DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 109 758
lhe referir a extrema valia e a sua flagrante utilidade social.
Já o Sr. Deputado Camilo de Mendonça, pela forma brilhante como costuma vincar os grandes fastos nacionais, aqui referiu o merecimento, do importante conjunto de medidas que se estruturam nas bases dessa magnifica proposta de lei, cujo aparecimento é também em parte uma vitória desta Câmara, em que tire o gosto de poder colaborar, quando durante a discussão do Plano de Fomento, lamentando a não previsão nele dos abastecimentos de água aos agregados rurais, pedi, como alguns dos meus ilustres colegas, que atentasse o Governo na gravidade da omissão, remediando-a como cumpria.
Tinha o Ministério das Obras Públicas seguramente estudado o importante conjunto dos problemas deste valioso sector da sua actividade por intermédio de um notável escol de técnicos, a cuja devoção e zelosa competência rendo gostosamente as minhas homenagens, e por isso não foi difícil ao Governo estruturar as bases da aludida proposta de lei, da qual é licito esperar os mais assinalados benefícios.
É que, Sr. Presidente, é efectivamente impressionante que 11000 povoações com mais de 100 habitantes, abrangendo cerca de 3 milhões de almas, ainda não tenham, nestes tempos de tão avançada técnica de benefícios para os centros urbanos, o abastecimento da água necessária a vida; de boa água, que é espelho da saúde», e de muita água, que ó o sangue da terras, na feliz expressão do aludido estudo do Ministério das Obras Públicas a que aludi.
A falta desse elemento essencial que anda na base da melhoria da vida doméstica rural e na da intensificação da produtividade do esforço ingente dos que no campo mourejam conduz necessariamente ou ao êxodo dos povos ou ao sen regresso a um teor de trogloditismo que são males da mais alta virulência social.
Esta proposta de lei pode, portanto, ser justamente considerada como um elemento precioso na correcção da concentrada inflação demográfica dos centros urbanos nesta ignara idade da máquina.
O Sr. Nunes Barata: -V. Ex.ª dá-me licença? O Orador: - Com todo o prazer.
O Sr. Nunes Barata: - Tenho estado a ouvir com todo o interesse o que V. Ex.ª tem estado a dizer, mas queria referir que há aqui um aspecto que está para lá do mundo da demografia e da economia - o problema das populações dos distritos das Beiras que emigram clandestinamente para França, sobretudo nos últimos anos, com esta agravante: é qne sectores do Partido Comunista francês tëm procurado aliciar essa gente.
Sabemos que ela tem tido até agora trabalho, porque uma grande massa de franceses se encontra deslocada na Argélia, por motivo de operações militares. E amanhã, quando regressar, essa gente não terá ocupação, e ao voltar para Portugal será composta de elementos que, industriados pelp Partido Comunista francês, poderão vir a fazer entre nós alguma coisa qne nós não poderemos considerar boa.
O Orador:-Agradeço muito a concordância de V. Ex.º e a ajuda que me dá. b, efectivamente, assim.
Posso dizer a V. Ex.3 que estive com alguns inspectores da Junta da Emigração, que me informaram haver, a partir de determinados sectores, emigração para França. E mais: que o mercado francês tem recebido magnificamente os nossos braços, pagando-lhes salários muitíssimo bons; quer dizer, reconhecem uma coisa que nós ainda não fomos capazes de fazer. E como na maior parte dos casos essa gente é composta de pessoas quase
sem cultura, acontece que virá formada por essa tremenda universidade, começando já a notar-se os primeiros sintomas dessa perigosa formação» ...
Vem a propósito citar o pensamento valioso do afamado Le Corbusier a que se refere o parecer da Câmara Corporativa, com a mais alta propriedade.
Tão notável urbanista, a quem a cidade e a sua vida parece terem feito notar em dado momento das últimas décadas o pecado mortal do esquecimento a que se votara o campo, não relutou em afirmar, numa digna atitude de justa reparação, que sé necessário que a vida rural, estiolada, exangue, que não subsiste senão mediante a seiva já desgastada de uma civilização calda, renasça esplendidamente, reintroduzindo na civilização da máquina a presença bendita da natureza; não somente os seus produtos, mas ainda a sua profunda influência sobre os homens», pois que, segundo o mesmo Le Corbusier, «a civilização da máquina só pode ser fundada sobre um ruralismo vivo, porque não poderá reformar-se a cidade senão pelo arranjo do espaço do campo».
Quem ousará afirmar que estes pensamento não valem muito mais para o nosso pais do que para a" imortal pátria do seu autor?
É a compreensão do valor do ruralismo, tão bem condensada nestes expressivos pensamentos, que me tem feito erguer a voz nesta Assembleia na defensão dos direitos incontestáveis dos povos humildes, sacrificados e sofredores, para quem a terra, ainda que pobre e pequena, é sempre uma mãe carinhosa, em cujo regaço se chora e se ri, se sofre e se morre, sem nunca a esquecer.
Abastecimentos de água limpa e abundante; electricidade efectivamente ao alcance de todas as bolsas, e não apenas nos fios que talam os campos e embaraçam os caminhos das aldeias, mas não mergulham nas casas; habitação condigna - havia tanto, tanto a referir neste capitulo ... ; assistência na doença e na adversidade, estradas e caminhos, esgotos e tantos, tantos outros elementos que definem a vida aceitável são armas indispensáveis à luta contra o fascínio da urbe, onde brilham com extraordinário fulgor, prometendo-se a todos, mas insidiosamente, não se dando senão a alguns ... dos muitos que na mole imensa da cidade vêem a terra prometida» ...
Ora ó preciso livrar as gentes rurais, na natural tendência de evasão à mingua que as tortura, de caírem em outro maior aniquilamento e de perturbarem com ele o equilíbrio social e económico da própria vida da Nação.
E chegaríamos agora à encruzilhada onde se perfila, em toda a sua transcendente nobreza, o sacrificado município português, cuja missão é a todos os títulos transcendente.
Porém, não é tempo de mostrar o peso da sua nodosa e avantajada cruz ... Isso se fará em outra altura, como se anunciou.
No momento basta, na sequência do nosso pensamento, apontar algumas causas dos males do urbanismo, e entre as quais se destacam, como se disse, as deficientes condições da vida rural.
São elas que principalmente impelem as suas gentes para o paraíso da urbe lisboeta, que, tendo-se-lhes desvendado nos muitos ângulos do seu primoroso aliciamento através dos mais variados meios, como a rádio, o cinema e a televisão, lhes faz nascer o incontido e quase patológico desejo de nele ingressarem sem demoras ... Por isso aqui afluem em larga legião.
Indústrias de toda a espécie e feitio acolhem os seus rudes braços, que jamais restituirão; o comércio não desdenha o sen concurso, e os muitos que não encontram a sonhada e fácil ocupação donde possam viver preferem um ganha-pão que não lhes garante uma sub-