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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 131 1156

constitui limite à soberania do Estado, «na ordem interna, a moral e o direito, e na internacional, os que derivem das convenções ou tratados livremente celebrados ou do direito consuetudinário livremente aceite, cumprindo-lhe cooperar com os outros Estados na preparação s adopção de soluções que interessem à paz entre os povos e ao progresso da humanidade».
O nosso sistema legislativo consagra inteiramente o princípio da legalidade, que domina, de uma maneira geral, todo o direito público dos Estados de civilização cristã e ocidental.
Entre nós o Estado é forte, mas justo; não se considera omnipotente, princípio e fim de si mesmo, e por isso respeita as liberdades fundamentais e garante o seu exercício, respeita os direitos dos particulares - indivíduos ou grupos.
O Estado totalitário entre nós seria, na expressão luminosa e justa de Salazar, «incompatível com o génio da nossa civilização cristã e cedo ou tarde haveria de conduzir a revoluções semelhantes às que apontavam os velhos regimes históricos».
Ora, este estádio de progresso político-jurídico em que, felizmente, nos encontramos hoje representa uma das maiores conquistas da civilização, que a todo o transe nos cumpre defender e engrandecer.
Mas convém esclarecer o seguinte:
Há uma esfera da actividade do Estado que não está subordinada inteiramente às (normas do direito constituído, nem podia estar: é a actividade da função governativa
É que esta função consiste «na actividade dos órgãos superiores do Estado que livremente definem as normas do direito positivo, fixam os objectivos a atingir pelo poder político consoante as circunstâncias e escolhem os meios a utilizar para a realização de tais objectivos»
Quer dizer neste campo os órgãos do Estado actuam com liberdade jurídica, e por isso os seus actos, que são actos políticos, estão, por natureza, excluídos de qualquer fiscalização jurisdicional, salvo no que respeita à fiscalização da constitucionalidade das leis, decretos ou quaisquer outros diplomas não promulgados pelo Presidente da República.
Já o mesmo não acontece com o exercício da função administrativa, que consiste na realização efectiva dos interesses da colectividade em contraposição ou em conciliação com os interesses dos particulares (indivíduos ou grupos).
Aqui já o império da lei positiva é absoluto, e por isso todos os netos praticados pelos agentes da administração pública têm de obedecer à lei reguladora das competências, da forma que tais actos deverão revestir, do seu conteúdo e dos fins que visam
Na prática destes actos a Administração não procede com liberdade jurídica, mas com vinculação, até mesmo no que respeita aos actos discricionários, que se acham vinculados ao seu fim legal específico
No ordenamento do direito administrativo impera, portanto, o princípio básico da legalidade, segundo o qual a nenhum agente do poder público tem a faculdade de praticar um acto que interfira com interesses alheios senão em virtude de uma norma jurídica anterior de carácter geral e de harmonia com o que nessa norma estiver estatuído»
Deste princípio decorrem os seguintes corolários

1º O órgão que tiver decretado normas jurídicas de carácter geral não pode dispensar-se de as observar nos actos individuais que venha a praticar sobre as matérias por elas regulada;
2.º Todo o acto contrário a essas normas é nulo e como tal deverá ser declarado pelo órgão jurisdicional competente, quando este seja solicitado para exercer a revisão da legalidade desse acto.

Estes são os princípios consagrados pelo nosso direito positivo, em leis ordinárias, que regulam matéria administrativa, às quais se acha submetida a actividade dos órgãos do Estado no exercício da função administrativa.
O Estado Português é, portanto, um Estado de administração legal
O regime da legalidade ou da administração legal opõe-se, como diz o Prof. Marcelo Caetano (Manual, 3.º edição, p. 60), à tendência dos regimes absolutos para permitir aos órgãos da autoridade pública tudo o que a razão de Estado pareça exigir ou aconselhar - tendência também dos regimes totalitários, em que nenhum interesse individual ou social se reputa estranho ao Estado, considerando-se esses interesses identificados com os da comunidade política.
Ora esta tendência de absorção totalitária afigura-se-nos vê-la aflorar num passo do parecer da Câmara Corporativa no único argumento de fundo aí empregado contra o meu projecto, como mais adiante teremos oportunidade de evidenciar
«A existência do direito administrativo - diz ainda aquele ilustre professor - está intimamente dependente do direito constitucional, pois este deve assegurar á vigência da legalidade e a eficácia dos seus corolários»
Foi reflectindo sobre esta asserção e atentando em algumas leis de excepção que subtraem à fiscalização jurisdicional certos actos administrativos definitivos e executórios que me decidi a apresentar o projecto agora em discussão
Fi-lo com a recta e clara intenção de defender, por via constitucional, ti garantia contenciosa da fiscalização jurisdicional da legalidade da Administração dentro da economia do sistema da nossa lei fundamental.
Este problema da eficácia da fiscalização jurisdicional da legalidade da Administração é de tal relevância que não pode deixar de interessar vivamente esta Câmara.
E que, Sr. Presidente e Srs Deputados, os direitos e as libei d a dês dos particulares quando correm maior risco é precisamente na prática quotidiana do exercício da função administrativa do Estado através dos seus múltiplos agentes burocráticos Por isso o nosso ordenamento jurídico, para evitar o arbítrio, não só tornou o exercício dessa função administrativa dependente das normas do direito positivo preexistente como criou um sistema de fiscalização da legalidade dos actos administrativos definitivos e executórios, por meio de órgãos jurisdicionais, compostos de juizes que oferecem todas as garantias de independência, de imparcialidade e de ciência jurídica especializada, por forma a defenderem o superior interesse da legalidade e a prestigiarem a Administração, libertando-a, quantas vezes, de infundadas suspeitas, ou possibilitando-lhe, com o apagamento do quadro jurídico de alguns actos eivados de vícios determinantes da respectiva anulação, a correcção de erros, sempre possíveis na aplicação da lei aos casos individuais.
Tal fiscalização em cada caso concreto é, sem dúvida, a única verdadeiramente eficiente e nada tem de perturbadora para a marcha da Administração, uma vez que esta, gozando, como goza, do privilégio da execução prévia, não só tem a faculdade de definir o que supõe ser o direito, por meio de uma decisão definitiva que põe termo a um processo burocrático ou gracioso, como