1080 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127
É claro que pode fazê-lo, como pode alterar a legislação sobre mil e uma outras matérias.
Todavia, não só esse poder, em caso de divergente orientação quanto à posição do Governo, não tem suficiente consistência, podendo actualmente ser neutralizado com um rápido decreto-lei, como ainda, para ser exercido, pressupõe, dados os termos do funcionamento da Assembleia, ã colaboração do Governo, concretizada na apresentação de propostas de lei que constituam a base impulsionadora do trabalho da Assembleia.
Em conclusão: nenhuma razão se invoca nos votos do vencido susceptível de atingir e pôr em causa a proposta a que tenho estado a referir-me.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
O Sr. Águedo de Oliveira: - Sr. Presidente: peço licença para trazer à consideração da Camará um breve apontamento, destinado a esclarecer o fundo do debate e o alcance da emenda apresentada para o artigo 93.º, alínea f).
Todavia, quero deixar à Câmara a noção das suas próprias responsabilidades, quero deixar a Camará com a sua capacidade resolutiva, tantas vezes extensivamente manifestada. Limitar-me-ei a alguns esclarecimentos.
Não ficaria inteiramente de bem com a minha consciência se, depois de ter focado o problema na generalidade, não trouxesse aqui um pequeno esclarecimento, quero mesmo dizer um esclarecimento marginal, destinado a orientar o assunto, aliás brilhantemente exposto pelo orador que me precedeu, visto que o Sr. Dr. Carlos Lima e não faço segredo para ninguém ao dizer isto - manteve, sobretudo, um dialogo intelectual muito relevante e interessantíssimo com o relator da Camará Corporativa.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Mas importa pegar na questão essencial e bordar sobre ela alguns comentários, que me parecem fundamentais para. a formação da vontade legislativa. Quer dizer: o meu desejo -e sempre assim tenho procedido, mesmo como Ministro das Finanças, quando colaborei bastas vezes nos trabalhos das comissões foi sempre quê a vontade da Assembleia se formasse livremente, que a sua vontade legislativa se formulasse perfeita e nitidamente, se formulasse com a independência que é natural e habitual em instituições deste género.
Está na tela da discussão o quê?
Primeiro, uma repartição da competência entre a Assembleia e o Governo e uma certa repartição de competência acreditada, não direi por uma grande experiência, mas pela experiência de algumas décadas, pela experiência da Revolução Nacional, por uma experiência que os mais velhos de. nós viveram de principio até agora.
Estabelecer um novo arranjo da Nação em regime de Estado, em que o direito fiscal seja monopólio da Assembleia, nestes tempos, tendo significado, não deixa de apresentar inconvenientes.
Portanto, vamos ver se à lei dos princípios e da experiência da renovação financeira os poderes desta Camará deverão alcançar o exclusivismo.
Se posso pôr o problema em termos políticos, este problema põe-se assim na sua máxima. simplicidade: todos nós seguimos com o maior interesse, com a maior atenção, direi mesmo com excepcional interesse, a oração brilhante produzida na tribuna pelo Sr. Deputado Carlos Lima, como ontem e hoje seguimos com o mesmo interesse, com o mesmo cuidado, a sua segunda intervenção.
Esta insistência -, esta acentuação de três sessões, não quero considerá-la banal. Ela significa politicamente alguma coisa. Pelo menos, a vastidão da matéria, a dificuldade dos problemas, a necessidade de realmente insistir na argumentação para convencimento da Câmara, para formação da tal vontade legislativa como sempre a entendi.
Portanto, brilhante exposição da primeira vez, nova e brilhante exposição ontem e hoje, e é agora com a Assembleia, que julgará se ficou ou não perfeitamente edificada sobre o mérito e alcance da emenda da proposta. Umas lições de finanças são um mínimo de seiscentas paginas anuais, queimam as pestanas, exigem recolhimento e estudo, carecem de grande contenção mental para serem vistas. Assim é nas Faculdades de Direito.
Mas não fiquemos por aqui; acentuemos também outro ângulo do problema.
Em 1901 o Prof. Armindo Monteiro, que Deus haja, um dos espíritos mais brilhantes e mais inquietos desta terra, uma das pessoas mais vivas que tenho encontrado na minha vida, um dos professores mais distintos, ...
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - ... um elemento notável, que foi um pilar da Revolução Nacional, o Prof. Armindo Monteiro, dizia eu, em 1951, como a Camará Corporativa, também nessa altura estabeleceram indistintamente a opinião de que a lei fiscal devia ser uma emanação parlamentar formal, uma prerrogativa das assembleias e pertencia por inteiro ao Poder Legislativo.
Quer dizer: só um acto legislativo emanado de um órgão competente para o exercício superior da faculdade criadora da lei é que realmente podia produzir a lei fiscal como lei formal. Ontem chamei a atenção para o facto de a argumentação do Prof. Armindo Monteiro, embora dirigindo-se ao presente, ter em vista sobretudo o futuro.
Assim a entenderia, porque os seus raciocínios de vez em quando marchara para além da expressão e do sentido gramatical da lei, marcham acima dos textos. Digo isto conhecendo o trabalho por empréstimo do horas, tal era no fundo a doutrina da Câmara Corporativa.
Em 1959 a mesmíssima Camará Corporativa reviu a sua atitude, estabeleceu uma nova ordem de concepções e entendeu que o poder fiscal, o direito fiscal, não era uma prerrogativa das assembleias parlamentares, mas era, sim, uma faculdade, uma capacidade legislativa repartindo-se entre o Governo e esta Assembleia, ou, melhor, associando os dois.
O que é que isto quer dizer? Qual é o alcance nítido desta maneira de pensar? O que é que se pode anotar nesta revisão de atitudes? Suponho que se quer dizer o seguinte:
Claro que estou a interpretar. Não tenho os dados essenciais. Mas dá-me ideia de que em 1951 nem aquele ilustre escritor nem a Camará Corporativa desejavam ou acreditavam numa possibilidade de reforma fiscal fora do âmbito, do hemiciclo da Assembleia, e que em 1959 a atitude agora é outra.
Supôs-se, como se viu no debate da lei de finanças, que o Governo, como zelador incessante do bem público, como zelador do bem nacional, através dos decretos-leis e dos regulamentos, estava mais bem habilitado para proceder a essa reforma e que a concepção técnica preferia a questão de princípios.
Daqui se infere que o problema fundamental posto à Camará se parece comportar em termos muito simples, de maneira que a Camará pode dirigir os seus conceitos dê consciência.
Consta do seguinte: competência simultânea do Governo e da Assembleia, ou competência exclusiva da Assembleia? Esta é a questão, este é que é o problema fundamental que está posto aqui à consideração e diante dos olhos de todos nós. Competência, portanto, exclusiva