos, quer elevando a isenção do imposto profissional, quer criando uma isenção para os pequenos proprietários.
A circunstância, porém, de se manter a estrutura do sistema fiscal vigente não significa, do modo algum,